Generalidades sobre a responsabilidade ciivl no direito brasileiro

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Luiz Carlos Goiabeira Rosa

Professor da Faculdade de Ciências Integradas do Pontal da Universidade Federal de Uberlândia (FACIP/UFU). Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Doutorando em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG)

 

 

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Breve histórico. 3. Pressupostos. 4. Responsabilidade contratual e extracontratual. 5. Responsabilidade subjetiva e objetiva. 6. Conclusão.

 

RESUMO: O presente artigo presta-se a tecer comentários sobre a evolução da responsabilidade civil no direito brasileiro. Começa-se o trabalho com um esboço histórico sobre a responsabilidade civil, demonstrando-se as consideráveis mudanças sobre o conceito de responsabilidade, dano e reparação. Bem assim, faz-se um apanhado geral acerca dos requisitos da responsabilidade civil, os quais indicam a quem compete o dever de indenizar. Ao fim, observar-se-á que tanto o dano material quanto o moral são passíveis de indenização, embora por fundamentos e objetivos diversos.

Palavras-chave: responsabilidade, dano material, dano moral.

SOMMARIO: L’articolo attuale è utile da tesserlo commenti sullo sviluppo della responsabilità civile nello diritto brasiliano. C’è iniziato con un abbozzo storico sulla responsabilità civile, dimostrante i cambiamenti considerevoli sul concetto di responsabilità, danni e riparare. Il pozzo così, sommario riguardo ai requisiti della responsabilità civile diventa generale, che indicano a chi compete il dovere da indennizzare. All’estremità, sarà osservato che tanto danni materiali quanto la morale è possibile dell’indennità, nondimeno per gli assestamenti e gli obiettivi vari.

Parola-chiave: responsabilità, danni materiali, danni morale.

  1. INTRODUÇÃO

A responsabilidade civil indica a quem incumbe o dever de reparar, concepção que vem sido trabalhada na história da Humanidade desde os tempos imemoriais: desde o início da civilização encontram-se formas de apaziguar e indenizar os atos praticados contra a esfera cotidiana pacífica, seja durante o tempo em que haviam tribos separadas seguindo cada qual seu rumo as sociedades atuais, e bem assim desde as compilações casuísticas até a formação dos códigos, cujas leis e jurisprudências marcam profundas marcas nas formas atuais.

2. BREVE HISTÓRICO

A palavra responsabilidade advém do latim respondere, expressão que designava a obrigação assumida pelo agente em razão do ato praticado. A seu turno, tal obrigação originava-se de certa formalidade, à qual se dava o nome de spondeo: ao pronunciar tal expressão nos contratos verbais, o devedor vinculava-se ao cumprimento da obrigação assumida, respondendo pelas consequências do inadimplemento.

Assim, o termo responsabilidade denota uma obrigação de responder por algo ou os efeitos de algo. Quer significar, assim, a obrigação de satisfazer ou executar o ato jurídico, que se tenha convencionado, ou a obrigação de satisfazer a prestação ou de cumprir o fato atribuído ou imputado à pessoa por determinação legal (Plácido e Silva, 1998, p. 713).

A par de tal definição, lícito é afirmar-se que a conseqüência lógico-normativa da prática de um ato ilícito é a aplicação de medidas que obriguem o agente à reparação do dano imposto à vítima, de forma a restabelecer o statu quo ante ou, na impossibilidade disto, compensando-a pelo infortúnio ocasionado pela ocorrência do fato, donde se conclui que a responsabilidade civil é, pois, parte integrante do Direito das Obrigações.

Citado por Aguiar Dias (2006, p.3), Pontes de Miranda atesta que a responsabilidade, enquanto instituto geral, possui uma visão de significação que se funda em livre-arbítrio repugnando a ciência, enquanto outras baseiam em psicologia normal e patológica. Equivale a dizer que, sociologicamente, o autor tem a noção de responsabilidade como aspecto social, fato social, e chega a definir a responsabilidade como:

(…) reflexos individuais, psicológicos, do fato exterior social, objetivo, que é a relação de responsabilidade. Das relações de responsabilidade, a investigação científica chega ao conceito de personalidade. Com efeito, não se concebem nem a sanção, nem a indenização, nem a recompensa, sem a o indivíduo que as deva perceber, como seu ponto de aplicação, ou seja, o sujeito passivo ou paciente.

Também citado por Aguiar Dias (2006, p. 5), Marton assim entende responsabilidade:

a situação de quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposto às consequências desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas que a autoridade encarregada de velar pela observação do preceito lhe imponha, providências essas que podem, ou não estar previstas.

Partindo-se de tais premissas, o conceito de responsabilidade civil pode ser desdobrado em três perspectivas: estruturalista, também conhecida por estruturalismo positivista, determina a busca do direito pelo lesado, ou seja, o lesado procura o lesante; funcionalista ou finalista, em que o lesante é solidário, ou seja, surge a prevenção; axiomático-constitucional, que valoriza o membro da sociedade através da tutela da pessoa humana, maior intervenção do Estado e socialização dos riscos, amparada pela Constituição Federal de 1988.

De tal modo, o dever de reparar pelo inadimplemento ou pela violação de outros direitos, perecimento do objeto (res perit domino), culpa lato sensu e stricto sensu, o risco (facilitando a defesa do lesado), são alguns dos princípios que norteiam a responsabilidade civil e provêm da máxima neminem laedere (não lesar a ninguém) que é a reparação do dano injustamente causado.

Nos dizeres de Bittar (1990, p. 3),

[…] o princípio que governa toda essa matéria é o do neminem laedere – um dos princípios gerais do direito – consoante o qual a ninguém se deve lesar, cujos efeitos em concreto se espraiam pelos dois citados planos, em função do interesse maior violado – se da pessoa ou da sociedade -, e conforme a técnica própria dos ramos do Direito que a regem, a saber: a) Direito Civil, para as violações privadas; b) Direito Penal, para a repressão pública.

Historicamente, a reparação tem raízes nos primórdios do convívio social. Vaz (2009, p. 26) aponta sobre essa evolução:

O desenvolvimento do tema, desde a vindicta, a justiça pelas próprias mãos, num primeiro instante histórico, até a aplicação efetiva e exclusiva desta pelo Estado, confunde-se com a própria história e a solidificação da responsabilidade civil, da atribuição da culpa e suas consequências.

Destarte, seguindo essa evolução os conflitos de obrigações não cumpridas e propriedades violadas eram resolvidos por vingança coletiva, cujo predomínio de guerra marcava a confusão entre ilícito civil e penal. Outrossim, a evolução dos grupos sociais impôs mudanças nos conceitos sociais, de forma a se implantar a vingança particular, onde apenas o ofendido buscava a satisfação ao dano contra si ocasionado – a “justiça pelas próprias mãos” -; mencionada atitude redundava em uma forma primitiva, e até mesmo selvagem, da reação espontânea e natural contra o mal sofrido e, no entanto, solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal (Lima, 1998, p. 10).

