A penhora online na execução fiscal e a aplicação da teoria do diálogo das fontes

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RESUMO: O presente trabalho discute o conflito entre o disposto no art.185-A do Código Tributário Nacional e o aduzido no art.655-A do Código de Processo Civil. A primeira disposição afirma que a penhora online somente deve ser realizada quando não houver a indicação de bens pelo devedor e não tenha sido encontrados outros  para garantir a execução. Por antemão, o disposto na lei processual civil brasileira indica que a penhora online é preferencial. Assim, tendo em vista o  fato de que a Lei de Execução Fiscal (Lei nº 6.830/89) afirma que as disposições do CPC serão aplicadas subsidiariamente à cobrança da dívida ativa da União, Estados, Distrito Federal, Municípios e autarquias, com o advento do art.655-A dO CPC surge a dúvida sobre sua aplicação ou não à execução fiscal. Verifica-se divergência tanto doutrinária quanto jurisprudencial. Portanto, diante de tais pontos,  pretende-se abordar os aspectos a serem levantados para a solução da questão. Um deles é a aplicação da Teoria do Diálogo das Fontes.
Palavras-chave: Penhora online. Execução fiscal. Teoria do diálogo das fontes.

Introdução
Muito vêm se falando da questão do tempo do processo. É notória a dificuldade que se tem de adequar o proceder de acordo com as regras legais e proporcionar a satisfação do tutelado da maneira mais rápida possível. Assim, diversas foram as modificações que o Código de Processo Civil sofreu ao longo dos anos para que os anseios por celeridade fossem atendidos.
O processo de execução, diante de seu escopo de satisfação final do direito,  sofreu, então, algumas alterações com o fito de ser mais efetivo e célere. Dentre elas está a preferencialidade da penhora online. Assim, tenta-se adequar o procedimento legal aos avanços da sociedade.
Tendo em conta o desenvolvimento da tecnologia, alguns procedimentos que antes levariam anos para que pudessem ser realizados, em questão de dias têm a solução. Dessa maneira, a introdução da ciência moderna no processo é uma boa alternativa frente a necessidade de celeridade e efetividade.
Mas, surgiu um obstáculo que não consegue ser solucionado pela tecnologia, mas apenas pelas decisões dos tribunais e legisladores. É a questão da formalidade e da obediência à lei. O conflito de normas a serem aplicadas gerou a dúvida de qual dispositivo legal deve ser levado em consideração. Alguns afirmam que deve ser levado em conta o critério da especialidade, já outros dizem ser coerente a aplicação da lei geral posterior mais benéfica, em vista de se preservar a coerência do sistema normativo.
Em vista disso, apesar de ter proporcionado benefícios para a execução civil, a preferencialidade da penhora online ainda não conseguiu seu espaço no âmbito da execução fiscal. É um dilema, uma vez que para o Estado cobrar seu crédito ele terá meios mais tortuosos que os do exequente civil.
A alteração do Código de Processo Civil: o surgimento do conflito    
O art.185-A do Código Tributário Nacional foi introduzido no ordenamento pátrio com a Lei Complementar nº 118 de 9 de Fevereiro de 2005. Tem a seguinte redação:
Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial.
§ 1º A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite.
§ 2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido.    

Da leitura do referido artigo conclui-se que neste caso a penhora somente deverá ser realizada quando além de ter cito citado, o devedor não pague a dívida ou não nomeie bens à penhora.
Já em 2006, o Código de Processo Civil também passou por mudanças com relação ao processo de execução. A Lei 11.382 de 6 de dezembro acrescentou ao diploma legal o art.655-A, com o seguinte texto (caput):
Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

