Ativismo judicial: por uma delimitação conceitual à brasileira

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Ricardo Vieira de Carvalho Fernandes1

 

Resumo: No Brasil, algumas vezes a conceituação do termo ativismo judicial não é apresentada antes de se escrever sobre o tema; o que gera certa dificuldade de entender seus efeitos e os critérios de análise da legitimidade dessa atuação. O presente estudo tem o escopo de propor um conceito para ativismo judicial no País. Para tanto, preliminarmente propõe a apresentação das diferenças conceituais entre judicialização, judicialização da política e ativismo judicial. Utilizou-se da pesquisa bibliográfica aplicada pelo método dedutivo, que parte do geral para demonstrar o fenômeno particular observado. Sem se pretender discutir questões afetas à legitimidade de uma atuação ativa do Judiciário – ou sua ausência –, o presente estudo é concluído com a proposição de um conceito serve como base teórica inicial para os debates crescentes sobre a temática.

Palavras-chave: Ativismo judicial, judicialização das relações sociais, judicialização da política.

Abstract: In Brazil, sometimes the definition of the term judicial activism is not presented prior to write about it, what causes some difficulty to understand its effects and criteria for analyzing the legitimacy of this action. The present study is the scope to propose a concept for judicial activism in the country to do so, proposes a preliminary presentation of the conceptual differences between legalization, legalization of political and judicial activism. We used a bibliographic applied by the deductive method, which departs from the general to demonstrate a particular phenomenon observed. Without intending to discuss issues affecting the legitimacy of an active performance of the judiciary – or its absence – the present study is concluded with the proposition of a theoretical concept serves as the basis for initial discussions about the growing issue.

Keywords: judicial activism, social relations legalization, legalization of politics.

Sumário: Introdução; 1. Por uma delimitação conceitual; 1.1. Judicialização e judicialização da política; 1.2. Neoconstitucionalismo; 1.3. Neoconstitucionalismo e judicialização; 1.4. Ativismo judicial; 2. Considerações finais; Conclusão; Referências.

 

Introdução

Recentemente a doutrina constitucional brasileira começou a discutir mais aprofundadamente o ativismo judicial. Tema que vem sendo debatido nos Estados Unidos desde meados do século passado. Não obstante, o ativismo judicial, apesar de ser muito falado, é ainda pouco estudado no País. Isso se soma à verificação de que, algumas vezes, a conceituação do termo ativismo judicial não é apresentada antes de se escrever sobre o tema; o que gera certa dificuldade de entender seus efeitos e os critérios de análise da legitimidade dessa atuação.

A escassez de fontes científicas acerca de um conceito nacional é perceptível pela simples constatação de que, pasmem, há no Brasil somente dois livros dedicados exclusivamente ao tema2. O primeiro, Ativismo jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal, organizado por Vanice Regina Lírio do Valle, foi publicado somente em 2009. O segundo, Ativismo judicial: parâmetros dogmáticos, de autoria do professor Elival da Silva Ramos, somente em 2010.

Nos EUA, de forma oposta, a produção sobre o tema ultrapassa mais de meio século. Por esse motivo, alguns conceitos produzidos do outro lado das Américas serão referidos no presente estudo. Sempre com a preocupação de utilizar o conhecimento com o devido cuidado de não importar sem critérios conceitos alienígenas sem sua compatibilização com a realidade nacional.

Portanto, há necessidade de se buscar a conceituação do termo segundo a realidade nacional para que e pesquisa científica possa se desenvolver a partir de um mínimo de solidez conceitual sobre o tema. Assim, o presente estudo tem o escopo de identificar um conceito que possa ser utilizado na realidade nacional. Para, com isso, permitir que o debate contrário ou a favor do ativismo possa ocorrer sobre um parâmetro conceitual adequado à realidade pátria.

Para atingir esse objetivo foi utilizada a pesquisa bibliográfica, em que se buscou identificar os trabalhos científicos mais relevantes sobre o tema, com o objetivo de realizar um trabalho acadêmico com viés científico que demonstre a realidade social estudada. O método foi o dedutivo, tendo como ponto de partida o geral para se chegar ao particular.

 

1. Por uma delimitação conceitual

Na realidade contemporânea, é difícil identificar alguma questão que não resvale nos princípios ou regras da Constituição. Por isso, temas políticos, sociais, morais, religiosos, econômicos, todos são levados à apreciação das Cortes Constitucionais; o que leva à constatação de que “não há um espaço vazio de Constituição” (VIEIRA et al., 2009, p. 77). Diante desse cenário, é possível perceber que, muitas vezes, termos distintos são utilizados de forma aleatória como sinônimos, o que causa uma certa confusão teórica no estudo do tema.

Com o objetivo de delimitar o conceito dos termos que surgem no vocabulário jurídico, após a segunda metade do século passado, há necessidade de identificar e conceituar de quatro fenômenos distintos, porém conexos e interrelacionados: judicialização, judicialização da política, neoconstitucionalismo e ativismo judicial.

 

1.1. Judicialização e judicialização da política

Judicialização é o deslocamento da decisão de “questões relevantes do ponto de vista político, social ou moral”, em caráter final, para o Poder Judiciário (BARROSO, 2010, p. 6). É o desembocar no Judiciário, em maior medida do que já se havia constatado em momento anterior, de questões da vida social dos cidadãos, da vida política da nação, de relevância religiosa, científica, moral, etc.

Esse fenômeno refere-se, não a um único objeto – como a judicialização da política, por exemplo –, mas a todos os objetos que são submetidos, de uma forma mais larga, ao Judiciário. A pesquisa para sua verificação depende de dois olhares: um quantitativo e outro qualitativo. O primeiro diz respeito à quantidade de ações que são submetidas ao Judiciário; o que reflete em uma maior participação desse terceiro Poder na vida da população. No Brasil, estudo de Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho (apud VIANNA et al., 1999, p. 18) demonstra o exorbitante crescimento quantitativo de demandas judiciais ajuizadas, as quais passaram de 350 mil em 1988, para cerca de 8,5 milhões, em 1998, dez anos após a promulgação da Constituição. Com isso, é possível verificar que o fenômeno da judicialização, no aspecto quantitativo, mostra-se presente.