Por algum tempo, a vingança privada apaziguou certos ânimos e solucionou as pretensões insatisfeitas. De 2003 a 1961 a.C., o Código de Hamurabi consagra o princípio “olho por olho, dente por dente”, sacramentado pela Lei de Talião. Tal norma foi o paradigma para outros sistemas jurídicos de civilizações contemporâneas (sumérios, babilônicos, indianos), indiferentemente à eficácia de tal medida quanto ao ressarcimento ou compensação da vítima.

Bem assim, na Roma Antiga elegeram-se pessoas imbuídas de autoridade para resolver e solucionar os conflitos e punir o causador do dano, substituindo assim à vítima. Passou-se, então, da justiça punitiva exclusiva, reservada aos ataques dirigidos diretamente contra o ofendido, para a justiça distributiva, percebendo-se que indiretamente a sociedade era também atingida por certas lesões irrogadas ao particular, porque perturbavam a ordem que se empenhava em manter.

Os delitos, então, passaram a ser considerados sob duas óticas: públicos, ofensas mais graves, de caráter perturbador da ordem; privados, de menor potencial, restringindo-se à esfera das partes envolvidas (ofensor e ofendido). Os primeiros tipos de delitos eram reprimidos pela autoridade, como sujeito passivo atingido; nos últimos, intervinha apenas para fixar a composição, evitando os conflitos.

Mencionada divisão fora realçada no Direito Romano, onde três períodos são delineados: Lei das XII Tábuas (452 a. C.); Lex Aquilia (286 a. C); legislação Justiniana (528-534 d. C.). Tocante à primeira, no entender de Vaz (2009, p. 28) representou a consolidação histórica da indenização pecuniária como forma de compensação pelo dano, através da composição voluntária das partes ou por intermédio legal, e justamente por isso a responsabilidade civil é abrangida mais incisivamente. Tocante à Lei das XII Tábuas, Mazeaud et Mazeaud (apud Vaz, 2009, p. 26) bem afirmaram que “a ação de ressarcimento nasceu no dia em que a repressão se transferiu das mãos do ofendido, para o Estado”. Conforme já dito antes, em tal momento histórico o Estado passou a punir ao invés da pessoa, evoluindo de uma justiça punitiva exclusiva para justiça distributiva.

Quanto à Lex Aquilia (286 a. C.), dispunha sobre a responsabilidade extracontratual e a culpa como elemento nodal e base da responsabilidade extracontratual com indenização pecuniária do prejuízo com o seu valor, evoluindo o bastante para contemplar os danos morais. Esta lei possuía duplo objetivo, assegurar o castigo à pessoa que causasse um dano a outrem, obrigando-a a ressarcir os prejuízos dele decorrentes, e outro era punir o escravo que ocasionasse algum dano ao cidadão ou ao gado de outrem, fazendo-o reparar os danos causados.

Bem assim, com a Lex Aquilia chega-se finalmente a um princípio geral norteador da responsabilidade civil, originando o conceito de culpa aquiliana como atualmente se conhece – ou seja, responsabilidade civil delitual ou extracontratual -, já que, até então, não existiam regras uniformes a respeito da matéria. A esse respeito, Kfouri Neto (2001, p. 39) bem assevera:

[…] a Lei Cornélia estabelecia uma série de delitos relacionados à prática da profissão médica e as penas que deveriam ser cominadas. Entretanto, com a Lex Aquilia de damno, plebiscito posterior à Lei Hortênsia, do século III a.C., formulou-se um conceito de culpa, bem como fixaram-se algumas espécies de delitos que os médicos poderiam cometer, como o abandono do doente, a recusa à prestação de assistência, os erros derivados da imperícia e das experiências perigosas. Como conseqüência, estabelece-se a obrigação de reparar o dano, limitando-o ao prejuízo econômico, sem se considerar o que hoje se define como dano moral.

A Lei Aquília dividia-se em três capítulos, sendo o terceiro, intitulado damnum iniuria datum, o mais abrangente, alcançando desde as lesões a escravos ou animais, à destruição ou deterioração das coisas corpóreas. Importante ressaltar que foi por obra da jurisprudência, através da intervenção do pretor e dos jurisconsultos, que se deu a ampliação de seu campo de atuação, fazendo-a incidir sobre outros direitos reais. Abrandou-se seu rigorismo original, de forma a possibilitar a reparação do dano com exigências menores (Melo da Silva, 1983, p. 18).

Por fim, a Legislação Justiniana (528-534 d. C.) fora elaborada sob o império de Flavius Petrus Sabbatius Justinianus, historicamente conhecido por Justiniano, o qual governou o Império Romano do Oriente entre os anos de 527 a 565 d. C., quando morreu. Mencionada legislação consubstanciou-se na recompilação de todo o direito vigente, à qual se deu o nome de Corpus Iuris Civilis e que se dividiu em três períodos: a) Institutas; b) Codex Iustinianus; c) Digesto ou Pandectas.

Mesmo representando um avanço, o compêndio justinianeu ainda apresentava a composição com o caráter de pena privada e como reparação, visto que não havia nítida distinção entre responsabilidade civil e penal. Inobstante, o Corpus Iuris Civilis fora o fundamento básico para o sistema jurídico medieval: na Idade Média e principalmente na França, o direito romano fora aperfeiçoado gradativamente até migrar da enumeração casuística de hipóteses de composição obrigatória para um princípio geral, fulcrado na culpa como elemento caracterizador da obrigação de indenizar assim como o dano e o nexo causal.

Coube ao direito francês, contudo, estabelecer e sistematizar a concepção da reparação de danos com fundamento na culpa, tendo influenciado, de forma inegável, a maioria das legislações do sistema romano-germânico: o Código Napoleônico assentou a responsabilidade civil sobre a culpa, influenciando, com este princípio, várias legislações, como, por exemplo, a brasileira. Em seu artigo 1.382, o Code Napoleon assim previa: “todo e qualquer fato do homem, que causa um dano a outrem, obriga o culpado a repará-lo” (Vaz, 2009, p. 31).

No Brasil, a responsabilidade civil foi abordada pela primeira vez nas Ordenações Filipinas (ou Ordenações do Reino), de influência notadamente do Direito Romano, expressamente aposto como fonte do direito positivo.1 Posteriormente, embora ainda jungida à responsabilidade penal, a civil fora disposta no Código Criminal de 1830, onde eram previstas normas disciplinadoras de casos de responsabilidade civil, bem como a reparação natural e a garantia da indenização pelo dano sofrido, dentre outros institutos que visavam à satisfação do mal acarretado pelo dano ocasionado ao ofendido.

Começava-se a se delinear a autonomia da responsabilidade civil, tomando-se por premissa o tipo de interesse atingido: a lesão é de ordem essencialmente privada, sem necessidade de ofensa à ordem pública – em contrapartida à responsabilidade penal, onde o interesse lesionado é de ordem social, tutelado pelo Estado.