O art.655, I do CPC afirma ainda que o dinheiro é o primeiro bem da ordem preferencial da realização da penhora. Pela sistemática do CPC, a penhora on line é utilizada, então, tão somente pelo fato de não haver pagamento, sem necessidade de que o devedor não nomeie bens à penhora, uma vez que não é mais direito do devedor, mas sim seu dever quando intimado pelo juiz para proceder à indicação de bens. O direito de nomear bens passou a ser do credor.
A Lei de Execução Fiscal ( Lei nº 6.830 de 1980) informa em seu art.1º que: “A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil”.
Conforme observado, o CPC rege de forma subsidiária a execução fiscal. Por reger-se “subsidiariamente” entende-se que somente terá atuação caso inexista previsão específica na legislação especial, que no caso é a própria Lei de Execução Fiscal. Este foi o entendimento explicitado no Parecer da Procuradoria da Fazenda Nacional emitido em 2007, Parecer/PGFN/CRJ/nº 1732/2007. Segundo este, inclusive as alterações que envolverem algum procedimento com tratamento expresso na LEF deverão ter aplicação, baseado na utilização da Teoria do Diálogo das Fontes, que será explicitada a seguir, haja vista sua utilização pelo Superior Tribunal de Justiça.
Entretanto, outros viram de uma maneira diferente essa aplicação subsidiária. Em caso de previsão expressa da LEF, não caberia aplicação das regras do CPC, ainda que mais benéficas. Este foi um dos argumentos utilizados por muitos doutrinadores para afirmar que na execução fiscal não cabe a utilização preferencial da penhora por meio eletrônico. Ela seria uma medida excepcional que somente deve ser utilizada quando o devedor citado não pague a dívida e nem nomeie bens à penhora.

A jurisprudência dos Tribunais
O Conselho da Justiça Federal, através da resolução nº 524 de 28 de Setembro de 2006 que institucionaliza o uso do sistema Bacen Jud no âmbito da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, assim aduz em seu art.1º que:
Art. 1º Em se tratando de execução definitiva de título judicial ou extrajudicial, ou em ações criminais, de improbidade administrativa ou mesmo em feitos originários do Tribunal Regional Federal poderá o magistrado, via Sistema BACEN-JUD 2.0, solicitar o bloqueio/desbloqueio de contas e de ativos financeiros ou a pesquisa de informações bancárias.
Parágrafo único. No processo de execução, a emissão da ordem em comento poderá ocorrer desde que requerida pelo exeqüente, face à inexistência de pagamento da dívida ou garantia do débito (arts. 659 do CPC e 10 da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980), com precedência sobre outras modalidades de constrição judicial; podendo, nas demais ações, tal medida ser adotada inclusive ex officio.

Em muitos despachos que determinam a realização do bloqueio via Bacen Jud, os juízes federais baseiam-se neste artigo para concluir pela utilização prevista pelo Código de Processo Civil, e não pela do Código Tributário Nacional.
Mas, os contrários a esta utilização preferencial usam de um argumento baseado na  afirmação de que o Código Tributário Nacional é uma lei especial e o Código de Processo Civil uma lei geral. Dessa maneira, quando em confronto, a lei especial deve prevalecer sobre a geral, uma vez que ela trata de maneira mais específica a matéria. Isso seria independentemente da lei geral ser posterior à lei especial.
Além disso, tem-se que o Código Tributário Nacional é uma lei complementar. Por este fato, os defensores da não preferencialidade dizem que somente uma lei complementar poderia modificar o procedimento previsto no art.185-A do CTN. Entretanto, sabe-se que a Constituição Federal reservou algumas matérias à regulação via lei complementar. O art.146 da Constituição Federal declara que disciplinas necessitam desta medida legal. Dentre elas não se encontra nenhuma indicação de matérias processuais que versam sobre o procedimento da execução fiscal, o que faz cair por terra esta alegação.
O Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento de que quando não há indicação da necessidade de lei complementar para versar sobre a matéria, ela pode ser modificada via lei ordinária.
O Tribunal de Justiça de São Paulo possui entendimento peculiar quanto ao assunto. Trata-se de  julgamento de um agravo de instrumento interposto contra decisão do juiz que, mesmo tendo o executado oferecido três bens à penhora, concedeu o pedido de bloqueio via penhora on line. Abaixo segue a ementa:
EXECUÇÃO FISCAL – OFERECIMENTO DE BENS MÓVEIS -EFETIVA GARANTIA DO JUÍZO – RECUSA GENÉRICA – IMPOSSIBILIDADE -PENHORA DE DINHEIRO – IMPOSSIBILIDADE.
A execução é realizada no interesse do credor (art. 612 do CPC), mas, na execução fiscal, a ordem do art. 11 da Lei nº 6.830/80 deve ser especialmente interpretada à luz da regra do art. 620 do CPC, na medida em que a penhora tem por objetivo a garantia do juízo (inteligência dos arts. 9″ e 16 da Lei n” 6.830/80) e o executado não é citado apenas para pagar a dívida, como na sistemática do CPC – art. 652. (BRASIL. Tribunal…, 2010).