O aspecto qualitativo, por seu turno, refere-se à forma como o Judiciário julga as questões a ele submetidas. Diz respeito a uma dupla ampliação: a) dos temas a ele submetidos – não em relação à quantidade de ações, mas, sim, à gama de assuntos (morais, políticos, religiosos, etc.) que passam a ser conhecidos – e b) da maneira de julgamento dessas mesmas questões antes não conhecidas.

A título de exemplo do item ‘a’, é possível se lembrar que, até pouco tempo no país, o Judiciário não conhecia questões intrínseca ao mérito administrativo – afetas somente à Administração. O que foi modificado; havendo atualmente diversos julgados que adentram no mérito quando se mostra desarrazoado3. Também se verifica, relativamente ao item ‘b’, uma participação maior dos juízes na identificação da moral social4. Assim, como será demonstrado mais adiante, o surgimento de um novo constitucionalismo permite a constatação de mudanças nas diversas matrizes hermenêuticas; fato que também corrobora para a judicialização, pois aproxima o magistrado dos fenômenos sociais.

Tanto a judicialização quantitativa quanto a qualitativa demonstram aumento correlato da importância social do Judiciário em face de estar cada dia mais jungido à vida da população. É, pois, fato – observável sociologicamente. Constitui “um fato inelutável, uma circunstância decorrente do desenho institucional vigente, e não uma opção política do Judiciário” (BARROSO, 2010, p. 9). Não se trata de uma postura do órgão julgador, mas de uma realidade constatável. Esse fenômeno envolve o aumento de situações da vida nacional que o Poder Judiciário passa ter de se pronunciar. Algumas delas envolvem aspectos morais não socialmente estáveis (dissenso moral razoável), outras atravessam casos difíceis (hard cases), outras, por outro lado, são mais fáceis e, por isso, tranquilamente resolvidas.

José Ribas Vieira e outros (2009, p. 76) delimitam três dimensões da judicialização: a dimensão institucional, a sociológica e a lógico-argumentativa. A primeira, diz respeito à transferência decisória do Executivo e Legislativo para o Judiciário, o qual passa a rever, inclusive, as regras de atuação democrática. A segunda, perpassa a solução de conflitos coletivos com o escopo de agregação social e promoção da cidadania realizada pelos magistrados. A terceira, transfere a lógica da argumentação política para a lógica jurídica, no que chamaram de “domesticação da política” (Idem).

Para Luiz Werneck Vianna e outros (1999, p. 47-51 e 149-160), a judicialização ocorre nas relações privadas, nas relações públicas, como também nos reflexos das decisões com viés político. Nesse contexto, tanto as relações sociais quanto a política podem ser objeto do fenômeno ora discutido. A primeira, também nomeada como judicialização das relações sociais por se referirem à crescente invasão do direito na vida social, na investigação de Werneck e outros (Idem, p. 153-156), tem seu caminho ditado pelo movimento de autorreforma do Judiciário, em que a criação dos Juizados Especiais é um “divisor de águas”.

O segundo objeto que pode ser judicializado é a política, por isso judicialização da política. Fenômeno que tem ganhado aspectos de universalização; é corrente nos países de democracia avançada como Alemanha, Itália, Espanha, França, Inglaterra e Estados Unidos (VIANNA et al., p. 11) .

É processo mais restrito que a judicialização como um todo; abarca o aumento da importância do Judiciário no jogo político e na divisão do poder estatal. Rafael Favetti (2003, p. 34) o conceitua como “o fenômeno no qual há uma transferência do conflito político de sua arena própria (arena política) para uma arena jurídica”, o qual “é típico de Estados com separação de poderes e significa expansão do papel do Judiciário no sistema de Poder”. Ran Hirschl (apud VIEIRA et al., 2009, p. 78) o identifica como “judicialização da megapolítica”, segundo o qual “é possível verificar a transformação das Cortes Constitucionais em uma parte crucial do aparato nacional de tomada de decisões políticas em seus respectivos países”.

A judicialização da política ocorrerá quando forem verificados uma ou ambas as hipóteses identificadas por Ariosto Teixeira (2001, p. 43): a) “Tribunais ou juízes fazem ou ampliam sua participação no processo de decisório referente à formulação e/ou implementação de políticas públicas” ou b) “negociações não-judiciais e fóruns de tomada de decisões tipicamente políticos são afetados ou passam a adotar em seu funcionamento e no comportamento dos seus operadores regras e procedimentos judiciais”.

Para Neal Tate (1995, p. 30), o Judiciário, no fenômeno ora estudado, passa a ser utilizado como um recurso das minorias parlamentares contra as maiorias, como armas da oposição no jogo político. Da mesma forma, os sindicatos (confederações de classe), utilizam-se da justiça para buscar seus interesses corporativos (VIANNA et al., 1999, p. 57-58). Também os partidos políticos, por seu turno, procuram “instituir no Judiciário uma arena alternativa à democracia representativa” (Idem, p. 57-59).

Fenômeno que não se restringe ao país; é universal. Mas quais são suas causas? Marcus Faro de Castro (1997, p. 147-151) aduz algumas situações que são propulsionadoras do fenômeno, entre os quais: constitucionalização do direito após a Segunda Guerra Mundial; o resgate da proteção dos direitos humanos; o exemplo dado pelos EUA, impulsionado pela Corte Warren; a tradição européia de controle concentrado de constitucionalidade.

Nessa senda, a judicialização da política é provocada por causas políticas e jurídicas. Entre as causas políticas, além das já citadas, estão: a) o descrédito nas instâncias políticas tradicionais (BARROSO, 2008, p. 103), b) “a crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade do Poder Legislativo” (BARROSO, 2009, p. 19) e c) a morosidade das instâncias políticas tradicionais e “sua incapacidade de realizar propósitos tão audaciosos de uma Constituição”, fazendo com que o judiciário passe “a ocupar espaços vazios” (RAMOS NETO, 2009/2010, p. 7). As causas jurídicas serão expostas no decorrer do capítulo, especificamente na investigação de como o neoconstitucionalismo cria um novo cenário na relação dos Poderes, item 2.3.

Ernani Rodrigues de Carvalho (2004) identifica, por sua vez, seis condições para o surgimento e a consolidação desse fenômeno: um sistema político democrático; o princípio da separação de poderes; o exercício de direitos políticos; o uso dos tribunais, em alguma medida, pelos grupos de interesse; o uso dos tribunais pela oposição e a inefetividade das instituições majoritárias.

