O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e o Mercado de Carbono no ordenamento jurídico Brasileiro. The clean development mechanism and the carbon market in Brazilian law

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Resumo

Para se adaptarem às crescentes transformações climáticas presenciadas nas últimas décadas, relacionadas à excessiva exploração e utilização dos gases agravadores do efeito estufa, aflora-se no cenário internacional princípios, políticas e mecanismos que corroboram para adoção de políticas governamentais alternativas e sustentáveis. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo analisar as perspectivas jurídicas e os compromissos apresentados pelo Protocolo de Quioto e sua recepção pelo ordenamento jurídico nacional, ressaltando-se a implementação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e as Reduções Certificadas de Emissões que através de medidas governamentais culminam com a regulamentação legal da Política Nacional Sobre Mudança do Clima. Observando-se para tanto as divergências e lacunas normativas quanto os parâmetros legais de comercialização dos créditos de carbono.

 

Palavras-Chaves: Tratados Internacionais; Protocolo de Quioto; Mecanismo de Desenvolvimento Limpo; Mercado de Carbono; Regulamentação Específica.

 

Abstract

To adapt to increasing climate changes witnessed in recent decades, related to excessive exploitation and utilization of greenhouse effect gases, touches on the international scene principles, policies and mechanisms which support for adoption of alternative and sustainable government policies. In this context, this study aims to examine the prospects and legal commitments made under the Kyoto Protocol and its receipt by the national legal system, emphasizing the implementation of the Clean Development Mechanism and the Certified Emission Reductions that through government action culminate with the legal regulations of the National Policy on Climate Change. Looking to both the differences and gaps regulations as the legal parameters of marketing carbon credits

 

Keywords: International Treaties; Kyoto Protocol, Clean Development Mechanism, Carbon Market; specific regulation.

 

 

 

 

Introdução

 

As transformações climáticas presenciadas no decorrer das últimas décadas e a constante utilização dos combustíveis fósseis como principal fonte de energia, exigiu, tanto em âmbito internacional quanto nacional, regulamentação específica, como políticas governamentais e normativas, sobre o tema. Nesse contexto, destacam-se os compromissos apresentados pelo Protocolo de Quioto e as metas estabelecidas aos países signatários.

Frente às exigências estabelecidas com a ratificação do Protocolo, caberá a cada país elaborar e implementar, baseados em suas condições materiais e normativa, política ambiental calcada, precipuamente, no princípio do desenvolvimento sustentável.

O elucidado Protocolo trás à baila, mecanismos – visando contribuir para que os países em desenvolvimento consubstancia-se as metas redutivas propostas – comerciais, denominados de Mecanismos de Flexibilização. Nesse diapasão, importante destaque se dá aos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo que poderão ser implementados pelos países em desenvolvimento.

O significativo desenvolvimento dos projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo Frente à ascensão das Reduções Certificadas de Emissões, também denominadas de Crédito de Carbono, exige-se a criação de um sistema normativo específico, evitando práticas estritamente comercias e lucrativas.

Mesmo apresentado um mercado altamente promissor, a negociação dos créditos de carbono encontra obstáculo frente â ausência de legislação específica, principalmente quanto aos mecanismos de comercialização dos referidos créditos e a tributação a eles cabível. Pelo exposto, o presente artigo terá como finalidade analisar a Política Nacional Sobre Mudança do Clima estabelecida no sistema jurídico nacional, e os compromissos e metas estabelecidos pelo Protocolo de Quioto.

 

  1. os Tratados Internacionais

 

Caracterizado por ser todo acordo escrito bilateralmente celebrado entre Estados e/ou organizações internacionais, os tratados objetivam essencialmente produzir efeitos na ordem jurídica de direito internacional.

Em âmbito nacional a celebração dos tratados internacionais é realizada pelo Presidente da República, conforme disposto pelo artigo 84, VIII, da Carta Magna. Após sua celebração é remetido para apreciação e aprovação do Congresso Nacional que ocorrerá mediante decreto legislativo, conforme disposto no art. 59, VI, da Constituição Federal.