Os julgadores paulistas fizeram algumas considerações de relevo no relatório do julgamento. Segundo o relator, Desembargador Carlos Giarusso, a penhora on line constitui-se em medida excepcional a ser adotada no âmbito da execução fiscal. Faz, ainda, uma diferenciação da penhora nos dois casos. Para o Tribunal paulista, na sistemática do CPC a penhora é considerada como o primeiro ato expropriatório imediato de bens do devedor. Já com relação à execução fiscal, constitui-se em um meio de garantia do juízo para discussão do teor da dívida, uma vez que para embargar o executado necessita de uma garantia. No âmbito do processo de execução regulado pelo CPC, apenas no caso de impugnação ao cumprimento de sentença é que é necessário a existência de penhora anterior. Quanto à execução por título extrajudicial, a penhora somente assume importância no momento de se conceder efeito suspensivo aos embargos, não em sua propositura. Ou seja, somente é necessária a garantia do juízo para defesa do executado no caso de impugnação ao cumprimento de sentença tendo em vista que o título foi produzido com maiores garantias.

Ressalvam ainda que:
(…)tratando-se de um título executivo unilateral, que goza de presunção relativa de certeza e liquidez (art. 204 do CTN) e diante do fato de que o devedor, citado, tem o direito de não pagar, optando por garantir a execução e opor embargos (arts. 8o, 16 e 19 da Lei n° 6.830/80), tem-se que a execução fiscal compreende características do processo de conhecimento e do processo de execução, razão pela qual a penhora também deve ser enxergada de forma peculiar (BRASIL. Tribunal…, 2010).
    
Pela análise do julgado referenciado, percebe-se que há o entendimento de que no caso da execução fiscal a dita penhora do bem não visa a satisfação imediata do credor como um ato de afetação, ou seja, de indicação dos bens sobre os quais recairão a execução. Visa, pelo contrário, a uma garantia deste para possibilitar que a exigibilidade da obrigação não se perca com o decurso do tempo. Citam ainda a boa-fé do executado em oferecer bens de valor superior ao débito. Além disso, no caso analisado a exequente indicou apenas que não queria os bens tendo em vista sua difícil comercialização. Entretanto, tal argumento não pode ser considerado, haja vista que antes do julgamento dos embargos o seu interesse é apenas em garantir a execução e não a satisfação imediata do crédito.
O argumento do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no julgamento do  agravo de instrumento processo nº  2011.02.01.008839-2 (BRASIL. Tribunal…, 2011) em que a União não concordou com a decisão em primeira instância que negou provimento ao pedido de penhora online dos ativos da empresa executada, foi também no sentido da não preferencialidade. Utilizaram a lição de Norberto Bobbio, abordando o critério da especialidade:
Conflito entre o critério de especialidade e o cronológico: esse conflito tem lugar quando uma norma anterior-especial é incompatível com uma norma posterior-geral. Tem-se conflito porque, aplicando o critério de especialidade, dá-se preponderância à primeira norma, aplicando o critério cronológico, dá-se prevalência à segunda. Também aqui foi transmitida uma regra geral, que soa assim: Lex posterior generalis non derogat priori speciali. Com base nessa regra, o conflito entre critério de especialidade e critério cronológico deve ser resolvido em favor do primeiro: a lei geral sucessiva não tira do caminho a lei especial precedente. O que leva a uma posterior exceção ao princípio lex posterior derogat priori: esse princípio falha, não só quando a lex posterior é inferior, mas também quando é generalis (e a lex prior é specialis (BOBBIO, 1999, pg.108).