É de se evidenciar que, uma vez estando mais inserido nas discussões políticas, sociais e morais, o Judiciário ganhe espaço na formulação da democracia brasileira. Portanto, a judicialização (de qualquer objeto social) é um fato e, por isso, não se confunde com o ativismo judicial, que é uma postura, uma forma de agir dos magistrados. Neal Tate (1995, p. 27 e ss) demonstra que são fenômenos distintos. O ativismo judicial “é possível em um cenário ausente de judicialização da política e vice-versa” (POGREBINSCHI, 2000, p. 123).

 

1.2. Neoconstitucionalismo

O segundo fenômeno apresentado para a análise refere-se ao neoconstitucionalismo5. O início do que atualmente se convencionou a chamar de novo constitucionalismo remonta a três marcos históricos. Para Barroso (2007, p. 21), o marco histórico, na Europa continental, é o constitucionalismo do pós-guerra, sobretudo na Alemanha e Itália; no Brasil, é a Constituição de 1988. Não obstante, preferimos separar os antecedentes históricos mundiais em três. A eles.

O primeiro diz respeito ao massacre de seres humanos promovido pelos nazistas na segunda guerra mundial, ocorrido com base no sistema legal alemão. As leis de Nuremberg foram exemplo desse sistema; entre as quais existiam leis discriminatórias de judeus, leis de proibição de casamento de arianos com judeus, entre outras. Sua aplicação não poderia ser afastada pelo juiz que era somente a boca da lei. Na época, o pensamento dominante era de que os juízes somente pronunciavam as palavras da lei, eram a “boca da lei”, atuavam como “seres inanimados que lhe não podem moderar nem a forca nem o rigor” (PIÇARRA, 1989, p. 89).

O segundo marco, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 1948, que simbolizou o nascimento de uma nova ordem mundial muito mais comprometida com os direitos fundamentais. Declaração que inspirou a aprovação de diversos outros tratados, como o Pacto de San Jose da Costa Rica e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966, bem como de Tribunais Internacionais de Direitos Humanos que se propõem a punir as graves violações a direitos humanos.

O terceiro foi o Julgamento de Nuremberg, no qual ocorreu a condenação de membros do alto escalão de Hitler ante a acusação de crimes contra a humanidade. George Marmelstein (2008, p. 9) lembra que esse julgamento simbolizou “o surgimento de uma nova ordem mundial, onde a dignidade da pessoa humana foi reconhecida como um valor suprapositivo, que está, portanto, acima da própria lei e do próprio Estado”. Julgamento que significou a condenação não só dos colaboradores do Reich, mas do regime nazista e, sobretudo, de um pensamento jurídico afastado dos valores socialmente relevantes – o positivismo.

O positivismo jurídico, cujos defensores de destaque foram Hans Kelsen, Augusto Comte e Hebert Hart, informa que o Direito é produção da vontade humana a partir da criação pelo Estado, sobretudo por meio da lei. Conforme Gustavo Lacerda (2009), esse pensamento teve o condão de embasar a superação do jusnaturalismo, a separação do Direito do divino e a limitação do poder soberano pela lei, bem como afastar a abertura do sistema jurídico aos valores jusnaturais, uma vez que muitas atrocidades eram realizadas em nome do Direito e de seus princípios naturais (religiosos ou não).

O positivismo frisava que as normas de conduta eram restritas à lei. Todavia, conforme delineado acima, até mesmo a lei pode ser utilizada para fins ditatoriais e desumanos, como ocorreu nos regimes totalitários de Hitler, Stalin, Mussolini, entre outros.

Todos esses marcos históricos embasaram discussões doutrinárias e jurisprudenciais ao longo de mais de meio século – desde 1948 até os dias atuais (CARBONELL, 2009, p. 9) – que refletiram em um novo Direito Constitucional, em um novo constitucionalismo, o que se costumou chamar, sobretudo na Espanha6, Itália7, México8 e Brasil de neoconstitucionalismo, cuja primeira e principal característica é se instalar sobre as bases jusfilosóficas do pós-positivismo9. Impende frisar que o termo não é utilizado nem nos Estados Unidos nem na Alemanha (SARMENTO, 2009).

É tempo de diferenciar os conceitos de neoconstitucionalismo e de pós-positivismo10. O primeiro é uma característica comum do constitucionalismo ocidental que tem início no pós-guerra e apogeu na contemporaneidade, enquanto o pós-positivismo é estritamente o pensamento jusfilosófico que tem início na mesma época e apogeu no fim do século XX. O primeiro traduz uma teoria constitucional que abrange o segundo como pilar de sustentação de algumas de suas posições, mas com ele não se confunde; o pós-positivismo é a matriz jusfilosófica que embasa as idéias neoconstitucionais. Para Barroso (2007, p. 22), “o marco filosófico do novo direito constitucional é o pós-positivismo”.

As principais particularidades do pós-positivismo11 podem ser identificadas, em suma, como a) abertura valorativa do sistema jurídico; b) princípios como categorias de normas jurídicas; c) princípios e regras considerados como espécies do gênero norma; d) Constituições como sede de princípios e centro dos sistemas jurídicos e e) mudança de foco do Legislativo para o Judiciário, com a fixação do conteúdo da norma pelo intérprete.

O neoconstitucionalismo, além de apresentar como fundamento jusfilosófico o pós-positivismo e, por isso, de deter todas as suas particularidades, ainda apresenta as seguintes características: a) estruturação sobre o valor político-jurídico de um Estado Democrático de Direito; b) concretização dos valores constitucionais, negando-se a existência de normas puramente programáticas em face de princípios como os da máxima efetividade da Constituição e c) dignidade da pessoa humana como valor central do ordenamento. A elas somam-se, por óbvio, as delineações do pós-positivismo – seu pilar filosófico estrutural.

Luís Roberto Barroso (2007, p. 23) apresenta, por sua vez, as seguintes características como marcos teóricos do neoconstitucionalismo: a) o reconhecimento de força normativa à Constituição; b) a expansão da jurisdição constitucional; c) o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional.

 

1.3. Neoconstitucionalismo e judicialização

Esse novo modelo constitucional tem como um dos reflexos a judicialização das mais diversas relações sociais, não só no Brasil12. Entre os temas que passam a ser judicializados estão questões sociais, políticas, morais, religiosas, econômicas, entre outras. Isso se deve a alguns fatores.

