Criminalização da homofobia

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No último dia 5 de maio, o Supremo Tribunal Federal reconheceu legalmente as uniões entre indivíduos do mesmo sexo. O assunto gera muita polêmica e sempre encontrou uma série de opositores, em especial de setores religiosos e mais conservadores de nossa sociedade. Neste particular, a decisão representa um marco em nosso país, embora não se possa falar que foi pioneira haja vista que já era reconhecida em diversos países. Somente a título de exemplo, resta destacar que diversos países europeus, cada um a sua maneira, já reconheceram direitos entre casais formados por pessoas do mesmo sexo, dentre eles Inglaterra, Espanha, Noruega, Hungria, Holanda, Suécia. Dinamarca, Islândia, Alemanha, Bélgica, Suíça e Portugal. Na América, o Canadá, alguns estados dos EUA, México; na América Latina destaca-se a Argentina como precursora. Segundo a decisão do Supremo, as regras aplicáveis à união estável prevista no Código Civil devem ser aplicadas à união entre pessoas do mesmo sexo, desde que fique comprovada a convivência pública, contínua e duradoura. Assim, poderão pleitear pensão em caso de morte ou separação, partilha de bens e direitos sucessórios.

A decisão foi um marco contra o preconceito ainda muito alto em nossa sociedade em pleno século XXI e terá grande repercussão em diversos setores. Tal reconhecimento tem amparo constitucional, haja vista a consagração dos princípios da igualdade e dignidade.Agora resta ao legislador avançar na regulamentação dos direitos, sob pena do judiciário ter que continuar suprimindo essas lacunas e acabar legislando de maneira indireta mas, em algumas situações, zelando pela aplicação da constituição.Por outro lado, o projeto de lei complementar n. 122/06 que criminaliza a homofobia ainda não foi aprovado.

Na data de ontem, foi retirado de pauta pela Comissão de Direitos Humanos do Senado, após muito tumulto, sem previsão para julgamento, tendo a sessão terminado com insultos e xingamentos envolvendo parlamentares. Ao que parece, mais uma vez segmentos religiosos conseguiram barrar a votação, uma vez que representantes da Frente Parlamentar Evangélica requereram o adiamento aduzindo que deveriam ser realizadas audiências públicas e que a questão deveria ser debatida com exaustão.O referido projeto pretende alterar a Lei de Racismo para criminalizar, outrossim, os atos de homofobia, estendendo a eles as mesmas punições impostas aos crimes de preconceito racial. O projeto pune com pena de reclusão de um a três anos condutas discriminatórias, tais como recusar o atendimento em bares e restaurantes e reprimir beijos ou abraços em locais públicos. O ponto mais polêmico é a criminalização com a pena de um a três anos, e multa para aqueles que induzirem ou incitarem a discriminação ou preconceito contra os homossexuais. Há uma preocupação de que seja afetada a liberdade de pregação de padres e pastores dentro dos dogmas das respectivas religiões e que poderia ser reprimida a liberdade de expressão desses segmentos.Para tentar compor e amenizar a situação foi incluída uma emenda permitindo que todas as religiões e credos exerçam sua fé, dentro de seus dogmas, desde que não incitem a violência.Todavia, mais uma vez aparece o direito penal como a solução de todos os problemas, como se a criminalização fosse efetivamente, com o seu caráter de prevenção geral, evitar a prática de tais condutas e como se quem se opusesse à criminalização fosse contra os direitos de homossexuais. O afã criminalizatório que tem ocorrido no Brasil nos últimos anos tem gerado a edição de um número muito elevado de leis criminalizando condutas, cujos direitos poderiam ser perfeitamente amparados por outros ramos do direito.Tal movimento é totalmente contrário ao princípio da intervenção mínima que reza que o direito penal só deve atuar quando os outros ramos do direito forem insuficientes para tutelar o bem jurídico em questão.Nesse caso, ao que parece, é necessário primeiro alterar o Código Civil e resguardar todos os direitos decorrentes da união homoafetiva, bem como discutir questões mais práticas e importantes, tais como, por exemplo, a possibilidade de adoção, dentre outros, antes de pensar em criminalizar especificamente condutas. Até porque já existe no Código Penal a previsão do crime de injúria que poderia ser aplicado, caso qualquer homossexual sinta sua honra ofendida.Nestes termos, andou bem a recente decisão do Supremo, que parece irá contribuir para a formação de uma sociedade mais igualitária, humana e com menos preconceito. Agora resta ao legislador definir os limites e regulamentar as questões de maneira mais pontual.

Fernanda Freixinho

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