Segundo o entendimento do relator do julgado, o preceito do Código de Processo Civil é aplicável apenas no caso de dívidas não-tributárias, uma vez que a LEF e o CTN atribuem ao executado uma ordem de medidas constritivas a serem seguidas. Dessa maneira, entendem que a antinomia entre essas normas é aparente, uma vez que o critério da especialidade deve ser seguido, conforme já explicitado nas palavras de Norbeto Bobbio.

O entendimento do Superior Tribunal de Justiça: A aplicação da Teoria do Diálogo das Fontes
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é diverso dos outrora explicitados. Segue ementa do Agravo de Regimento:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. SISTEMA BACEN-JUD. LEI Nº 11.382/2006. ARTS. 655, I E 655-A DO CPC. TEMPUS REGIT ACTUM. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, CPC. INOCORRÊNCIA. SÚMULA 98/STJ. (RECURSO REPETITIVO – RESP 1.184.765-PA)
1. A Lei n. 11.382/2006 alterou o CPC e incluiu os depósitos e aplicações em instituições financeiras como bens preferenciais na ordem de penhora, equiparando-os à dinheiro em espécie (artigo 655, I) e admitindo a constrição por meio eletrônico (artigo 655-A).
2. Consoante jurisprudência anterior à referida norma, esta Corte firmava o entendimento no sentido de que o juiz da execução fiscal só deveria deferir pedido de expedição de ofício ao BACEN após o exeqüente comprovar não ter logrado êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens. Precedentes: REsp 802897 / RS, DJ 30.03.2006 p. 203; RESP 282.717/SP, DJ de 11/12/2000; RESP 206.963/ES, DJ de 28/06/1999; RESP 204.329/MG, DJ de 19/06/2000 e RESP 251.121/SP, DJ de 26.03.2001.
3. A penhora, como ato processual, regula-se pela máxima tempus regit actum, segundo o que, consectariamente, à luz do direito intertemporal, implica a aplicação da lei nova imediatamente, inclusive aos processos em curso. Precedentes: AgRg no REsp 1012401/MG, DJ. 27.08.2008; AgRg no Ag 1041585/BA, DJ. 18.08.2008; REsp 1056246/RS, DJ. 23.06.2008).
4. In casu, proferido o decisum que deferiu a medida constritiva em 07.07.2008, ou seja, após o advento da Lei n. 11.382/06, de 6 de dezembro de 2006, incidem os novos preceitos estabelecidos pela novel redação do art. 655, I c.c o art. 655-A, do CPC.
5. O artigo 535 do CPC resta incólume quando o tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
6. A antinomia aparente entre o artigo 185-A do CTN (que cuida da decretação de indisponibilidade de bens e direitos do devedor executado) e os artigos 655 e 655-A do CPC (penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira) é superada com a aplicação da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, idealizada pelo alemão Erik Jayme e aplicada, no Brasil, pela primeira vez, por Cláudia Lima Marques, a fim de preservar a coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil.
7. Com efeito, consoante a Teoria do Diálogo das Fontes, as normas gerais mais benéficas supervenientes preferem à norma especial (concebida para conferir tratamento privilegiado a determinada categoria), a fim de preservar a coerência do sistema normativo.
8. Deveras, a ratio essendi do artigo 185-A do CTN, é erigir hipótese de privilégio do crédito tributário, não se revelando coerente “colocar o credor privado em situação melhor que o credor público, principalmente no que diz respeito à cobrança do crédito tributário, que deriva do dever fundamental de pagar tributos (artigos 145 e seguintes da Constituição Federal de 1988)” (REsp 1.074.228/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 07.10.2008, DJe 05.11.2008).
9. Assim, a interpretação sistemática dos artigos 185-A do CTN, com os artigos 11 da Lei 6.830/80 e 655 e 655-A do CPC, autoriza a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras independentemente do exaurimento de diligências extrajudiciais por parte do exeqüente.
10. À luz da regra de direito intertemporal que preconiza a aplicação imediata da lei nova de índole processual, infere-se a existência de dois regimes normativos no que concerne à penhora eletrônica de dinheiro em depósito ou aplicação financeira: (i) período anterior à égide da Lei 11.382, de 6 de dezembro de 2006 (que obedeceu a vacatio legis de 45 dias após a publicação), no qual a utilização do Sistema BACEN-JUD pressupunha a demonstração de que o exeqüente não lograra êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens; e (ii) período posterior à vacatio legis da Lei 11.382/2006 (21.01.2007), a partir do qual se revela prescindível o exaurimento de diligências extrajudiciais a fim de se autorizar a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras.
11. In casu, proferido o decisum que deferiu a medida constritiva em 07.07.2008, ou seja, posterior à vacatio legis da Lei n. 11.382/06, de 6 de dezembro de 2006, incidem os novos preceitos estabelecidos pela novel redação do art. 655, I c.c o art. 655-A, do CPC.
12. Destarte, o bloqueio eletrônico dos depósitos e aplicações financeiras dos executados, determinado em 2008 (posterior à vigência da Lei 11.382/2006), não se condicionava à demonstração da realização de todas as diligências possíveis para encontrar bens do devedor.
13. À luz da novel metodologia legal, publicado o julgamento do Recurso Especial nº 1.184.765/PA, submetido ao regime previsto no artigo 543-C do CPC, os demais recursos já distribuídos, fundados em idêntica controvérsia, deverão ser julgados pelo relator, nos termos do artigo 557, do CPC (artigo 5º, I, da Res. STJ 8/2008).
14. Agravo regimental desprovido (BRASIL. Superior Tribunal…,2010).
    