O primeiro fator é o aumento da quantidade de temas tratados pelas Constituições contemporâneas, bem como a profundidade com que são dispostos, como, por exemplo, nas Constituições da Itália de 1947, da Alemanha de 1949, da Índia de 1949, de Portugal de 1976, da Espanha de 1978, do Brasil de 1988, entre outras. Esse incremento temático quantitativo e qualitativo leva, ipso iuris, ao crescimento da importância da interpretação constitucional, vez que quase todas as relações sociais estão contidas nas constituições. Luís Roberto Barroso (2007, p. 28) nomeou esse fenômeno de constitucionalização do Direito.

O segundo é a criação das Cortes Constitucionais. Javier Pérez Royo (2007, p. 796) afirma que os Tribunais Constitucionais não existem em todos os países europeus, mas unicamente nos que tiveram excepcionais dificuldades para transitar do Estado Liberal do século XIX para o Estado Democrático do século XX, como a Áustria, Alemanha, Itália, Portugal e Espanha. No primeiro pós-guerra, é bom lembrar, a Áustria saiu vencida e o Tribunal Constitucional idealizado por Kelsen foi instituído como limitador ao Poder estatal. Não é por outra razão que Javier Royo (2007, p. 797) conclui que a função da Corte Constitucional “no es hacer o bien, sino evitar que se haga el mal, entendiendo por la actuación de los demás poderes del Estado al margen de lo previsto em la Constituición”.

No segundo pós-guerra, conforme ressaltou Barroso (2007, p. 24), há a consolidação das Cortes Constitucionais pelo mundo, Alemanha (1951) e Itália (1956) foram as primeiras; após, sua irradiação para a Europa continental; prosseguindo pelo Chipre (1960) e Turquia (1961); seguida pelo fluxo de democratização, com as Cortes da Grécia (1975), Espanha (1978), Portugal (1982) e Bélgica (1984); o leste europeu também aderiu a moda no fim do século XX, com as Cortes da Polônia (1986), Hungria (1990), República Tcheca (1992), Romênia (1992), República Eslovaca (1992) e Eslovênia (1993); por último os países africanos como a Argélia (1989), África do Sul (1996) e Moçambique (2003).

Esse fenômeno foi seguido da sedimentação da legitimidade do controle de constitucionalidade por elas exercido. Desde o caso Madison v. Marbury (1803), que consagrou o controle difuso, e a criação do modelo austríaco (1920), originário no controle concentrado, a legitimidade do controle dos atos legislativos (judicial review) exercido pelas Cortes Constitucionais a cada dia vem ganhando mais aceitação.

Essa proliferação e consolidação das Cortes Constitucionais foi acompanhada de um outro processo, o aumento da importância política desses Tribunais. São os mesmos fundamentos que respaldam o controle negativo de constitucionalidade, sobretudo a primazia da Constituição, que também respaldam o aumento da gama de matérias levada à interpretação das Cortes Constitucionais13.

O terceiro fator que explica a judicialização a partir da análise do neoconstitucionalismo, consectário do anterior, é o próprio método de jurisdição constitucional, o qual, no Brasil, é realizado não só pelas Cortes Constitucionais, mas, sobretudo, por elas. Essa interpretação constitucional realizada pelos órgãos jurisdicionais é revelada de duas maneiras: 1) a “aplicação direta da Constituição às situações nela contempladas” e 2) sua aplicação indireta consagrada pela “interpretação do ordenamento infraconstitucional à luz da Constituição (BARROSO, 2010, p. 5).

A jurisdição constitucional tem um método diferenciado de interpretação em relação à jurisdição ordinária14. Nesta, via de regra, a legislação apresenta a solução abstrata para problemas jurídicos; enquanto o juiz tem o papel de “identificar a norma aplicável ao problema a ser resolvido, revelando a solução nela contida” (BARROSO, 2007, p. 25). Na jurisdição constitucional os métodos de interpretação são mais abrangentes e permitem uma solução mais elástica a partir da interpretação, sobretudo, dos princípios constitucionais identificados pela Corte. Essa forma diferenciada de interpretar o Direito permite o crescimento da importância do Poder Judiciário, mais especificamente das Cortes Constitucionais.

O quarto decorre do próprio desenvolvimento plural e da complexidade relacional das sociedades pós-modernas. Fato que favorece o questionamento acerca da tomada de decisões políticas por maiorias que possam eventualmente não respeitar as diversas minorias existentes em uma sociedade a cada dia mais plural, ou mesmo não promover os direitos das minorias compativelmente com os ditames da Carta.

 

1.4. Ativismo judicial

Dessa forma, ativismo judicial se mostra como um fenômeno bem distinto da judicialização. Ele nasce no fim do constitucionalismo liberal e início do constitucionalismo social, cujo marco temporal foram as Constituições do México de 1917 e de Weimar de 1919. Mas ganha espaço após a Segunda Grande Guerra, sobretudo nos EUA, com o advento da Corte Warren15, mas, aos poucos, a discussão acerca da legitimidade dessa forma de atuação avançou pelo mundo.

Essa expressão é comumente utilizada de maneira ambígua ou, no mínimo, dispersa e desencontrada; às vezes, com destaque para um perfil aditivo inesperado; em outras, com o ênfase na ausência de lei embasadora da decisão; ou também revelando um perfil negativo em relação à declaração de inconstitucionalidade de normas (atuação contramajoritária16); ou ainda mostrando estreita relação com a participação ativa do Judiciário na proteção dos princípios constitucionais, através do controle da atividade dos demais poderes (notadamente sobre suas omissões). Por isso, os que se propõem a estudá-lo frequentemente apontam uma dificuldade: “a ausência de uma clara delimitação conceitual da matéria no plano da Dogmática e da Teoria do Direito” (RAMOS, p. 30). Para Vanice Regina do Valle (2009, p. 19), o termo ativismo não encontra consenso17.

A origem da expressão remonta a 1947, quando Arthur M. Schlesinger Júnior, ao analisar a atuação da Suprema Corte americana no período do New Deal, publicou o artigo intitulado The Supreme Court: 1947 na revista Fortune (KMIEC, 2004, p. 1445). O autor, ganhador do Prêmio Pulitzer, encontrou como linha divisória entre o ativismo e a autolimitação a tendência liberal ou conservadora dos magistrados da Suprema Corte dos EUA. Logo, a própria origem do termo, imbricada com conceitos com nítida distinção naquele país, já demonstra uma das explicações para a dificuldade de sua definição.