O procedimento de incorporação de normas internacionais ao direito positivo nacional pode ser compreendido como um ato subjetivamente complexo por ser uma conjugação de duas vontades homogêneas: do Congresso Nacional e do Presidente da República.

O ato pelo qual o Congresso Nacional expressa seu interesse pela ratificação de tratados, acordos e atos internacionais, como apresentado anteriormente, é por meio de decreto legislativo, ato normativo no qual se trata de matérias de competência exclusiva do Congresso Nacional. O outro ato constitutivo, do ato complexo ora apresentado, é emitido pelo Presidente da República, que além de celebrar atos de direito internacional dispõe da competência para promulgá-los mediante decreto, enquanto chefe de Estado.

Uma vez atendidos os interesses superiores do Estado soberano brasileiro o tratado é ratificado e transmitido aos demais signatários, através do depósito do instrumento de ratificação. Importante destacar que o sistema constitucional brasileiro não consagrou o princípio do efeito direto e da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais, cabendo ao Presidente da República promulgar, por meio de decreto, a vigência do tratado internacional no ordenamento jurídico interno.

Para tanto, necessário se faz observar a significativa diferença entre a matéria de cada acordo ou tratado e seu quórum de aprovação. Isto porque a Lei Suprema estabelece em seu art. 5º § 3º que “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Desta forma, os tratados e convenções supracitados terão hierarquia de emenda constitucional.

Todavia, o conteúdo material do tratado internacional abaixo analisado, segue via diversa de criação, sendo tal distinção realizada apenas para efeitos teóricos.

 

  1. AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O PROTOCOLO DE QUIOTO

 

Em 1992, realizou-se no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) , uma das maiores conferências mundiais relacionadas a problemas ambientais, conhecida como ECO 92. O objetivo principal da conferência era discutir medidas a serem adotadas para que se promovesse a diminuição da degradação ambiental.

Foram traçados princípios que se tornaram, mesmo que de forma embrionária, norteadores das negociações ambientais, e posteriormente adotados na elaboração da Convenção – Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e, consequentemente, do Protocolo de Quioto.

Representava uma nova fase da política mundial referente às mudanças climáticas e aos mecanismos de combate ao aquecimento global. Na qual, objetivava-se mitigar a expressiva alteração do clima mundial e suas consequências trágicas à humanidade.

A nomenclatura Protocolo pode apresentar teoricamente algumas distinções quanto ao termo Tratado. Aquele é constituído em um sentido mais principiológico, apresentando similaridades com as normas programáticas de direito interno.

Realizada em 11 de dezembro de 1997 em Quioto, no Japão, a terceira sessão da Conferência das Partes na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), culminou com a adoção do texto do Protocolo de Quioto.

Durante o período de 16 de março de 1988 a 15 de março de 1999 esteve aberto a assinaturas na sede das Nações Unidas, em Nova York, recebendo, durante o referido prazo, 84 assinaturas. Passou pelas fases gerais de desenvolvimento e aprovação, prevista para acordos e tratados internacionais, adquirindo vigência internacional em 16 de fevereiro de 2005 após obter adesão mínima, ao ser assinado pela Rússia em novembro de 2004.

Constata-se, segundo corpo textual do Protocolo de Quioto, a divisão dos países em dois grupos: os países presentes no Anexo I – países mais industrializados, grandes emissores de CO2; e os países não presentes no Anexo I – países que, para atender às necessidades básicas de desenvolvimento, precisam aumentar a sua oferta energética

Sucintamente o objetivo do Protocolo de Quioto é apresentado em seu artigo 3, segundo o qual os países do Anexo I ficam obrigados a reduzir suas emissões de gases geradores de efeito estufa para que elas se tornem 5,2% inferiores aos níveis de emissão de 1990.