Bem obtempera Baú (2001, p. 11.):

No Brasil-Colônia, as Ordenações do Reino determinavam a obrigação de satisfação do dano, conforme comenta Valler, ao mencionar o art. 21, que tratava da obrigação do delinqüente de reparar o dano causado com o delito. O art. 22 determinava manter que a satisfação devesse ser a mais ampla possível e que, em caso de dúvida, a interpretação fosse feita em favor do ofendido. O art. 29, de sua vez, tratava da obrigação dos herdeiros do delinqüente em satisfazer o dano até o limite dos bens herdados. Até o começo do século, a responsabilidade civil, no Brasil, no referente ao funcionário público, prevista na Constituição Federal, e quanto ao transporte de coisa, estabelecida no Código Comercial. Lei específica surgiu, pela primeira vez, em 1912, versando sobre a regulamentação da responsabilidade das estradas de ferro. O princípio norteador, genérico, sobre a responsabilidade aquiliana, adveio com os artigos 159 e 160 do Código Civil, de 1916. Dessas regras emanam todas as demais obrigações de reparação de danos.

No Código Civil pátrio de 1916, a responsabilidade civil foi regulada através de um único artigo (art. 159), enquanto que a verificação da culpa e avaliação da responsabilidade foram reguladas nos arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553. Com o avanço da sociedade, a legislação especial enriqueceu os subsídios para tanto, regulando outras hipóteses de reparação do dano, verbi gratia, as concernentes ao transporte ferroviário, telecomunicações, imprensa, direito autoral, defesa do consumidor, e outros.

Inobstante, a jurisprudência não acompanhou tal progresso no tocante ao dano moral: manteve-se hesitante até 1988 quando, por força de texto constitucional expresso, a reparabilidade do dano moral tornou-se incontestável (CF, art. 5°, V e X). Com efeito, as disposições constantes da Carta Magna de 1988 sobre o dano moral e a responsabilidade objetiva nos danos nucleares mostraram-se não só oportunas como uma demonstração de que o Brasil busca atualizar-se nesse campo e recuperar o tempo perdido, posto que hoje a tendência na responsabilização por danos é no sentido de apartar-se do conceito de culpa e aproximar-se cada vez mais do conceito da socialização dos encargos, independentemente de culpa (Stocco, 1995, p. 62).

Bem assim, os microssistemas jurídicos contribuíram para a evolução nesse sentido. Exemplo disso é o art. 12 da Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), ao dispor que

O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Avanço tímido, porém digno de nota, foi a ampliação do tratamento ao dano dado pela Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil de 2002), onde o art. 186 consagra o dano moral, e os arts. 927 a 943 tratam da responsabilidade civil e obrigação de indenizar. Ressalta-se a mudança de tendência do ordenamento jurídico pátrio, referente ao caráter da responsabilidade: adversamente douttrina e jurisprudência elencarem a responsabilidade subjetiva por regra geral, o parágrafo único do art. 927 do Código Material claramente consagra a responsabilidade objetiva, verbis:

Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. (grifo nosso)

 

3. PRESSUPOSTOS

No direito pátrio, a efetiva previsão legal da responsabilidade civil dá-se no art. 186 do Código Civil, onde “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Ressaltam-se então os pressupostos da responsabilidade civil:

  1. ação ou omissão: o dano, para ser reparável, deve ter sido provocado por uma conduta humana, vale dizer, a ocorrência de um ato humano, praticado pelo próprio agente ou por terceiro sob seus cuidados, ou ainda, por animal ou coisa inanimada sob sua guarda;

  2. dano: para se apurar responsabilidade, há que se observar a extensão e concretude do prejuízo ao ofendido, aí compreendido tanto o dano material quanto o moral – ou extrapatrimonial, conforme prefere parte da doutrina moderna;

  3. nexo de causalidade: para que o agente seja responsabilizado pelo dano, sua conduta deve ser a causa ou motivo da produção do prejuízo; por conseqüência, se o dano se deu por fatos alheios à conduta do agente (caso fortuito e força maior), não pode o mesmo ser responsabilizado.

Alguns autores tal qual Savatier (1951, p. 5) sustentam, além dos três consagrados pressupostos da responsabilidade civil, um quarto elemento: a imputabilidade. Contudo, tal entendimento falece em sua raiz: a imputabilidade encontra-se inserta no nexo de causalidade e, diferentemente do direito penal – onde é condição sine qua non à aplicação da pena in concreto -, no direito civil a imputabilidade tem tão-somente o objetivo de se verificar o responsável pelo dano, não se auferindo aí o quesito intuitu personae à reparabilidade por parte do agente.

Ou seja: uma vez que a indenização por dano material ou moral tem caráter antes indenizatório que punitivo – o que se discutirá oportunamente -, a imputabilidade resume-se à identificação do responsável pelo pagamento, e não se haverá ou não pagamento. O afastamento da responsabilidade, portanto, não se dá pela inimputabilidade, e sim por outras excludentes (caso fortuito ou força maior; fato de terceiro; culpa exclusiva da vítima; estado de necessidade; legítima defesa real; exercício regular de direito e estrito cumprimento de dever legal; e cláusula de não-indenizar); tanto o é que, v. g., no ato praticado por absolutamente incapaz – e por isso mesmo, inimputável -, a responsabilidade mesmo assim subsistirá, embora na figura de seu responsável legal (CC, arts. 932, I e II).

Assim, denota-se que a responsabilidade civil tem caráter indenizatório, em se verificando avaliação pecuniária do dano; ou compensatório, se não se puder estimar patrimonialmente o dano, funcionando a prestação pecuniária como um consolo ao ofendido ou à sua família. Ao contrário, a responsabilidade penal tem caráter punitivo, qual seja a aplicação de uma cominação legal (privação de liberdade, restrição de direitos ou multa).

Diz-se “essencialmente punitivo”, para diferenciar entendimento segundo o qual há função de pena privada na indenização por dano moral, como reconhece o direito comparado tradicional (Venosa, 2004, p. 299). Conforme acentua Venosa (2004, p. 206),

[…] forma-se recentemente um entendimento jurisprudencial, mormente em sede do dano moral, no sentido de que a indenização pecuniária não tem apenas cunho de reparação do prejuízo, mas tem também caráter punitivo, educativo e repressor: a indenização não apenas repara o dano, repondo o patrimônio abalado, mas também atua como forma educativa para o ofensor e a sociedade e intimidativa para evitar perdas e danos futuros.

Tem-se, por conseguinte, a responsabilidade penal entendida como o dever jurídico de responder pela ação delituosa que recai sobre o agente imputável (Fragoso, 1985, p. 203). Em contrapartida, a responsabilidade civil é considerada como o dever de reparar um dano material ou moral causado a outrem em razão de ato ilícito. Insta salientar que, adversamente à cristalina diferença conceitual entre os dois tipos de responsabilidade, ambos têm por premissa um fato ilícito, do qual se constatou a ofensa a bem tutelado pelo Direito. Dessume-se, portanto, a diferença de grau, e não de substância, entre as figuras mencionadas – em face do que, lícita é a aplicação simultânea dos dois institutos, sem o temor de se configurar bis in idem.

