Breve abordagem sobre os princípios regentes do novo Direito de Família no cenário jurídico brasileiro

Redazione 25/09/08
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Inconteste é a relevância ocupada pelo Direito de Família no mundo contemporâneo como um dos ramos do Direito Civil, uma vez que regulamenta as relações familiares existentes, cuidando de institutos de suma preeminência para a coletividade, tais como o casamento e o parentesco. Assim, tem-se como objeto de estudo desta específica seara do ordenamento cível, notadamente no que concerne ao cenário jurídico brasileiro, o casamento e seus meios de celebração e extinção, assim como sua validade e efeitos; as relações pessoais e econômicas que decorrem da sociedade conjugal e sua dissolução; o relacionamento entre pais e filhos; o vínculo parental e os institutos assistenciais da curatela, tutela, alimentos e adoção. Em suma, tutela a família e institutos a ela afetos.
Nesta senda, a concepção do vocábulo família alterou-se com o passar dos tempos, razão pela qual o estudo desta ramificação, bem assim dos elementos a ela vinculados, passou, hodiernamente, a ser encarada sob perspectiva diversa, o que se infere mediante sopesamento das legislações atual e revogada concernentes à temática sub examine. O Código Civil de 1916 baseava-se em princípios diferenciados ao disciplinar o Direito de Família, tendo como ponto de partida visão essencialmente patrimonialista e que homenageava, de forma sobeja, a autonomia da vontade.
Sob outro ângulo, o estatuto cível vigente – Lei 10.406 de 2002 –, apoiado na atual Constituição brasileira – consagradora do princípio da dignidade da pessoa humana –, encara o Direito da Família sob ótica mais protetiva, com maior intervenção estatal e inúmeros dispositivos cogentes buscando a proteção dos hipossuficientes, a igualdade material entre o homem e a mulher (consoante se observa por meio do princípio da isonomia entre os consortes), o respeito mútuo entre pais e filhos, a dissolubilidade do vínculo conjugal e a igualdade entre filhos, sejam eles oriundos do casamento, extraconjugais ou em decorrência de adoção, tudo de forma a se adequar ao acenado princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil.
Constata-se, destarte, que a visão patrimonialista, ao menos no que respeita ao Direito de Família, perdeu muito de sua relevância, ocupando plano secundário na conjuntura que vigora na sociedade brasileira.
Restando consignado que a vertente cível em apreço não tem conteúdo econômico, a não ser indiretamente, cabe tratar, ainda que de forma perfunctória, acerca dos princípios que regem o que Maria Helena Diniz (2002) denomina de “o moderno Direito de Família” , ou, nas palavras de Maria Berenice Dias (2007), o “Direito das Famílias”. Averba Diniz (2002) que tais princípios são mais consentâneos à nova realidade social que impera. Pode-se mencionar, primeiramente, o já ventilado princípio do respeito à dignidade humana, pedra angular do ordenamento jurídico brasileiro, já que é, como cediço, fundamento primário da República Brasileira, irradiando, por via de conseqüência, em todo o regramento jurídico vigente. Não há, portanto, como o Direito de Família deixar de receber referida inspiração constitucional. Busca-se, com tal fator, o pleno desenvolvimento dos membros pertencentes à entidade familiar, em perspectiva que encara aquela como meio precípuo de o homem atingir sua plenitude e alcançar a harmonia, o bem-estar e, logo, a felicidade.
Coloca-se, além daquele, o princípio da “ratio” do matrimônio e da união estável, segundo o qual a razão existencial do casamento, bem como de qualquer outra forma de vida conjugal (“companheirismo”, exempli gratia) é a afeição entre os consortes e a necessidade de manutenção de plena comunhão de vida. Uma vez extintas estas, ou seja, encerrando-se a affectio, tem-se a resolução da sociedade conjugal (DINIZ, 2002).