O cenário mundial, frente à importância do tema, inicia uma nova política mundial de esclarecimento, conscientização de quebras de paradigmas da população referente às questões ambientais. Isto porque, segundo Paulo Afonso

os bens que integram meio ambiente planetário, como água, ar e solo, devem satisfazer as necessidades comuns de todos os habitantes da terra. As necessidades comuns dos seres humanos podem passar tanto pelo uso como pelo não uso do meio ambiente. Desde que utilizável o meio ambiente, adequado pensar-se em um meio ambiente como “bem de uso comum do povo” .

O elucidado Protocolo estabelece que estas reduções deverão ser realizada entre 2008 e 2012 (fase definida como o primeiro período de cumprimento do Protocolo).

Ademais, para possibilitar a concretização dos propósitos elencados, a redução de emissões e ao mesmo tempo assegurar uma transição economicamente viável para a adoção desse novo padrão, o Protocolo de Quioto estabeleceu a criação de mecanismos comerciais – denominados de Mecanismos de Flexibilização – para facilitar que os países do Anexo I e suas empresas cumpram suas metas de cortes nas emissões. Nesse diapasão, os três Mecanismo de Flexibilização apresentados pelo Protocolo são: Implementação Conjunta; Comércio de Emissões; Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).

Segundo Bruno Kerlakian Sabbag,

as metas imputadas pelo Protocolo de Quioto aos países desenvolvidos(…), devem ser cumpridas pelas Partes, as quais possuem a prerrogativa de alocar internamente essas metas às atividades industriais privadas e públicas instaladas em seu país, em diversos setores econômicos como manejo de florestas, agricultura sustentável, fontes alternativas de energia, processos produtivos mais limpos, tratamento de resíduos humanos e dejetos animais, entre outros.

Outrossim, conforme proposta do artigo em tela, ressaltaremos o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e as Reduções de Emissão Certificada, também denominado de mercado brasileiro de reduções de emissões Crédito de Carbono, pelo sistema jurídico brasileiro.

 

  1. Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e as Reduções de Emissão Certificada.

 

Diferente da Implementação Conjunta e do Comércio de Emissões, nos quais as partes negociantes são, conforme Anexo I, países desenvolvidos, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo é único mecanismo de flexibilização que possibilita a participação de países em desenvolvimento no mercado primário de carbono no âmbito do Protocolo de Quioto, auxiliando, desta forma, no processo de redução de emissão de gases do efeito estufa e no desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento.

Importante aspecto a ser destacado neste mecanismo de flexibilização é a relação existente entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento na implementação das políticas e objetivos apresentados. Isto porque, o cerne do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo fundamenta-se no auxílio realizado aos países pertencentes ao Anexo I (países desenvolvidos) para que possam cumprir suas metas ambientais. Tal medida é possível através de financiamentos de projetos de redução ou compras de redução de emissões resultante de projetos implementados pelos países em desenvolvimento.

Portanto, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo tem dois objetivos essenciais: diminuir o custo global de redução de emissões de gases lançados na atmosfera que contribuem excessivamente para o efeito estufa (GEE) e, criando, juntamente, iniciativas que promovam o desenvolvimento sustentável em países em desenvolvimento.

O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo permite a certificação de projetos de redução de emissões nos países em desenvolvimento e a posterior venda das reduções certificadas de emissões (RCEs), para serem utilizadas pelos países desenvolvidos como modo suplementar para cumprirem as metas a eles estabelecidas. Ao agregar valor comercial aos resultados de redução de emissões, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo confere de imediato, maior competitividade às práticas de conservação e uso de fontes renováveis de energia.

A principal consequência, como já apresentado, advinda da adoção do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo para o mercado brasileiro, são as Reduções Certificadas de Emissões, também conhecida como Crédito de Carbono.