 

3.1. Ação ou omissão do agente

A conduta humana deriva de um ato, assim entendida a ação – quando o fazer ou agir atenta a dispositivo legal – ou omissão – onde o não-fazer ou omitir fere à norma reguladora. Ou seja: se o agente faz quando não deveria fazer, ou não faz quando o deveria, aí se configura o dano.

No entanto, o ato de per si não é suficiente para a responsabilidade; deve o mesmo estar amparado por sustentáculo jurídico de modo a fundamentar a obrigação de indenizar, de onde se faz mister atentar à voluntariedade do ato, a qual pode ser dirigida à produção do resultado, ou pode se dar pela inobservância de um dever de cuidado. Vale dizer: pode ser respectivamente dolosa, quando o autor premeditou o resultado ou assumiu as consequências deste ou culposa, se o agente não adota precauções indispensáveis, e em razão dessa inobservância causa dano a bem jurídico alheio.

Nessa linha de raciocínio, evidencia-se o dolo na ação praticada pelo agente com consciência e vontade de produzir o dano, ocasião em que se verifica o dolo direto. Entretanto, a vontade do agente pode não ser a produção do resultado danoso, objetivando o ofensor algo diverso – assumindo, no entanto, o risco de causar, na busca de seu intento, um dano a outrem. Trata-se, pois, do chamado dolo eventual.

A conduta culposa, por sua vez, consubstancia-se na inobservância a cuidados objetivos – vale dizer, os cuidados para evitar dano a bens ou direitos jurídicos alheios -, redundando no dano ao ofendido mesmo sem a vontade do ofensor nesse sentido.

Cuida-se aqui de frisar a culpa inconsciente, vez que, em sede de responsabilidade civil, a culpa consciente é equiparada ao dolo. Desta forma, a culpa inconsciente ostenta três variantes: negligência, a omissão da atenção, capacidade, solicitude e discernimento, ou seja, o não fazer quando o deveria; imprudência, a afoiteza, precipitação irresponsável sem cautela, totalmente contrária ao comportamento sensato; imperícia, a falta de habilidade ou inaptidão para praticar certo ato, do qual se espere destreza e técnica para tanto.

Tocante à conduta danosa, tem-se as seguintes variantes de culpa:

  1. in eligendo: representante ou preposto comete o dano, e seu patrão ou comitente responsabiliza-se pela indenização, por ter mal escolhido quem lhe representasse;

  2. in vigilando: a pessoa responsável pela fiscalização, supervisão ou vigilância se descuida de tal mister, em razão do que ocorre o dano;

  3. in comittendo: o agente pratica um ato defeso em lei ou outra norma jurídica, vindo a lesar direito de outrem;

  4. in omittendo: ao contrário, o agente abstém-se de praticar um ato exigido pela lei ou outra norma jurídica, vindo a lesar direito de outrem;

  5. in custodiendo: o agente tem sob sua guarda (custódia) animal, pessoa ou objeto e, em razão de descuido, gera dano a alguém.

 

A culpa também pode ser classificada em graus, quais sejam culpa grave, oriunda da imprudência ou negligência grosseira e extrema do indivíduo, o qual inobserva toda a previsão esperada de um homem mediano; culpa leve, quando advém da inobservância de cautelas ordinárias, podendo ser evitada com a atenção esperada por um homem comum; e culpa levíssima, onde o dano somente poderia ser evitado com atenção incrivelmente acurada, própria de especialistas.

A culpa levíssima perdeu relevância no contexto jurídico, vez que também obriga a indenizar. Bem assim, a gradação da culpa não mais tem importância fática: é a extensão do dano, e não da culpa, o parâmetro para a fixação do quantum indenizatório (CC, art. 944. p. un.).

Sob o mesmo prisma, a aplicação dos conceitos de dolo e culpa à responsabilidade perdeu sua finalidade prática, haja vista a obrigação de indenizar se firmar com a constatação do comportamento danoso, pouco importando se culposo ou doloso; dentro da responsabilidade aquiliana, ainda que levíssima a culpa do agente causador do dano, cumpre-lhe indenizar a vítima. Como a indenização deve ser o mais possível completa – posto que indenizar significa tornar indene a vítima -, o agente causador do dano, em tese, tem a obrigação de repará-lo integralmente, quer tenha agido com dolo, quer com culpa levíssima (Rodrigues, 2003, p. 185).

Deve-se obtemperar que o direito pátrio, em sinal de sua adaptação aos avanços por que passa a sociedade, passa por um processo de valorização cada vez maior da responsabilidade civil sem culpa, ou seja, a responsabilidade civil objetiva – deixando-se gradativamente de considerar a culpa ou dolo do agente como pressuposto ou elemento essencial da responsabilidade civil.

Abalizando tal argumento, Gagliano e Pamplona Filho (2003, p. 29) asseveram:

A culpa, portanto, não é um elemento essencial, mas sim acidental, pelo que reiteramos nosso entendimento de que os elementos básicos ou pressupostos gerais da responsabilidade civil são apenas três: a conduta humana (positiva ou negativa), o dano ou prejuízo, e o nexo de causalidade.

Entretanto, ao contrário da primeira impressão sobre o caso, não se deve desprezar a culpa no contexto da responsabilidade civil, conforme bem adverte Pereira (1997, p. 391):

A abolição total do conceito da culpa vai dar num resultado anti-social e amoral, dispensando a distinção entre o lícito e o ilícito, ou desatendendo à qualificação da boa ou má conduta, uma vez que o dever de reparar tanto corre para aquele que procede na conformidade da lei, quanto para aquele outro que age ao seu arrepio.

Destarte, ainda que consideravelmente enfraquecida sua importância, a culpa ainda ocupa lugar de destaque no contexto da responsabilidade civil.

 

3.2. Dano

A fim de satisfazer suas necessidades nas relações sociais, o homem adquire direitos e assume obrigações, sendo, portanto, sujeito ativo e passivo de relações jurídico-econômicas – no que o conjunto dessas situações jurídicas individuais, suscetíveis de apreciação ou projeção econômica, designa patrimônio, sem dúvida a projeção econômica da personalidade (Diniz, 2001, p. 504). Decorrência lógica, se uma pessoa sofre dano em seu patrimônio, tem um dano patrimonial. Por conseqüência, torna-se relativamente simples a reparação: basta se mensurar a avaliação pecuniária do bem atingido e buscar repará-lo ou substituí-lo, oportunidade em que se considera a reparação de caráter ressarcitório – ou, como alguns doutrinadores preferem, repositivo.

Na esfera civilista, o dano era entendido em regra como o abalo sofrido pela vítima com um conseqüente prejuízo de ordem econômica (dano patrimonial). Não poderia ser de outra forma, vez que a índole liberal-positivista do Código Civil de 1916 entronizava o caráter pecuniário da relação jurídica, advindo disso a premissa de que somente as coisas e bens economicamente apreciáveis primam pela competente reparação ou compensação pecuniária.