Outro principio é o da igualdade jurídica dos consortes, isto é, os direitos e deveres de ambos os integrantes da sociedade conjugal são isonômicos. Neste contexto, vale assinalar ter havido a substituição da expressão “pátrio poder” pela denominada poder familiar. Há, assim, a consagração da divisão da responsabilidade da família entre o casal. Elucidando-se, o domicílio deve ser fixado por ambos os cônjuges; estes devem arcar em conjunto com as despesas familiares; tanto o pai quanto a mãe devem definir as normas do lar e os meios de educação da prole, etc.
Corolário deste é o princípio da consagração do poder familiar, que suplanta, no bojo da família, os antiquados e odiosos poderes paterno e marital. Registre-se que o poder familiar é também dever imbuído ao casal, já que incumbe aos pais o amparo moral e material aos filhos, estes merecendo carinho e tratamento respeitoso, principalmente tomando-se em conta sua peculiar característica de pessoas em desenvolvimento.
Com o princípio da igualdade jurídica de todos os filhos não pode haver qualquer sorte de distinção entre filhos legítimos, naturais e adotivos (DINIZ, 2002). É permitido, assim, o reconhecimento de filhos havidos fora do casamento e vedadas estão quaisquer espécies de designações discriminatórias relativas à filiação.
O princípio do pluralismo familiar encontra amparo na Constituição de 1988, já que tal diploma traz a baila entidades familiares diversas das oriundas unicamente do casamento. Protegem-se, então, a família monoparental e aquela originária de união estável.
Fundado no livre arbítrio de constituir comunhão de vida familiar sem qualquer imposição ou restrição de pessoa física ou jurídica estranha à relação no que atina às decisões do casal referentes ao planejamento familiar, aquisição ou administração do patrimônio comum, situa-se o princípio da liberdade. Diz respeito ao alvedrio “de escolha pelo modelo de formação educacional, cultural e religiosa da prole […] e na livre conduta, respeitando-se [por obviedade] a integridade físico-psíquica e moral dos componentes da família” (DINIZ, 2002, p.22).
Dessume-se, diante da breve abordagem levada a efeito, que o Direito de Família, como desdobramento de ciência social que é, sofre transformações a todo tempo, a fim de se adequar à realidade social que o cerca. Nesse particular, vê-se que a matéria em tela, sofreu, especialmente no direito pátrio, sensíveis modificações com o passar dos tempos, notadamente com o advento da “Constituição Cidadã”, de 1988, e com a promulgação do Código Civil de 2002. Trouxe consigo, o Direito de Família, novos princípios formadores e informadores, todos seguindo o postulado maior da dignidade da pessoa humana, que se sobrepõe a qualquer norma que o tente contrariar. Deve, enfim, o operador do Direito, estar atento a esta nova principiologia que se apresenta, pela sua elevada relevância para a sociedade.
 
João Carlos Leal Júnior[1]
Natália Taves Pires[2]
Janaina Lumy Hamdan[3]
Julio César de Freitas Filho[4]
 
 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
                                     
DIAS, Maria Berenice. Paz Para a Infância do Mundo. Disponível em: <http://www.mariaberenicedias.com.br> Acesso em: 15 out. 2007.
 
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[1] Discente de Direito e pesquisador da Universidade Estadual de Londrina; estagiário do Ministério Público Federal – Procuradoria da República em Londrina – PR.
[2] Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade de Direito da Alta Paulista – Tupã – SP; mestra em Direito pelo Centro Universitário Eurípides Soares da Rocha – Marília – SP; orientadora do Núcleo de Prática Jurídica do Centro Universitário Salesiano – Araçatuba – SP; professora do Curso de Especialização em Direito Empresarial e pesquisadora da Universidade Estadual de Londrina; advogada.
[3] Discente de Direito e pesquisadora da Universidade Estadual de Londrina; estagiária da Magistratura Federal – Juizado Especial em Londrina – PR.
[4] Discente de Direito e pesquisador da Universidade Estadual de Londrina; estagiário da Magistratura Estadual do Paraná.

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