No país originário do termo, conforme lembra Keenan Kmiec (2004, p. 1455-1456), Judge Joseph C. Hutcheson Jr. foi o primeiro a utilizá-lo em uma decisão judicial, a quem as referências acadêmicas se referem. Após, o termo ganhou repercussão a ponto de haver 227 casos naquele país em que há menção à expressão (Idem, p. 1459). No fim de seu estudo sobre a origem e a conceituação do termo, conclui que o termo não encontra uma unanimidade, mas acompanha um número distinto de ideias jurisprudenciais e conceitos acadêmicos (Idem, p. 1476-1477).

Da mesma forma, Mark Tushnet (2007, p. 415) ressalta que muitos critérios para conceituar o ativismo têm sido sugeridos ao longo dos anos. Nesse contexto conceitual, William P. Marshall (2002) chega a identificar sete espécies de ativismo judicial: contramajoritário, não-originalista, jurisdicional ou formal, de precedentes, material ou criativo, remediador e partisan. O motivo de Marshall identificar tantos conceitos é que, no common law, “se adota uma conceituação mais ampla de ativismo judicial” (RAMOS, 2010, p. 110).

Keenan D. Kmiec (2004, p. 1463-1476), apoiado em um viés doutrinário, reconhece cinco principais conceitos: a) prática utilizada para atacar (strike) atos emanados de outros Poderes, com constitucionalidade defensável – o que demonstra pouca deferência aos outros Poderes e lesão potencial à separação de poderes; b) estratégia de não aplicação de precedentes – sem muita aplicação no sistema romano-germânico, sobretudo do Brasil; c) conduta de legislar a partir do Tribunal – decisões com perfil aditivo; juízes legisladores; d) afastamento dos cânones interpretativos – encontra dificuldades práticas para sua identificação em face da quantidade de métodos existentes; e) julgamento predeterminado a um fim – idem ao anterior.

Não obstante, para o prosseguimento da investigação faz-se mister adotar um conceito para a delimitação do objeto de pesquisa. Antes de conceituar o ativismo, porém, é preciso distingui-lo da judicialização, pois, em que pese serem conceitos próximos, eles não se confundem.

Luis Roberto Barroso (2010, p. 9), em estudo realizado no início de 2010 nos EUA, destacou que a judicialização é fato inelutável, enquanto o ativismo é modo de exercício da competência judicial. A primeira trata de uma transferência de poder para as instâncias judiciais, em detrimento das instâncias políticas tradicionais – Legislativo e Executivo, com o aumento da quantidade de matérias sobre as quais o Judiciário passa a ter a última palavra. Não se trata, pois, de uma atuação política. O ativismo, como forma de agir judicial, por seu turno, refere-se a uma postura do Poder Judiciário, a uma forma de atuação que decorre de uma opção política. Nada mais é que um comportamento de seus representantes.

Thamy Pogrebinschi (2000, p. 122), combinando aspectos sociopolíticos e jurídicos, considera como juiz ativista aquele que “a) use seu poder de forma a rever e contestar decisões dos demais poderes do estado; b) promova, através de suas decisões, políticas públicas; c) não considere os princípios da coerência do direito e da segurança jurídica como limites a sua atividade”.

Na common law americana, observa Tushnet (2007, p. 416) alguns estudos utilizam o termo referindo-se à declaração de inconstitucionalidade; quanto maior o número de leis declaradas inconstitucionais maior será a atividade ativista da Corte Constitucional; outros, o aproximam da propensão da Corte para a desconsideração dos precedentes anteriores; para outros, o ativismo se encontra no distanciamento dos julgadores do texto (textualismo) ou mensagem original da Constituição (originalismo). Isso demonstra que o termo ativismo judicial pode ser utilizado de diversas maneiras, desde que se indique sua utilização.

O ativismo pode ocorrer tanto na interpretação legal quanto na interpretação constitucional (TUSHNET, 2007, p. 416). Ou seja, não é só a atuação da Corte Constitucional que pode exercer uma posição ativista, essa maneira de agir pode ser identificada em outros Tribunais e na primeira instância. Em que pese, não obstante, ser mais frequentemente discutido dentro da atuação das Cortes Constitucionais, devido à quantidade de sentenças com perfil aditivo por elas emitidas, extraídas do processo mais elástico de interpretação constitucional.

Pode ser dividido em duas vertentes principais: o ativismo jurisdicional e o extrajudicial18. O primeiro é realizado na prestação jurisdicional dos magistrados, sobretudo da Corte Constitucional; enquanto o segundo, refere-se à forma como os magistrados se portam perante os demais Poderes, a sociedade e a opinião pública, como, por exemplo, quando concedem entrevistas, discursos e outras formas de pronunciamento externo ao processo. É nesta última vertente que mais se explicita o fenômeno denominado politização do Judiciário (VIEIRA et al., 2009, p. 79).

As causas para o ativismo judicial são identificadas por Evandro Gueiros Leite (2008, p. 5-6) como: 1) o “incremento progressivo dos Poderes Legislativo e Executivo, justificando a necessidade de crescimento do Judiciário, para balanceamento do sistema”; 2) a insatisfação do povo em relação à conduta dos outros ramos do Poder; 3) a evolução social, política e cultural dos tempos atuais.

Neil Tate (1995, p. 27 e ss) elenca algumas condições favoráveis para a ocorrência do ativismo judicial, as quais não precisam estar todas presentes para a caracterização do fenômeno: democracia, separação de poderes, sistema de direitos, uso da Corte por grupos de interesse, uso da Corte pela oposição, inefetividade dos instrumentos majoritários, formulação de políticas públicas pelo judiciário, delegação (voluntária) pelas instituições majoritárias.

Então, para o presente estudo, ativismo judicial é gênero, do qual são espécies o ativismo jurisdicional (restrito a esta atividade típica) e o ativismo extrajurisdicional (manifestado fora dos autos judiciais)19. Contudo, no presente estudo o termo ativismo judicial será utilizado normalmente para se referir ao ativismo jurisdicional. Quando se quiser fazer referência somente ou também ao ativismo extrajurisdicional a referência expressa será feita. Ao conceito.

Ativismo judicial é uma atitude ou comportamento dos magistrados em realizar a prestação jurisdicional com perfil aditivo ao ordenamento jurídico – ou seja, com regulação de condutas sociais ou estatais, anteriormente não reguladas, independente de intervenção legislativa – ou com a imposição ao Estado de efetivar políticas públicas determinadas (ativismo jurisdicional); ou ainda como um comportamento expansivo fora de sua função típica, mas em razão dela (ativismo extrajurisdicional).