Conforme observado, o Superior Tribunal de Justiça entendeu cabível a aplicação da penhora online no âmbito da execução fiscal com fundamento na lei que rege o tempo do ato. No caso em apreço, a decisão se deu após a entrada em vigência da lei 11.382 de 2006, o que faz com ela submeta à sua alçada a matéria processual. Além disso, ela é mais benéfica ao credor, que é quem tem o direito tutelado na execução.
Assim, há o entendimento de que os pedidos de penhora por meio eletrônico antes do advento da Lei 11.382 de 2006 devem ser analisados de acordo com o que afirma o art.185-A do Código Tributário Nacional. Mas, os pedidos posteriores, mesmo em processos já iniciados, devem ser compreendidos à luz da reforma do Código de Processo Civil.
Na ementa é citada a Teoria do Diálogo das Fontes, que afirma que no confronto de uma norma geral posterior com uma norma especial anterior, aquela deve prevalecer a fim de preservar a coerência do sistema normativo quando for mais benéfica. Assim como no processo penal tal benefício é analisado com relação ao réu, no processo de execução ele deve ser feito a respeito do credor, e não do devedor. Ressalva-se ainda que caso a norma do Código Tributário Nacional seja considerada como a válida,  teria-se a seguinte situação: o credor privado estaria em melhor condição do que o credor público, tendo-se em consideração que a ele é proporcionada a penhora online  como preferencial.
Esta teoria foi idealizada pelo alemão Erik Jayme. Foi utilizada no Brasil pela primeira vez pela Profa.Claudia Lima Marques, em sua defesa da coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002 (MARQUES, 2004). Aquele prevê normas protetivas ao consumidor, parte nitidamente mais fraca na relação consumerista.
Considera-se que a instituição da LEF decorreu da necessidade de instituir um mecanismo privilegiado de cobrança do crédito fazendário. Dessa maneira, assim como ocorre com o conflito entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002, as disposições gerais aplicariam-se às disposições específicas, quando mais benéficas.
Outra teoria foi indicada pela Procuradoria da Fazenda Nacional (em seu Parecer PGFN/CRJ n.º 1732/2007), e corrobora com este entendimento, sendo denominada Teoria dos Princípios, de Humberto Ávila:
O ordenamento jurídico estabelece a realização de fins, a preservação de valores e a manutenção ou a busca de determinados bens jurídicos essenciais a realização daqueles fins e a preservação. O interprete não pode desprezar esses pontos de partida. Exatamente por isso, a atividade de interpretação traduz melhor uma atividade de reconstrução: o interprete deve interpretar os dispositivos constitucionais de modo a explicitar suas versões de significados de acordo com os fins e os valores entremostrados na linguagem constitucional (AVILA, 2004, p.26).
 