Todavia, para se evitar equívocos teóricos, destaca-se que no sistema de Créditos de Carbono, a redução de emissão de gases do efeito estufa é atestada através de certificado emitido pelas agências de proteção ambiental reguladoras, sendo tal certificado proporcional à quantidade de carbono ou de outros gases que contribuem para o efeito estufa. Tendo sua base conceitual, norteada pela concepção de compensação de emissões atmosféricas na medida em que proporcionam o equilíbrio entre as novas emissões de poluentes no ar e a sua redução.

Em estudo específico referente à adoção do Mercado de Carbono, Marcelo Theoto Rocha , dispõem que

os instrumentos de crédito e/ou permissão já são utilizados em outros países com relativo sucesso há vários anos. A idéia básica é de que a redução, estabilização e/ou eliminação de um determinado poluente pode ser alcançada através da comercialização de créditos de redução e/ou permissões de emissão entre as empresas poluidoras. Este comércio faz com que as empresas tenham maior flexibilidade no cumprimento das metas ambientais estabelecidas pela legislação vigente. Outra vantagem é que com a sua utilização o poder público fica apenas encarregado de definir os objetivos ambientais a serem alcançados, monitorar e penalizar infratores; enquanto que a escolha dos melhores meios para se atingir os objetivos fica a cargo das próprias empresas, que irão sempre buscar a melhor relação custo/benefício.

É de suma importância compreender a definição apresentada aos Créditos de Carbono, pelo Protocolo de Quioto e ulteriormente, observar quais medidas governamentais que formam realizadas para aplicação dos preceitos apresentados no referido protocolo. Desta forma, o artigo 6 do Protocolo Quioto, apresenta:

1. A fim de cumprir os compromissos assumidos sob o Artigo 3, qualquer Parte incluída no Anexo I pode transferir para ou adquirir de qualquer outra dessas Partes unidades de redução de emissões resultantes de projetos visando a redução das emissões antrópicas por fontes ou o aumento das remoções antrópicas por sumidouros de gases de efeito estufa em qualquer setor da economia, desde que: (a) O projeto tenha a aprovação das Partes envolvidas; (b) O projeto promova uma redução das emissões por fontes ou um aumento das remoções por sumidouros que sejam adicionais aos que ocorreriam na sua ausência; (c) A Parte não adquira nenhuma unidade de redução de emissões se não estiver em conformidade com suas obrigações assumidas sob os Artigos 5 e 7;e (d) A aquisição de unidades de redução de emissões seja suplementar às ações domésticas realizadas com o fim de cumprir os compromissos previstos no Artigo 3.

Pelo exposto, constata-se que caberá aos países signatários, implementar e desenvolver suas próprias políticas para efetiva concretização dos compromissos assumidos com a ratificação do Protocolo Quioto. Nesse contexto, será analisado a recepção das normas, uma vez que possui tais características, apresentadas pelo Protocolo Quioto frete ao ordenamento jurídico brasileiro.

Desta forma, a empregabilidade de mercado de carbono deve obedecer aos critérios do artigo 12 do Protocolo de Quioto, o Acordo de Marraqueche (sétima sessão da Conferência das Partes na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima) , bem como as etapas do ciclo dos projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo específicos do país adotante da política.

 

  1. O sistema jurídico brasileiro e a Adoção do Mercado de Carbono

Formado por ideias abstratas que constitui a essência fundamental de um sistema jurídico, os princípios constitucionais são precipuamente, os valores mais relevantes de uma sociedade. Para Celso Antônio princípio jurídico é

mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce deste, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas comparando-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.

Os pilares do Estado brasileiro são construídos e solidificados a partir dos princípios e fundamentos constitucionais, expressos ou implicitamente, estabelecidos na Carta Magna de 1988.