O aspecto jurisdicional refere-se à inovação no sistema jurídico por meio da interpretação de normas jurídicas extraída diretamente da Constituição – dos seus princípios ou regras – sem a existência de alguma intermediação legislativa. Ou seja, é criação de direito pelo Poder Judiciário em sua atividade típica, que não se limite à produção da norma jurídica individual e concreta (sentença, acórdão ou decisão). Dessa forma, a presente investigação utiliza uma concepção restrita, semelhante ao terceiro conceito de Kmiec (2004, p. 1471-1473) referente à legislação judiciária, isto é, à conduta do Judiciário de legislar; acrescido da referência às políticas públicas. Os demais conceitos ou não se aplicam de forma relevante ao civil law ou são de difícil constatação empírica; por isso, a opção por um conceito restrito. O ativismo judicial que será pesquisado no presente trabalho restringe-se a este aspecto.

O aspecto extrajurisdicional é demonstrado pelas manifestações públicas dos magistrados, fora de sua atividade típica, incentivando ou desincentivando determinada conduta praticada por membros dos demais Poderes ou por cidadãos; ou pelo trabalho político realizado junto aos membros do Legislativo ou do Executivo com o objetivo de influir politicamente na aprovação de leis/emendas de seu interesse ou de aumento da verba direcionada para si, por exemplo, a aprovação de lei que crie de novos órgãos, ou a aprovação de reformas processuais, ou o aumento do percentual do orçamento que lhe cabe, etc. Concepção que não será estudada no presente estudo.

Importante frisar que o conceito de ativismo judicial não se confunde com o conceito de revisão constitucional (judicial review). Em que pese nos EUA haja quem defenda que este é espécie daquele, como William P. Marshall (2002), no presente trabalho a atuação negativa, contramajoritária da Corte Constitucional não será considerada espécie de ativismo. Thamy Pogrebinschi (2000, p. 123), também considera ambos conceitos distintos.

 

2. Considerações finais

No presente artigo, não se pretende um posicionamento favorável ou contrário ao ativismo judicial. Não obstante, mesmo que não se pretenda observar o aspecto da legitimidade dessa forma de, é necessário um olhar para o lado oposto a essa forma de agir, onde se encontram o textualismo ou originalismo20. Um dos defensores vorazes dessa postura é Antonin Scalia (1998, p. 23-25), o qual afirma que a interpretação constitucional deve buscar a compatibilização com o próprio texto da Constituição; um texto não pode ser interpretado nem restritiva, nem extensivamente, mas sim razoavelmente para conter todo do seu significado. No Brasil, um dos grandes defensores de uma postura restritiva do órgão julgador, Elival da Silva Ramos (2010, p. 129), destaca que há “uma sinalização claramente negativa no tocante às práticas ativistas, por importarem na desnaturação da atividade típica do Poder Judiciário, em detrimento dos demais Poderes”.

A discussão sobre a legitimidade dessa forma de agir judicial, bem como sobre eventual afronta à separação de poderes (art. 2º da CF21) e à legalidade (art. 5º, II da CF22) é um dos pontos que encontra atualmente um rico campo de discussão e divergência teórica.

Há quem defenda que o ativismo judicial é uma invasão do Judiciário na esfera restrita dos demais Poderes, sobretudo do Legislativo, com afronta à separação de poderes, por isso ilegítimo. No Brasil, Elival da Silva Ramos (2010, passim) e Denis de Castro Halis (2004, passim) têm se destacado nessa defesa. Nos Estados Unidos, um grande defensor de uma postura não-ativista ou textualista é Justice Antonin Scalia (1998, passim).

Lado outro, há quem advogue o contrário, defendendo que o ativismo é necessário, sobretudo diante da omissão dos demais Poderes em sua obrigação de realização dos direitos constitucionalmente atribuídos. Desse lado, encontram-se Luís Roberto Barroso (2007, 2009 e 2010) e Evandro Gueiros Leite (2008, passim). Evandro Leite (2008, p. 2) chega a ressaltar a existência de “um novo princípio de legitimidade ou uma nova idéia de direito, com o juiz como a figura principal, segundo a lição de Peyrefitte. Também Antônio Escostegury Castro”. Destaca ainda que “em muitos países o ativismo já é realidade” (Idem, p. 6).

Todavia, há um ponto que preocupa, a princípio, a todos: existem limites para o Poder Judiciário? Se existem, quais são eles? Essa é uma preocupação comum a ambas as correntes. Os não-ativistas buscam a atuação mais próxima do que seria o texto legal, ou seja, para eles a limitação ao ativismo é total, enquanto muitos ativistas ressaltam a necessidade de alguma forma de limitação ao ativismo (limitação parcial) sob pena de se chegar a uma ditadura do Judiciário. A resposta a essas perguntas encontra-se em ampla discussão não só no Brasil, mas em todas as partes do globo23.

Daniel Sarmento (2009, p. 288-300) é um dos doutrinadores de destaque na tentativa de identificar limites ao ativismo judicial24; alerta para possíveis riscos da adoção acrítica do modelo neoconstitucionalista, entre os quais destaca: os riscos para a democracia em face da judicialização excessiva da vida social, o perigo da jurisprudência calcada em metodologia muito aberta, problemas que podem advir do excesso na constitucionalização do Direito para a autonomia privada, entre outros. Considerações como estas precisam ser lembradas por serem um contraponto necessário à euforia constitucional dos últimos anos.

Sem que haja posicionamento previamente contrário ou favorável a uma postura ativista, encontrar limites de atuação ao Judiciário é um dos grandes desafios para a ciência jurídica contemporânea.

Por fim, duas considerações: primeiro, a judicialização, ipso facto, não gera o ativismo judicial. Aquela se mostra como um fato inevitável na atual conjuntura constitucional, que pode ser acompanhada de duas posturas opostas dos magistrados: uma ativista e outra, contrária, de autocontensão (não-ativista); segundo, no presente trabalho a expressão ativismo judicial não tem uma conotação negativa ou pejorativa, nem tampouco positiva ou majorativa. O conceito demonstra somente como um comportamento jurisdicional ou extrajurisdicional dos membros da magistratura, nos termos expostos.