Assim, se uma lei especial foi criada para dar tratamento mais benéfico para uma categoria, haverá uma contradição ao sistema normativo se não houvesse exceção à regra de que lei especial jamais será derrogada por lei geral. Conforme dito, a LEF possui como fito proporcionar maiores privilégios à cobrança do crédito tributário. Se por falta de atualização para com as normas gerais ela prejudica o alcance deste fim, nada mais coerente do que permitir que as regulamentação geral interceda sobre seu campo de atuação. É, como já afirmado, a preservação da coerência do sistema normativo. A Teoria do Diálogo das Fontes permite então um temperamento ao critério da prevalecência da norma especial.
Conclusão
Pelo exposto, ainda não há um consenso a respeito da matéria. Os adeptos de uma corrente entendem que o critério da especialidade deve ser o empregado, já outros prescrevem a Teoria do Diálogo das Fontes e a busca por coerência no sistema normativo.
O Parecer emitido pela Procuradoria da Fazenda Nacional (PARECER/PGFN/CRJ/Nº 1732/2007)  e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aderiram ao entendimento da aplicação. A base, conforme explicitado, recai sobre a aplicação de normas gerais mais benéficas posteriores, sobrepondo-se assim ao critério da especialidade.
Contudo, percebe-se que nem todos os tribunais estão de acordo com o referido entendimento, uma vez que acreditam que o critério da especialidade deve ser levado em consideração, sem análise do benefício que a lei geral poderia trazer.
Com base nestes entendimentos, pode-se concluir que apesar de não haver um consenso sobre a matéria, com certeza nos próximos anos a corrente da aplicabilidade prevalecerá, uma vez que é recente o estudo da Teoria do Diálogo das Fontes e sua aplicação está em fase inicial no ordenamento jurídico brasileiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. Da definição a aplicação dos princípios jurídicos. 3a ed. amp. São Paulo: Malheiros, 2004.
BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Brasília: UnB, 10ª ed., 1999.
BRASIL. Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Parecer PGFN/CRJ n.º 1732/2007.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.167.656 – MG (2009/0223597-2), Rel. Min. Luiz Fux, Brasília, 14 dez. 2010.
BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento nº 0513122-77.2010.8.26.0000 da 18ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Carlos Giarusso Santos, São Paulo, 17 mar. 2010.
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 2ª Região. AI nº 2011.02.01.008839-2. Rel. Des. Fed. Salete Maccalóz, 21 Jul. de 2011.
MARQUES, Cláudia Lima. Superação das antinomias pelo diálogo das fontes: o  modelo brasileiro de coexistência entre o código de defesa do consumidor e código  civil de 2002. Revista da Escola Superior da Magistratura de Sergipe, Sergipe,  n.07, p. 15-54, 2004. Disponível em:< http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/22388/superacao_antinomias_dialog o_fontes.pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 ago. 2010.

Rodrigo Dos Santos Ribeiro

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