Justiça Criminal X Reparação do dano

Scarica PDF Stampa

Recentemente, temos visto noticiadas sentenças na esfera penal onde o juiz condena o acusado à reparação do dano. Tal fato tem causado surpresa à maioria das pessoas, pois visualizam uma plena separação entre as esferas cível e penal. É importante destacar, contudo, que, mesmo antes da última grande reforma dos ritos processuais que abarca também as sentenças, o Código de Processo Penal contemplava a possibilidade de o ofendido promover a execução na esfera cível da sentença penal condenatória transitada em julgado, bem como de ser proposta a ação civil ex delicto. Todavia, com a reforma, a lei impôs ao juiz o dever de fixar o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração.

Nestes termos, a vítima, com a condenação criminal, já terá um título executivo líquido, sendo que continua sendo possível a liquidação de sentença para se apurar o efetivo dano sofrido, caso o valor mínimo não atenda às necessidades da vítima.

Segundo o artigo 387: O juiz, ao proferir sentença condenatória:

IV fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido.

Para que se possa visualizar a situação, imagine que o juiz estabeleça o valor de R$20 mil como valor mínimo para a reparação por um dado crime, contudo a vítima entende que os danos materiais totalizaram valor superior. Sendo assim, a vítima poderá executar a parte líquida da sentença e também requerer a liquidação de sentença objetivando a reparação do restante do dano material, bem como os danos morais (dor, abalo psicológico, humilhação, sofrimento).

A execução da sentença só poderá ser feita após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Assim, a sentença penal condenatória terá duas partes distintas: uma de caráter penal (pena privativa de liberdade e ainda se for cabível a sua substituição por restritiva de direitos) e a outra de índole civil, onde é estabelecido o valor mínimo da reparação.

Existe uma discussão a respeito do fato de o juiz poder ou não estabelecer de ofício (sem pedido de qualquer parte) esse valor. Neste particular, em decorrência do sistema acusatório, não poderia o juiz agir sem provocação das partes, sob pena de contaminar a sua imparcialidade. Contudo, a doutrina majoritária parece adotar o entendimento contrário.

Por outro lado, o Código de Processo Penal não estabeleceu os critérios que o magistrado deverá utilizar para fixar esse valor, limitando-se a dizer que deveriam ser considerados os prejuízos sofridos pelo ofendido. Nestes termos, não cabe ao juiz criminal encontrar o valor exato do prejuízo vivenciado pela vítima, mas ser criterioso na fixação do valor mínimo, e qualquer insatisfação com relação ao valor deverá ser levada à esfera pertinente.

A questão a ser indagada é se poderá o juiz criminal, ao fixar o valor mínimo da condenação, também levar em consideração o dano moral sofrido pela vítima. A questão é polêmica, porém não podemos deixar de considerar situações onde o dano material é mínimo ou nenhum, contudo o dano moral é inestimável.

Neste particular, embora haja corrente em sentido contrário, entendemos que o juiz deve considerar os prejuízos materiais e morais, já que a lei fala somente em prejuízo, sem especificar que seria somente o material.

Ao que parece, essa foi mais uma tentativa do legislador de incluir a vítima no conflito penal. Temos de considerar que há situações onde o condenado é totalmente desprovido de recursos financeiros, situações nas quais a condenação deve ser feita, contudo na prática será inócua.

Nessas situações, a vítima poderá não executar naquele momento a sentença condenatória. Na realidade brasileira, a maior parte dos crimes registrados é praticada por pessoas que não têm recurso algum e, por óbvio, não haverá a possibilidade de reparação do dano. Destaque-se que a nossa legislação não contempla a possibilidade de o Estado ter o dever de indenizar a vítima, ao contrário de outros países, notadamente alguns europeus, onde é previsto um sistema de indenização estatal.

Fernanda Freixinho

Scrivi un commento

Accedi per poter inserire un commento