 

Conclusão

O presente estudo se propôs a apresentar uma conceituação de ativismo judicial segundo os parâmetros de atuação judicial brasileiros. A dificuldade de encontrar um conceito de ativismo judicial que não se misture com os conceitos de judicialização ou de judicialização da política é o viés que se buscou. Além disso, a simples importação de conceitos americanos – como os sete conceitos de Marshall – não colaboram para o enriquecimento da discussão nacional.

A delimitação dos conceitos ora tratados tem o escopo de demonstrar 1) que o fenômeno da judicialização é um fato observável em diversos pontos do globo; 2) que esse fato é decorrente a) do incremento temático quantitativo e qualitativo da Constituição, b) da criação das Cortes Constitucionais a partir do primeiro pós-guerra e sua sedimentação por toda a Europa no segundo pós-guerra, c) do método de jurisdição constitucional e d) da pluralidade e complexidade da sociedade contemporânea; 3) que as teorias neoconstitucionais embasam filosoficamente esse fenômeno; 4) que a judicialização não induz necessariamente ao ativismo judicial, ou seja, mesmo que questões políticas, sociais, econômicas, etc. estejam sendo discutidas judicialmente (sobretudo pela Cortes Constitucionais), o Judiciário tem a opção de resolver esses problemas sem lançar mão em uma postura ativista.

Como o escopo de auxiliar a delimitação das discussões tanto contrárias quanto favoráveis à atuação ativista do Judiciário, formulou-se seu conceito como uma atitude ou comportamento dos magistrados em realizar a prestação jurisdicional com perfil aditivo ao ordenamento jurídico – ou seja, com regulação de condutas sociais ou estatais, anteriormente não reguladas, independente de intervenção legislativa – ou com a imposição ao Estado de efetivar políticas públicas determinadas (ativismo jurisdicional); ou ainda como um comportamento expansivo fora de sua função típica, mas em razão dela (ativismo extrajurisdicional).

Assim, sem se pretender discutir questões afetas à legitimidade de uma atuação ativa do Judiciário – ou sua ausência –, a proposição de um conceito serve como base teórica inicial para os debates crescentes sobre a temática.

 

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1 Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); pós-graduado em Direito Público; professor de Direito Constitucional do UniCEUB/DF; autor do livro Jurisprudência do STF: anotada e comentada, Ed. Método, 2009; Procurador do Distrito Federal; advogado e consultor em Brasília. E-mail: profricardofernandes@gmail.com.

2 Além de centenas fecundos artigos científicos. Obras completas, porém, só foram encontradas as duas.

3 Por todos, os dois precedentes seguintes: EMENTA: (…) PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. (…) POSSIBILIDADE DE CONTROLE PELO JUDICIÁRIO. (…) 2. Hoje em dia, parte da doutrina e da jurisprudência já admite que o Poder Judiciário possa controlar o mérito do ato administrativo (conveniência e oportunidade) sempre que, no uso da discricionariedade admitida legalmente, a Administração Pública agir contrariamente ao princípio da razoabilidade. Lições doutrinárias. 3. Isso se dá porque, ao extrapolar os limites da razoabilidade, a Administração acaba violando a própria legalidade, que, por sua vez, deve pautar a atuação do Poder Público, segundo ditames constitucionais (notadamente do art. 37, caput). (…) (REsp 778648/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/11/2008, DJe 01/12/2008). (grifos não originais) e EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. (…) CONTROLE JUDICIAL DO ATO ADMINISTRATIVO. LIMITAÇÃO. OPORTUNIDADE E CONVENIÊNCIA. (…) AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA CONFIANÇA E DA MORALIDADE. (…) 1. É cediço que o controle judicial do ato administrativo deve se limitar ao exame de sua compatibilidade com as disposições legais e constitucionais que lhe são aplicáveis, sob pena de restar configurada invasão indevida do Poder Judiciário na Administração Pública, em flagrante ofensa ao princípio da separação dos Poderes. 2. Desborda do juízo de oportunidade e conveniência do ato administrativo, exercido privativamente pelo administrador público; a fixação de critérios de correção de prova de concurso público que se mostrem desarrazoados e desproporcionais, o que permite ao Poder Judiciário realizar o controle do ato, para adequá-lo aos princípios que norteiam a atividade administrativa, previstos no art. 37 da Carta Constitucional. (…) (RMS 27566/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Rel. p/ Acórdão Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/11/2009, DJe 22/02/2010).

4 Em uma sociedade pluralista não há uma única moral social, mas uma convivência de diversos aspectos morais admitidos. Porém, isso não leva à constatação de que inexistem consensos sociais mínimos que possam ser identificados. Por isso, utilizou-se a expressão moral social.

5 Sobre neoconstitucionalismo, vide CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo(s). 4ª ed. Madrid: Trotta, 2009; CRUZ, Luis M. Estudios sobre el neoconstitucionalismo. México: Porrúa, 2006; FIGUEROA, Alfonso García. Criaturas de la moralidad: una aproximación neoconstitucionalista al Derecho a través de los derechos. Madrid: Trotta, 2009; BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. In: Boletim de Direito Administrativo. Ano XXIII, nº 1. São Paulo: Editora NDJ, p. 20-49, jan-2007; VALE, André Rufino do. Estrutura das normas de direitos fundamentais: repensando a distinção entre regras, princípios e valores. São Paulo: Saraiva (Série IDP), 2009, p. 42; SILVA, Alexandro Garrido. Neoconstitucionalismo, pós-positivismo e democracia: aproximações e tensões conceituais. In: QUARESMA, Regina; OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula; OLIVEIRA, Farlei Martins Riccio de. (Org.). Neoconstitucionalismo. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 93-128; MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo e teoria da interpretação. In: MOREIRA, Eduardo Ribeiro et. al (orgs.) Hermenêutica constitucional: homenagem aos 22 anos do grupo de estudos Maria Garcia. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 215-232.

6 Na Espanha, diversos autores utilizam este termo para conceituar o constitucionalismo contemporâneo; entre os quais: CRUZ, Luis M. Estudios sobre el neoconstitucionalismo. México: Porrúa, 2006; FIGUEROA, Alfonso García. Criaturas de la moralidad: una aproximación neoconstitucionalista al Derecho a través de los derechos. Madrid: Trotta, 2009; FIGUEROA, Alfonso García. La teoría del Derecho em tiempos del constitucionalismo. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2009, p. 159-186.