Entretanto, conforme já dito antes, com o advento da Magna Carta de 1988, reconhecido também ficou o dano moral (art. 5º, inciso X), onde bens de ordem moral e economicamente inapreciáveis – tais quais a vida, a honra, a liberdade, a defesa e o nome, emanações da personalidade natural – também merecem a respectiva indenização. Melhor dizendo: sobrevindo, em razão de ato ilícito, perturbação nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos e nos afetos de uma pessoa, configura-se o dano moral, passível de indenização (BRASÍLIA, STJ, REsp n. 8.768/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, 1992). Sobre o dano moral, este será melhor abordado oportunamente.

Em face disso, diz-se que dano é a lesão injusta, que acarreta prejuízo a interesse juridicamente tutelado. Atendendo à evolução socionormativa, o Código Civil, em seu art. 186, preceitua que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (grifo nosso)

Tocante ao dano patrimonial, o Código Civil de 2002 preceituou em seu art. 402 as hipóteses genéricas de configuração. O primeiro (dano emergente) configura-se com a diminuição do patrimônio da vítima, constatando-se efetivamente o que tenha perdido. O segundo (lucro cessante) consubstancia-se no que a vítima razoavelmente deixou de ganhar (art. 402, segunda parte); é uma estimativa que considera o que o ofendido viria a receber, se não tivesse ocorrido o dano.

Acerca do valor da indenização por dano patrimonial, o art. 944 do Código Civil delimita o parâmetro para o quantum: a extensão do dano. Assim, se o ofendido perde ou deixa de ganhar um bem ou valor, simples é a respectiva valoração da indenização, eis que possível é a mensuração econômica do dano e seus acessórios – juros, multa, atualização monetária e honorários de advogado (art. 944, caput), bem como indenização suplementar se for o caso (art. 944, p. un.).

Já em relação à indenização por dano moral, delicada é a situação. No dano patrimonial, vislumbra-se a possibilidade de retornar-se ao status quo ante, o que não ocorre quando se trata de dano moral: pode-se facilmente substituir um bem destruído ou furtado por outro, mas não se pode, por exemplo, restituir a vida de um filho aos seus pais.

Observa-se, portanto, que a linha divisória entre o dano patrimonial e o dano moral, além do interesse jurídico atingido, situa-se no objetivo da reparação do dano sofrido. A reparação no caso de dano material visa a reconstituir o patrimônio do lesado; quando se trata de dano moral, no entanto, a reparação não tem o condão de restabelecer o status quo ante, mas sim de compensar, através de um valor pecuniário a ser arbitrado prudentemente pelo juiz, com o fito de assegurar à vítima ou lesionado a oportunidade de mitigar o seu sofrimento.

Infira-se, por fim, que ao prejudicado cumpre provar o dano, vez que somente o dano efetivo é passível de indenização, na dicção do art. 403 do Código Civil; não é bastante a demonstração de fato suscetível de provocá-lo, eis que o assim considerado dano hipotético não justifica a reparação. Do contrário, a satisfação de prejuízo inexistente implicaria, em relação ao suposto ofensor, em enriquecimento sem causa.

Com efeito, o dano hipotético é mera suposição de dano, sendo certo que somente é passível de indenização o prejuízo efetivamente sofrido, e não apenas potencialmente: sem prova ou pelo menos indícios consideráveis do dano, não há o que se falar em responsabilidade civil, dado que mesmo se comprovando a violação de um dever jurídico e se concluindo pela culpa ou dolo do ofensor, nenhuma indenização será devida se de tal violação não se originar prejuízo. Portanto, se a ação fundar-se em mero dano hipotético, não cabe reparação.

Entretanto, será devida indenização se se verificar a perda da chance (perte d’une chance), isto é, a perda de uma oportunidade concreta de obtenção de vantagem, interrompida em razão de má conduta do responsável: na perda da chance, em que pese não se constatar efetiva e concretamente o dano, comprova-se grande e fundamentada possibilidade de o ofendido obter um ganho ou vantagem, impedida no entanto pela conduta danosa do agente. Tem-se, por exemplo, o advogado que deixa de recorrer ou de ingressar com determinada medida judicial: pode ser responsabilizado pela perda de um direito eventual de seu cliente, se restar comprovada a possibilidade de êxito – como por exemplo, se o direito em que se fundamenta a ação é pacificamente reconhecido pela jurisprudência ou sumulado pelos Tribunais Superiores, ou se explicitamente resguardado por norma jurídica.

Citado por Kehl (2009), Cavalieri Filho conceitua a perda da chance da seguinte forma:

nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, como progredir na carreira artística ou no trabalho, arrumar um novo emprego, deixar de ganhar uma causa por falha do advogado etc.

Conforme bem aponta Kehl (2009), alguns critérios são importantes para caracterizar a perda de uma chance:

a) deve existir uma oportunidade provável e futura de obter uma vantagem e de evitar um prejuízo; b) uma oportunidade deve ser suficiente para produzir uma chance que seguirá um curso normal das coisas, efetivando um erro danoso; c) o resultado da oportunidade deve ser incerto no momento do evento danoso; d) devido a um erro danoso a oportunidade deva ser frustrada definitivamente; e) a vítima deve estar, no momento do evento danoso, situada fática e juridicamente em uma situação idônea para aspirar a obtenção das vantagem que proporcionaria a oportunidade.

Vale sopesar que a chance deve ser estimável e não casual: deve ter uma probabilidade concreta de vir a se efetivar. Nesse sentido, citado por Kehl (2009), Stiglitz explica que “o juiz apreciará, então, não o valor global dos ganhos ou perdas, mas a proporção deste valor em que concreto representa a frustração da chance, que é atribuível ao agente segundo as circunstâncias do caso”.

É indubitável, portanto, que a perda de uma chance é demonstrada pela certeza do dano, através da prova de um valor ou vantagem tido como certo e determinado – por exemplo, no caso de um concurso público – e a respectiva frustração em razão de ato ilícito. É, portanto, diferente do dano hipotético, o qual não tem fundamento nem indício de sua efetiva probabilidade de se concretizar.

Conforme bem assevera a jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DE ADVOGADO PELA PERDA DO PRAZO DE APELAÇÃO. TEORIA DA PERDA DA CHANCE. APLICAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. ADMISSIBILIDADE. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. NECESSIDADE DE REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7, STJ. APLICAÇÃO. – A responsabilidade do advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual. Embora não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual no exercício do mandato. – Ao perder, de forma negligente, o prazo para a interposição de apelação, recurso cabível na hipótese e desejado pelo mandante, o advogado frusta as chances de êxito de seu cliente. Responde, portanto, pela perda da probabilidade de sucesso no recurso, desde que tal chance seja séria e real. Não se trata, portanto, de reparar a perda de “uma simples esperança subjetiva”, nem tampouco de conferir ao lesado a integralidade do que esperava ter caso obtivesse êxito ao usufruir plenamente de sua chance. – A perda da chance se aplica tanto aos danos materiais quanto aos danos morais. – A hipótese revela, no entanto, que os danos materiais ora pleiteados já tinham sido objeto de ações autônomas e que o dano moral não pode ser majorado por deficiência na fundamentação do recurso especial. – A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. Aplicação da Súmula 7, STJ. – Não se conhece do Especial quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles. Súmula 283, STF. Recurso Especial não conhecido. (BRASÍLIA, STJ, REsp 1079185/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2008)

Assim, inobstante a não concretude do dano, responde o agente pela respectiva perda da chance em razão da forte probabilidade de obtenção de vantagem desperdiçada – o que, a nosso ver, aproxima-se bastante do art. 402, segunda parte, do CC, em face da razoável oportunidade de ganho pelo ofendido (“razoavelmente deixou de ganhar”).