Ressalta-se o Princípio do Desenvolvimento Sustentável, estabelecido nos artigos 170, VI e 225, da Lei Suprema, que é a base legal e doutrinária do alicerce do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e do Mercado de Carbono, visto que tal princípio,

procura conciliar a proteção do meio ambiente com o desenvolvimento socioeconômico para a melhoria da qualidade de vida do homem. É a utilização racional dos recursos naturais não renováveis. Também conhecido como meio ambiente ecologicamente equilibrado ou ecodesenvolvimento.

Presente, expressamente no texto do Protocolo de Quioto, o princípio do desenvolvimento sustentável edifica-se no binômio, proteção do meio ambiente e o desenvolvimento econômico. Possibilita-se, desta forma, explorar de maneira racional e equilibrada os recursos naturais, não sendo, necessariamente uma exploração limitada e ineficaz, para as demandas e necessidade do mercado consumidor.

O mercado de créditos de carbono calcado, essencialmente neste princípio, busca uma maior conscientização dos países desenvolvidos, principais emissores de gases de efeito estufa, juntamente com a implementação de financiamentos de projetos de redução ou compras de redução de emissões, realizados pelos países em desenvolvimento.

A fundamentação jurídica para acolhimento da política de Mercado de Carbono pela Constituição Federal baseia-se, em outros princípios constitucionais, tais como: princípio da prevenção, princípio da precaução e princípio do poluidor pagador.

A Carta Magna promulgada em 1988 revogou tacitamente as normas incompatíveis com seu conteúdo formal e material, recepcionando, por outro lado as normas com ela compatíveis. A legislação específica de material ambiental, para permanecer com eficácia jurídica frente à nova Constituição Federal, exigiu-se certa compatibilidade principiológica. Destaque para a Política Nacional do Meio Ambiente apresentada pela Lei 6.938/81. O seguinte mandamento normativo é responsável por traçar toda a sistemática necessária para aplicação da política ambiental, visando dar efetividade aos princípios contidos no artigo 225 da Constituição Federal.

A supracitada lei apresenta o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), constituído por uma rede de agências ambientais – instituições e órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e do Ministério Público – com finalidade de dar cumprimento aos princípios supracitados e às normas infraconstitucionais nas diversas esferas da Federação.

Entretanto, tanto o art. 225 da Constituição Federal, quanto a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente são alicerces para implementação da política apresentada pelo Protocolo de Quioto, recepcionado, como já apresentado, pela Lei Suprema.

Desta forma, o legislador ordinário e órgãos do Poder Executivo, conforme competência específica inicia a concretização dos compromissos assumidos com ratificação do protocolo, através de legislação específica e políticas apresentadas pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, responsável por tal atribuição.

Ressaltando-se o tema em tela desenvolvido, observa-se as ações governamentais, no que tange à implementação do Mecanismo de Mercado Limpo e o Mercado de Carbono, a partir do decreto presidencial de 7 de julho de 1999, alterado pelo decreto 6.263 de 21 de novembro de 2007, institui a Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima – CIMGC, doravante denominada Comissão Interministerial, com a finalidade de articular as ações de governo decorrentes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Global do Clima e seus instrumentos subsidiários adotados pelo Estado Brasileiro.

O artigo 5º do citado decreto apresenta quatro eixos temáticos, estruturadores da Política Nacional sobre Mudança do Clima, são eles:

I – mitigação;

II – vulnerabilidade, impacto e adaptação;

III – pesquisa e desenvolvimento; e

IV – capacitação e divulgação

Conforme estabelecido no artigo 4 do Protocolo de Quioto, no qual exige a existência de uma autoridade responsável por dirimir e fiscalizar o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, a Comissão Interministerial apresenta-se como a Autoridade Nacional Designada.

Com o objetivo de obter a aprovação das atividades de projetos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, de maneira eficaz, a Comissão Interministerial elaborou o “Manual para Submissão de Atividades de Projeto no Âmbito do MDL à Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, visando à obtenção da Carta de Aprovação do Governo Brasileiro” .