7 Na Itália, FERRAJOLI, Luigi. Pasado y futuro del Estado de derecho. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2009, p. 13-30; GUASTINI, Riccardo. La constitucionalización del ordenamiento jurídico: el caso italiano. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2009, p. 49-74; COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: un análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2009, p. 75-98. Gustavo Zagrebelsky (2007, p. 65), em que pese não utilizar o termo neoconstitucionalismo, refere-se a um novo modelo constitucional na Europa no segundo pós-guerra; para “dar a los derechos um fundamento más sólido que el proporcionado pela ley estatal surgió com la reacción que se produjo, al término de la segunda guerra mundial”. Adiante destaca “la reacción contra el positivismo jurídico” (ZAGREBELSKY, 2007, p. 67).

8 O maior expoente no assunto no México é Miguel Carbonell. Entre seus escritos sobre o assunto destaca-se Nuevos tiempos para el constitucionalismo. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2009, p. 9-12; além de toda a obra organizada por ele, em que pese não contemplar somente artigos mexicanos.

9 Nesse sentido, ver Luis Roberto Barroso. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. In: Boletim de Direito Administrativo, São Paulo: Editora NDJ, a. XXIII, n. 1, p. 20-49. jan 2007. p. 22 e MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2009, p. 10-15. Este último, em que pese não utilizar o termo neoconstitucionalismo, baseia sua teoria dos direitos fundamentais na perspectiva do pós-positivismo.

10 Entre os autores que trabalham o pós-positivismo encontram-se: BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 264; MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2008, p. 11; VALE, André Rufino do. Estrutura das normas de direitos fundamentais: repensando a distinção entre regras, princípios e valores. São Paulo: Saraiva (Série IDP), 2009, p. 42; MAMARI FILHO, Luís Sérgio Soares. A Comunidade Aberta de Intérpretes da Constituição: o amicus curiae como estratégia de democratização da busca do significado das normas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 18; AGUIAR, Roger Silva. O Positivismo e o Pós-positivismo na Criação e Aplicação do Direito Civil Brasileiro. In: MELLO, Cleyson M. Novos Direitos: os paradigmas da pós-modernidade. Niterói: Impetus, 2004, p. 152, entre diversos outros.

11 Para aprofundamento acerca das características do pós-positivismo vide artigo de nossa autoria: Do positivismo ao pós-positivismo jurídico: paradigma jusfilosófico constitucional (no prelo). Também: SILVA, Alexandro Garrido. Neoconstitucionalismo, pós-positivismo e democracia: aproximações e tensões conceituais. In: QUARESMA, Regina; OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula; OLIVEIRA, Farlei Martins Riccio de. (Org.). Neoconstitucionalismo. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 93-128. As características são retiradas da análise dos pontos de convergência entre os pensamentos de Robert Alexy (2008), Ronald Dworkin (2002); entre os nacionais: Humberto Ávila (2009), Luís Roberto Barroso (2007), Paulo Bonavides (2008), André Rufino do Vale (2006), entre outros.

12 Sobre a judicialização no direito comparado, vide artigo de nossa autoria intitulado Realização de direitos pelas Cortes Constitucionais no common law (no prelo).

13 Não se está aqui discutindo a legitimidade ou não do ativismo judicial, a qual não é objeto do presente estudo, mas tão somente informar o fato e o fundamento para a judicialização de temas diversos pelas Cortes Constitucionais.

14 Cumpre frisar que em Portugal, Espanha, Itália, França e, recentemente, Inglaterra as Cortes Constitucionais não são necessariamente órgãos do Poder Judiciário, são sim Cortes Constitucionais alheias à estrutura deste Poder. Enquanto na Alemanha e no Brasil essas Cortes pertencem à estrutura do Poder Judiciário. Lembrança feita pelo professor da UnB Jorge Amaury e conferida por nós.

15 A era Lochner já se mostrava bastante interventiva no campo econômico, mas é na presidência do Justice Earl Warren, iniciada em 1954, que o ativismo se mostra mais evidente. A análise desses aspectos históricos do direito comparado, além das vicissitudes do conceito de ativismo judical nos EUA serão investigadas no item 2.4 desse capítulo.

16 Expressão “que designa a circunstância de os órgãos do Judiciário, cujos agentes não são eleitos, poderem invalidar atos do Legislativo, cujos agentes são eleitos pelo povo e representam a vontade majoritária” (BARROSO, 2006, p. 120). Ele atribui a expressão contra-majoritário a Alexandre Bickel (The least dangerous branch, 1986, p. 16).

17 No mesmo sentido, Thamy Pogrebinschi (2000, p. 122) e Kmiec (2004, p. 1442-1462).

18 Como dito, há quem classifique o ativismo em sete dimensões distintas, como William Marshall (2002) ou de cinco formas distintas como Kmiec (2004, p. 1463-1476). Contudo, para o presente estudo a classificação nessas duas vertentes, que não necessariamente ocorrem juntas, basta ao estudo do objeto delimitado.

19 A diferenciação em espécies tem razão de ser em face de análise da postura dos magistrados do Supremo Tribunal Federal realizada no capítulo 3. Nos demais casos, o termo ativismo judicial referir-se-á à atividade jurisdicional. Ou seja, salvo quando houver referência à comparação entre às atividades intra-autos ou extra-autos judiciais, em que os termos específicos serão utilizados, a expressão ativismo judicial será utilizada como sinônima de ativismo jurisdicional.

20 A principal diferença entre os dois conceitos é que o primeiro busca se ater ao texto da norma interpretada, enquanto o segundo busca a mensagem original, a ideia matriz daquele texto quando de sua promulgação. Para o campo de estudo ora proposto, o tema não precisa ser aprofundado sob pena de ampliar em demasia seu objeto. Por isso, foram identificados como similares. Nos EUA, a postura não ativista é defendida por Antonin Scalia, Clarence Thomas, Robert Bork, entre outros. Scalia se mostra um defensor do textualismo.

21 Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

22 Art. 5º (…) II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

23 Nesse sentido, já constataram Evandro Gueiros Leite (2008) e Mark Tushnet (2007, p. 415-420).

24 O autor propõe limites ao neoconstitucionalismo sobretudo no que se refere à atuação judicial como ‘judiciocracia’, como ‘oba-oba constitucional’ e como ‘panconstitucionalização’. A crítica à atuação ativista do Judiciário, notadamente do Supremo Tribunal Federal se situa no primeiro aspecto.

Ricardo Vieira de Carvalho Fernandes

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