Ainda, obtempera-se que nem sempre cabe à vítima o ônus de comprovar sua existência, existindo casos em que o dano é presumido. Têm-se por exemplo os juros moratórios onde, verificada a mora do solvens, deve o mesmo pagar ao credor os juros aludidos, em uma forma de indenização ao prejuízo que, no caso, presume-se ter sofrido o credor. Ou ainda, a dívida paga pelo devedor e posteriormente levada pelo credor a registro nos órgãos de proteção ao crédito (SPC, SERASA e afins).

 

3.3. Nexo de causalidade

Para existir a obrigação de indenizar, é imperiosa a ligação entre a conduta do ofensor e o dano ocorrido, numa perfeita relação de causa e efeito – à qual se imprime o nome de nexo causal. Não havendo tal relação, inexiste a obrigação de indenizar.

No tocante à determinação do nexo causal, dois obstáculos se firmam: o primeiro tange à dificuldade de sua prova; o segundo, a delimitação e especificação da causa do dano, principalmente nas hipóteses em que o dano ocorre de uma sucessão de acontecimentos.

Diniz (2008, p. 108) ressalva:

[…] não será necessário que o dano resulte apenas imediatamente do fato que o produziu. Bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido. Este poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição para a produção do dano, o agente responderá pela conseqüência.

Ressalte-se ser curial verificar-se se a condição e circunstâncias pelas quais ocorreu o dano não se originaram de uma das hipóteses do art. 188 do Novo Código Civil, ou seja, legítima defesa ou exercício regular de direito (inciso I), ou estado de necessidade (inciso II). Ou, nas salutares palavras de Garcez Neto (1970, p. 48-49):

O que se deve indagar é, pois, qual dos fatos, ou culpas, foi adequado para o evento danoso, isto é, qual dos atos imprudentes fez com que o outro, que não teria conseqüências por si só, determinasse, adjuvado por ele, o acidente. Pensamos, aqui, inteiramente de acordo com Aguiar Dias, que, sempre que seja possível estabelecer a inocuidade, ou melhor, a inadequação de um ato, ainda que imprudente, se não tivesse ocorrido a intervenção de outro ato imprudente, não se deve falar em concorrência de culpa. A responsabilidade é de quem interveio com culpa ‘adequada’ para o dano… Assim, a culpa da vítima perde toda a expressão, desde que absorvida pela culpa exclusiva do agente. Como ensina Aguiar Dias, neste ponto afinado com a teoria da causalidade adequada: “a culpa grave necessária e suficiente para o dano exclui a concorrência de culpas”.

 

 

4. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

A responsabilidade civil pode advir de uma inobservância a um dever puramente legal – e assim será extracontratual, também conhecida por responsabilidade “aquiliana” – ou, além de ilegal, originar-se-á de um descumprimento a dever contratual. Entretanto, há atos que, conquanto não sejam contratos, também não são atos ilícitos – no que se verifica a impropriedade das expressões ressaltadas.

Conforme dito, no tocante ao vínculo entre ofensor e vítima, a responsabilidade civil é dividida em duas modalidades: contratual, em que se evidencia inexecução previsível e evitável, por uma parte ou seus sucessores, de obrigação nascida de contrato prejudicial à outra parte ou seus sucessores – no que se prende às regras comuns do contrato, acarretando assim a presunção de culpa -; e extracontratual, onde se observa a independência de contrato para sua constatação, sendo necessário, no entanto, invocar o dever negativo ou obrigação de não prejudicar, e, comprovado o comportamento antijurídico, evidenciar que ele percutiu na órbita jurídica do paciente, causando-lhe um dano específico.

Pelo princípio da Autonomia da Vontade, os contratantes, antes de aperfeiçoarem o contrato, têm a faculdade de aceitá-lo ou não, de acordo com as suas conveniências, eis que o contrato é visto como fenômeno da vontade e não como fenômeno econômico-social (Fiúza, 2007, p. 402). Equivale a dizer: dispõem do livre-arbítrio de escolher com quem e quando pactuar, bem como a livre discussão do contrato e pormenores (obrigação contratual, cláusulas, objeto do contrato, etc.), salvo casos especiais previstos em lei, como os contratos solenes, em que são exigidas formalidades previstas em lei, sob pena de nulidade.

Obtempere-se: embora existam tais liberdades no que concerne ao surgimento do contrato, o mesmo não ocorre no concernente à liberação das partes às imposições do mesmo, uma vez presente o princípio genérico pacta sunt servanda, segundo o qual, o contrato tem força de lei entre as partes, e deve ser cumprido – à exceção de alguns casos em que a obrigatoriedade das convenções sofre limitações impostas pela idéia da ordem pública, tais como relações de consumo e locação de imóvel urbano. Destarte, uma vez feito entre os contratantes o pacto, não há como se liberar unilateralmente do avençado, passando o contrato a ter força de lei entre aqueles que o firmaram.

Por conseguinte, o inadimplemento de um contratante gera ao outro uma frustração de expectativa, ocasionando para o mesmo um dano, seja na esfera patrimonial, seja de ordem moral – visto que, na esmagadora maioria dos casos, celebrado o contrato, o contratante passa a contar com o certo cumprimento da obrigação do outro, e, com base nisso, regra sua vida e seus compromissos. Assim, constatada a conduta violadora da obrigação preestabelecida, o dano e o nexo causal entre o fato e a ofensa, resta ao inadimplente a obrigação de indenizar, donde resulta a responsabilidade contratual.

Por outro lado, verificado fato alheio à vontade do devedor como causa determinante do inadimplemento, não há que se atribuir, em regra, responsabilidade àquele. Com efeito, o Código Civil, em seu art. 389, ao afirmar que “não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”, refere-se ao inadimplemento voluntário – excluindo a responsabilidade do devedor, portanto, se o não cumprimento ocorreu por motivo alheio à sua vontade, tal qual se dá na hipóteses de caso fortuito ou força maior (CC, art. 393)

A esse mister, o mencionado artigo 389 preceiuta dois tipos de inadimplemento voluntário: a) absoluto, quando a obrigação não for cumprida, nem poderá sê-la, e o credor não mais tiver possibilidade de receber aquilo a que o devedor se obrigou; e b) relativo, quando a obrigação ainda não foi cumprida no tempo, lugar e forma devida, porém poderá sê-la, com proveito, para o credor, hipótese em que se terá a mora (Gomes, 1976, p. 12).