Representa destacável avanço da política brasileira na adoção do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, visto que, estabelece procedimentos claros e específicos para analise dos projetos direcionados à comissão. Ressalta-se, que o citado manual norteia-se, expressamente pelo princípio do desenvolvimento sustentável.

Nessa esteira, o legislador ordinário, orientado pela concepção do mecanismo de desenvolvimento limpo, publicou em 10 de dezembro de 2009 a Lei n. 12.114, que instituiu o Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas (FNMC), com a finalidade de assegurar recursos para apoio a projetos ou estudos e financiamento de empreendimentos que visem à mitigação da e à adaptação à mudança do clima e aos seus efeitos.

Ademais, em 30 de dezembro de 2009 foi publicado a lei 12.187/2009 instituindo a Política Nacional Sobre Mudança do Clima (PNMC). Representa marco regulatório da empregabilidade do mecanismo de desenvolvimento limpo e do mercado brasileiro de reduções de emissões (MBRE).

Constata-se, por seu conteúdo textual, que a lei 12.187/2009, trata-se de uma norma geral, uma vez que apresenta: os objetivos, os mecanismos e as diretrizes a serem adotadas para implementação da política em âmbito nacional, todavia caracteriza-se por ausência de aplicabilidade imediata, necessitando, para tanto, de regulamentações específicas.

A concretização das etapas, empregadas pela Comissão Interministerial, para adoção dos projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, deverão consequentemente, estimular e direcionar um processo de capacitação nacional perante as atividades, os setores e as áreas de interesse nacional prioritário para a fase de implantação desses projetos, atendendo, sobretudo o desenvolvimento econômico, social e ambiental. Portanto, a partir da disponibilidade de documentos internacionais bem como regras internas (legislações, instituições responsáveis, políticas públicas), constata-se a consubstanciação fática de uma política de sustentabilidade ambiental.

Conforme apresentado pelo Manual para Submissão de Atividades de Projeto no Âmbito do MDL, a iniciação de um projeto é apresentada à Comissão Interministerial quando o documento de concepção de projeto (DCP) é submetido à validação de uma Entidade Operacional Designada (DCP).

Uma vez concretizado o ciclo de validação, aprovação e registro, a atividade registrada torna-se efetivamente uma atividade de projeto no âmbito do MDL. Hodiernamente, um total de 6313 projetos encontra-se em alguma fase do ciclo de projetos do MDL, sendo 2311 já registrados pelo Conselho Executivo do MDL e 4202 em outras fases do ciclo.

Resultado da política adotada pelo governo federal, como pela legislação infraconstitucional no tocante à implementação do Mecanismo de Mercado Limpo, inquestionável é a posição do Brasil no cenário mundial, ocupando o 3º lugar em número de atividades de projeto, com 457 projetos (7%), sendo que em primeiro lugar encontra-se a China com 2470 (38%) e, em segundo, a Índia com 1752 projetos (27%) .

Em análise ao potencial de emissões para o primeiro período de obtenção de créditos de carbono, o Brasil é responsável por uma redução de 393.254.484 tCO2e (toneladas métricas de Dióxido de Carbono Equivalente), o que corresponde a 5% do total mundial, para o primeiro período de obtenção de créditos, que podem ser de no máximo 10 anos para projetos de período fixo ou de 7 anos para projetos de período renovável (os projetos são renováveis por no máximo três períodos de 7 anos dando um total de 21 anos)

Visto o destaque alcançado pelo Brasil e o expressivo valor econômico que será atribuído ao mercado de reduções de emissões, é de suma importância destacar o procedimento adotado para comercialização destas certificações. Com fito de evitar as constantes dúvidas e debates, no que tange à natureza dos créditos de carbono e qual mecanismo adotado para negociação, o artigo 9º da Lei 12.187/2009 estabelece:

O Mercado Brasileiro de Redução de Emissões – MBRE será operacionalizado em bolsas de mercadorias e futuros, bolsas de valores e entidades de balcão organizado, autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, onde se dará a negociação de títulos mobiliários representativos de emissões de gases de efeito estufa evitadas certificadas.

