Inépcia do recurso

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Quem recorre ao Judiciário por meio de uma ação obriga-se a satisfazer certos requisitos que o legislador entende indispensáveis para que essa ação se transforme num processo e seja decidida pelo juiz. A forma como esse pedido chega até o juiz é a petição inicial, ou pedido inicial. Se o pedido inicial observa os requisitos que a lei exige, diz-se que a petição está apta; se não observa, diz-se que a petição é inepta. Se o defeito da petição inicial é passível de ser corrigido, o juiz dá prazo ao autor e determina a sua correção; se o defeito é insanável, o juiz indefere a petição inicial e declara extinto o processo.

O mesmo raciocínio aplica-se aos recursos. Se, depois de percorrer todo o caminho da jurisdição, a parte obtém uma sentença com a qual não concorda, pode recorre ao tribunal acima do juiz que a proferiu. Também a petição de recurso deve observar os mesmos requisitos da petição inicial que inaugurou o processo. Tanto quanto o pedido inicial, a petição inicial dos recursos exige a satisfação de pressupostos objetivos e subjetivos, como motivação ou dialeticidade, recorribilidade da decisão, adequação, tempestividade,regularidade formal e preparo.

Os recursos devem ser dialéticos. Dialeticidade é dizer o porquê do pedido de reexame da decisão, mostrando ao juiz de segundo grau o que foi pedido, o que foi contestado, que prova se deu do pedido, como foi decidido e o que deve ser reformado, mostrando onde a sentença divergiu do direito ou da prova dos autos e qual, afinal, o direito pretendido.A falta desse pressuposto acarreta o seu não-conhecimento.Somente a dialeticidade permite que a parte contrária arrazoe (ou contrarrazoe) o apelo porque é ela que demarca “a extensão do contraditório perante o juízo ad quem,fixando os limites de aplicação da jurisdição em grau de recurso.”. Essa exigência(motivação ou dialeticidade) acha-se nos arts.514,II e III e 515 do CPC:

CPC, art.514 — A apelação, interposta por petição dirigida ao juiz, conterá:

I — os nomes e a qualificação das partes;

II — os fundamentos de fato e de direito;

III — o pedido de nova decisão.

CPC,art.515 — A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada”.

Assim também está na Súmula nº 4 do (agora extinto ) 1º Tribunal de Alçada de São Paulo:

“Não se conhece de apelação quando não é feita a exposição do direito e das razões do pedido de nova decisão”.

O Prof. NELSON NERY diz que “o procedimento recursal é semelhante ao inaugural de ação civil. A petição de interposição de recurso é assemelhável à petição inicial,devendo,pois,conter os fundamentos de fato e de direito que embasariam o inconformismo do recorrente,e,finalmente,o pedido de nova decisão.Tanto é assim,que já se afirmou ser causa de inépcia a interposição de recurso sem motivação”. Mais adiante, conclui: “As razões do recurso são elemento indispensável a que o tribunal, para o qual se dirige, possa julgar o mérito do recurso, ponderando-as em confronto com os motivos da decisão recorrida. sua falta acarreta o não conhecimento.Tendo em vista que o recurso visa, precipuamente, modificar ou anular a decisão considerada injusta ou ilegal,é necessária a apresentação das razões pelas quais se aponta a ilegalidade ou injustiça da referida decisão judicial”.

A jurisprudência sobre o ponto é clara:

“Da mesma forma que se faz necessária a impugnação específica na contestação, deve o apelante impugnar ponto por ponto da sentença, sob pena de não se transferir ao juízo “ad quem”o conhecimento da matéria em discussão ( “tantum devolutum quantum appellatum”). STJ-4ª Turma, REesp nº 50.036-PE, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, julgado em 8/5/96- DJU de 3/6/96, p. 19.256“.

Em regra, os recursos limitam-se a “recortar e colar”( uso aqui o jargão comum da informática) as razões de defesa,sem as articular e — especialmente — sem lhes imprimir as necessárias motivação e dialeticidade. Se a parte não diz ao órgão revisional onde o julgado se divorcia da pretensão deduzida na inicial, e enfrentada na resposta, nem diz o que pretende rever, porque contrário à prova dos autos ou julgado fora da lide, subtrai ao órgão ad quem qualquer devolutividade porque, não mostrando — expressamente — o descompasso da decisão que quer reformar, na prática não devolve ao tribunal coisa alguma porque não se pode subentender devolvida matéria frente a qual o apelante não deduz qualquer pedido objetivo e nem se sabe se dela efetivamente o recorrente quis apelar. Como visto, também no recurso exige-se para cada pedido uma causa de pedir, que tem de estar, necessariamente, nas razões do recurso. É isso que demarca para o tribunal os limites do diálogo recursal.

Jose Geraldo da Fonseca

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