De qualquer modo, a conseqüência para o inadimplemento, seja ele absoluto ou relativo, é a mesma, cabendo ao devedor inadimplente responder por perdas e danos, a fim de reparar o prejuízo sofrido pelo credor lesado pelo descumprimento do contrato: havendo culpa, a obrigação de reparar o dano causado é a mesma, haja dolo ou culpa em sentido estrito. Dessume-se daí que o Código Civil aufere o mesmo tratamento à conduta dolosa e à culposa do agente, fazendo-se apenas a ressalva de haverem certas hipóteses, na responsabilidade contratual, em que só o dolo ou só a culpa do inadimplente originam o dever ressarcitório do inadimplente (Diniz, 2008, p. 40-43).

A responsabilidade extracontratual ou aquiliana, por sua vez, tem como pressuposto fato lesivo à esfera jurídica de outrem prescindindo de acordo de vontades anterior entre ofensor e ofendido: É oriunda do ilícito extracontratual, ou seja, da lesão a um direito subjetivo ou da prática de um ato ilícito independentemente da existência de vínculo contratual entre lesado e lesante. Resulta portanto da inobservância da norma jurídica ou da infração ao dever jurídico geral de abstenção atinente aos direitos reais ou de personalidade, ou melhor, de violação à obrigação negativa de não prejudicar ninguém.

Já dito antes, a designação aquiliana tinha por origem a Lex Aquilia de Damno que, no século III a. C, introduziu no Direito a idéia de culpa como pressuposto da obrigação de indenizar, embora em termos bastante restritos. Hoje, alcança diversos casos em que uma pessoa tem de reparar danos de outrem, mesmo sem ter qualquer culpa (responsabilidade objetiva ou pelo risco, visando sobretudo a reparação de danos resultantes de atividades perigosas).

Rodrigues (2003, p. 9) enfatiza a distinção entre as espécies de responsabilidade:

Na hipótese de responsabilidade contratual, antes da obrigação de indenizar emergir, existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico derivado da convenção; na hipótese da responsabilidade aquiliana, nenhum liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a vítima, até que o ato daquele ponha em ação os princípios geradores de sua obrigação de indenizar.

Tal distinção, contudo, nem sempre é cristalina: há casos em que fatos de natureza contratual e extracontratual ocorrem simultaneamente. Com efeito, há entendimentos que reconhecem igual natureza às responsabilidades em face da grande identidade de pressupostos, sendo portanto supérflua a distinção: em ambas, mister se faz a existência do dano, da culpa do agente e o dano experimentado pela vítima ou pelo outro contratante.

Entretanto, apesar da identidade de pressupostos a ponto de na maioria das vezes regularem-se pelos mesmos princípios, as modalidades são distintas. Tanto o é, que o art. 186 do CC regula as conseqüências advindas da responsabilidade extracontratual, ao passo que o art. 389 prevê a responsabilidade contratual.

 

 

5. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA

5.1. Generalidades

A responsabilidade subjetiva, também conhecida por responsabilidade civil stricto sensu, resulta de ação ou omissão culposa do agente. Ou seja: não basta, para que surja a obrigação de indenizar, o dano e o nexo causal; é necessária também – e se pode dizer condição sine qua non para se jungir o agente à obrigação de indenizar – a comprovação de que o ofensor tenha agido com dolo ou culpa.

Adotada pelo direito brasileiro como regra, a responsabilidade civil subjetiva surge quando o agente tenha procedido com culpa – aqui considerada lato sensu, abrangendo o dolo e a culpa stricto sensu, em qualquer das gradações que aquele ou esta possam apresentar.

Dentro da responsabilidade civil subjetiva, delimitam-se duas modalidades:

  1. comum ou normal, quando, para que o agente seja obrigado a indenizar, basta que ele tenha procedido com culpa lato sensu, isto é, sem distinguir entre dolo e culpa stricto sensu em qualquer das respectivas graduações – adotado como regra geral, e consagrado pelo art. 186 do Código Civil -;

  2. restrita a dolo ou culpa grave, por exceção à regra geral, onde a responsabilidade subjetiva só surge quando o agente tenha procedido com dolo ou com culpa grave – casos em que o agente fica liberado quando só lhe for imputável a chamada mera culpa ou culpa simples.

Lembre-se que há culpa grave (culpa lata) quando o agente tiver procedido de forma anormalmente falha, seja por displicência, seja por despreparo, seja por outros motivos; e se vê culpa simples (culpa levis) quando o agente apenas não observou os cuidados do homem comum, do bom cidadão, e que os romanos traduziam na idéia do bonus pater famílias.

São exemplos de responsabilidade civil restrita a dolo ou culpa grave, a responsabilidade no transporte aéreo (art. 248 do Código de Aeronáutica) e a responsabilidade no crime de denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal). Ressalte-se que, quanto ao primeiro exemplo, a doutrina é vacilante quanto à conceituação, se contratual ou extracontratual, ou ainda, uma fusão das duas.

Durante muito tempo, foi também típico exemplo desta responsabilidade civil restrita a dolo ou culpa grave, a responsabilidade do patrão por acidente de trabalho do seu empregado (Súmula 229 do STF); hoje, porém, a Constituição Federal, em seu art. 7º, inciso XXVIII, impõe ao empregador obrigação de indenizar, sempre que este “incorrer em dolo ou culpa”, sem distinguir entre culpa grave ou simples.

Já a responsabilidade objetiva independe da culpa; à vítima, cumpre apenas provar do dano e o vínculo causal entre a atividade do agente e a ofensa irrogada: sem cogitar da imputabilidade ou investigar a antijuridicidade do fato danoso, o que importa para assegurar o ressarcimento é a verificação se ocorreu o evento e se dele emanou o prejuízo. Cabe distinguir, no entanto, a responsabilidade objetiva da presunção legal de culpa: nesta, o ônus da prova é invertido, tendo o responsável o encargo de se desincumbir da presunção; o ofendido não precisa provar a culpa do ofensor; contudo, não se afasta in casu o requisito subjetivo da responsabilidade.

Importa frisar, ainda, que a presunção de culpa é ditada, conforme o caso, ora pela lei, ora pela jurisprudência.

Em termos práticos, a culpa presumida é muito semelhante à responsabilidade objetiva, pois nesta também é presumido o comportamento danoso do agente; a única diferença – doutrinária, diga-se de passagem – é que, no sistema da culpa, sem ela, real ou artificialmente criada, não há responsabilidade, ao passo que, no sistema objetivo, responde-se sem culpa, ou melhor, esta indagação não tem lugar (Aguiar Dias, 2006, p. 99-100).

O direito nacional filiou-se, como regra geral, à teoria da responsabilidade subjetiva, como se depreende do disposto no artigo 186 do Código Civil. Inobstante, acolheu por exceção a responsabilidade objetiva, como se depreende do art. 927, parágrafo único, se a atividade normalmente gerar ou implicar risco – por exemplo, o contrato de depósito, em que o depositário responde pelos danos causados à coisa objeto do depósito se não provar que a coisa pereceu por caso fortuito ou força maior.2

Bem assim, a legislação especial apresenta previsões de responsabilidade objetiva, como a Lei de Acidentes do Trabalho, o Código de Aeronáutica, o Código de Defesa do Consumidor, a Lei das Estradas de Ferro, dentre outras.