Desta forma, o legislador ordinário definiu os Créditos de Carbono como “títulos mobiliários”, sendo, portanto, comercializado no âmbito da Comissão de Valores Mobiliários (CMV). Contudo, a disposição legal não se coaduna com o entendimento da CMV, que em 21/07/2009 comunicou seu entendimento sobre o assunto.

Para a citada autarquia os Créditos de carbonos são títulos emitidos por um órgão ligado à Organização das Nações Unidas, não devendo ser considerados derivativos ou títulos de investimento coletivo, mas de ativos cuja comercialização pode ocorrer para o cumprimento de metas de redução de emissão de carbono ou com o objetivo de investimento.

Nesse contexto, a Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Carbono, criada com a missão de promover e desenvolver o mercado de carbono, tanto o regulado pelo Protocolo de Quioto quanto o voluntário, por todo o território brasileiro, reconhece que a indefinição da natureza jurídica do Crédito de Carbono e de um regime tributário específico para lidar com essa questão tem provocado relativa insegurança para o mercado brasileiro.

Assim pelo exposto acima, mesmo com o desenvolvimento da legislação nacional e das constantes políticas que regulamentam os créditos de carbono, a ausência de unificação normativa e doutrinária para negociação (compra e venda) de redução certificadas de emissão, a inexistência de regras tributárias, aspectos quanto a relações trabalhistas, normas sucessórias e outras lacunas observadas, apresentam-se como um entrave à efetivação dos compromissos assumidos pelo Protocolo de Quioto.

 

Considerações Finais

A incorporação do Protocolo de Quioto pelo ordenamento jurídico nacional acarretou mudanças significativas na estrutura e na política exploratória e comercial das matrizes energéticas do país. Exigindo-se a adoção de um sistema normativo específico e inovador frente aos compromissos assumidos com a ratificação do tratado, e consequente melhoria das condições ambientais, tanto em âmbito nacional quanto mundial.

A embrionária legislação dispondo da Política Nacional Sobre Mudança do Clima apresentada pela lei 12.187/2009, positiva no ordenamento jurídico interno os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos que deverão ser adotados na implementação desta necessária e inovadora política, apresentada em 1997 em Quioto.

Entretanto, se não houver uma real compreensão dos benefícios e dos ônus gerados com a adoção desta política no sistema jurídico brasileiro, apenas uma pequena parcela dos envolvidos serão beneficiados, principalmente as partes contratantes na negociação dos créditos de carbono. Isto porque, a grandiosidade dos valores presentes neste mercado, relacionada às lacunas jurídicas existentes, apresenta-se campo fértil a práticas ilícitas.

Os alicerces que fundamentaram a consubstanciação do Protocolo de Quioto e as demais convenções climáticas realizadas, e suas respectivas políticas não podem ficar adstritos apenas a aspectos econômicos, uma vez que segue via principiológica adversa, da proposta central – o desenvolvimento sustentável.

Calcado nos projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, o mercado de carbono visa à negociação de reduções certificadas de emissão, emitidas pelos países em desenvolvimento. Contudo, necessário se faz desenvolver mecanismos claros e inequívocos de comercialização dos créditos de carbono, possibilitando constantes investimentos no setor.

Enfim, os resultados obtidos pelo Brasil na adoção de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo colocam-o em posição de destaque, demostrando o real comprometimento nacional frente a questões ambientais. Todavia, exige-se, certa definição, de maneira harmônica, do processo de negociação e obtenção das reduções certificadas de carbono e da entidade responsável por tal negociação. E a elaboração de normas que regulamentam o aspecto da tributação das referidas operações.

 

 

 Mário Ângelo de Oliveira Júnior

 

 

 

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Mario Angelo de Oliveira Junior

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