Adversamente à adoção da subjetividade como regra geral, a responsabilidade civil caminha velozmente em direção à doutrina objetiva. Tanto o é que, em concretização a esta mudança de tendência, o Código Civil de 2002 deu maior consideração e destaque à responsabilidade objetiva que o Código de 1916, conforme se depreende do art. 927, parágrafo único, verbis:

Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (grifo nosso)

Em corroboração, o atual posicionamento doutrinário e jurisprudencial convergem na insatisfação da responsabilidade civil fundada na culpa tradicional: se a mesma não dá resposta segura à solução de numerosos casos, nos quais a exigência de provar a vítima o erro de conduta do agente deixa o lesado sem reparação, o mais lógico e acertado seria admitir-se a responsabilidade tão-somente pelas circunstâncias do fato.

 

 

5.2. O risco enquanto elemento da responsabilidade objetiva

Ainda quanto ao art. 927 do Código Civil, a responsabilidade será objetiva “quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. Mas, o que se deve entender por risco?

Inicialmente, mister se faz ressaltar que tudo adquire significado dentro de certo contexto: hipoteticamente, se alguém introduz um instrumento cortante em outrem, isso em princípio seria um ato ilícito; mas, se esse alguém for um médico manuseando um bisturi numa cirurgia, a situação muda totalmente de enquadramento.

Tentando amenizar a situação, poder-se-ia valer do escólio de Schreiber 2002, p. 3), ao dizer que a

[…] história das codificações mostra que um código consiste menos nas suas palavras, e mais no que sobre elas se constrói. De fato, o conteúdo de um código é sempre dinâmico, no sentido de que suas normas não são nunca dadas, mas construídas e reconstruídas dia-a-dia pelos seus intérpretes.

Contudo, forçoso é admitir a falha do legislador civilista ao omitir parâmetros para disciplinar a extensão e os contornos do conceito de risco, bem como ao não indicar mecanismos ou fontes que fornecessem tal informação. Desta forma, abriu-se margem a grande carga de subjetividade no enquadramento de tal idéia: o que pode ser arriscado a um, podê-lo-á não ser a outrem; a esse respeito, a jurisprudência levará anos ou até décadas, para pacificar o respectivo entendimento – em face do que, até lá, proferir-se-ão inúmeras decisões conflitantes, causando, também, aumento significativo de demandas judiciais indenizatórias, a serem apreciadas nos diversos juízos e tribunais, já tão assoberbados.

Com efeito, Gonçalves (2005, p. 25) preleciona:

[…] a admissão da responsabilidade sem culpa pelo exercício de atividade que, por sua natureza, representa risco para os direitos de outrem, da forma genérica como está no texto, possibilitará ao Judiciário uma ampliação dos casos de dano indenizável.

Sob outro norte, de acordo com o Dicionário Aurélio, “risco” é o perigo ou a possibilidade de perigo, ou ainda, a possibilidade de perda ou de responsabilidade pelo dano3, tendo-se, assim, uma abrangência por demais ampliada da expressão e favorável a injustas ou excessivas imposições de responsabilidade.

Em outras palavras: é necessária a delimitação do conceito de risco, para a adequada abordagem jurídica; do contrário, tormentosa será a tarefa de se enxergar a que categoria de pessoas estaria o legislador se referindo como executora de atividade de risco. Exemplos: ao dirigir seu automóvel, o indivíduo comum estaria exercendo atividade de risco? Havendo um acidente de veículo e conseqüentes danos, dever-se-ia responsabilizar o motorista à respectiva reparação, independentemente de comprovação da sua culpa? O vendedor de uma loja, ao exercer seu ofício, não estaria se arriscando a ser roubado? O exercício do magistério não expõe o professor ao risco de ter problemas na voz? Questionamentos como este serão motivo de acaloradas discussões, em torno da atividade de risco.

Nesse mister, para efeitos de responsabilidade objetiva, tem-se associada a idéia de risco à probabilidade de dano inerente à atividade, ou seja, que a potencialidade de prejuízo a outrem razoavelmente esperada ao se exercer determinado meio de vida, ofício ou profissão. Mais ainda, porque a habitualidade da prática de determinada atividade gera o dever do agente em envidar esforços para evitar o dano, através da supressão do risco – principalmente, se a prática de tal atividade gerar-lhe algum tipo de lucro.

Assim, se o agente lucra com a exposição de outrem a possíveis prejuízos – e conseqüentemente, ao risco de dano -, a contrapartida lógica é esse mesmo agente arcar com os ônus da indenização, caso se concretize o risco e assim se verifique o efetivo prejuízo, situação que, de per si, basta para fundamento da indenização, sendo portanto dispensável a comprovação da culpa lato sensu para fundamento do dever de indenizar.

Em síntese, o risco previsto pelo parágrafo único do art. 927 do Código Civil remonta às hipóteses em que a própria atividade econômica pode, por si só, gerar um risco maior de dano aos direitos do empregado, no sentido de se vislumbrar a probabilidade de ofensa à saúde do obreiro. Deveria, portanto, o Direito Civil estipular parâmetros informativos e orientadores do risco, ao contrário de introduzir na codificação o conceito aberto de atividade de risco e transferir para os magistrados e doutrinadores a tarefa de definir o que efetivamente vem a ser atividade de risco, apta a justificar a obrigação de reparar o dano – no que se espera que essa omissão conceitual do legislador não induza ao desastroso casuísmo, enquanto não se uniformiza o conceito aludido.

 

6. CONCLUSÃO

Durante toda a exposição deste trabalho, procurou-se mostrar a evolução da concepção de responsabilidade civil e seu enquadramento no contexto social. Bem assim, observou-se que não somente o dano material é indenizável, mas também o é o dano moral embora com outra conotação e natureza.

Tal avanço representa importante conquista do ser humano enquanto membro da sociedade, mormente no que diz respeito à proteção de seus direitos enquanto pessoa e portanto em obediência ao festejado princípio da Dignidade Humana, estampado no art. 1°, inciso III, da Constituição Federal.

 

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1 Nesse sentido, preceitua o artigo 2º da Lei da Boa Razão, datada de 18 de agosto de 1769, no qual se vaticinava “que o direito romano servisse de subsídio, nos casos omissos, não por autoridade própria, que não tinha, mas por serem muitas as suas disposições fundadas na boa razão”.

2 Conforme o art. 642 do Código Civil, “o depositário não responde pelos casos de força maior; mas, para que lha valha a escusa, terá de prová-los”.

3 “1. Perigo ou possibilidade de perigo. 2.Situação em que há probabilidades mais ou menos previsíveis de perda ou ganho como, p. ex., num jogo de azar, ou numa decisão de investimento. 3.Em contratos de seguros, evento que acarreta o pagamento da indenização: A apólice cobre o risco de incêndio. 4.Jur. Possibilidade de perda ou de responsabilidade pelo dano. [Cf. álea1.]”

Luiz Carlos Goiabeira Rosa

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