Responsabilidade Civil nas Terceirizações

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Segundo penso, tomador e prestador de serviços respondem objetiva e solidariamente pela indenização do trabalhador nos casos de acidente do trabalho, doença do trabalho ou moléstia ocupacional a ele equiparável. O terceiro responde no acidente do trabalho e na doença ocupacional, equiparável àquele, da mesma forma que o causador direto do dano. A responsabilidade solidária do terceiro está 

“em que a certas pessoas incumbe o dever de velar sobre o procedimento de outras, cuja inexperiência ou malícia possa causar dano a terceiros. É lícito, pois, afirmar, sob esse aspecto, que a responsabilidade por fato de outrem não representa derrogação ao princípio da personalidade da culpa, porque o responsável é legalmente considerado em culpa, pelo menos em razão da imprudência ou negligência expressa na falta de vigilância sobre o agente do dano”[1].

O prestador do serviço ao tomador, por maior que seja a sua especialidade, põe-se de permeio nesse contrato, em relação aos seus próprios empregados, na mesma ordem que o preposto e o preponente. De fato, o prestador não está na cadeia produtiva do tomador porque quer, mas porque, em razão da sua especialidade, que talvez não seja a do tomador, interessa àquele tomador mesmo porque, sem ela, o tomador não alcançaria o seu objetivo empresário, ou o alcançaria com maior custo, que à sociedade empresária não interessa, ou não pode suportar. A responsabilidade que os enliça é sempre objetiva. Como está na doutrina[2],

“Considerando sem maior relevo a questão de identificar a inegável relação jurídica que autoriza, de si só, a responsabilidade do empregador pelo ato do preposto, no exercício de suas funções, podemos, entretanto, enquadrar nessa categoria de contrato o vínculo jurídico de que tratamos. O que não é possível é negar a existência desse elemento que empresta ao ato do preposto a natureza de ato do preponente. No que respeita ao problema da responsabilidade civil, como o encaramos, esse interesse diminui, já que fica resolvida a questão essencial, isto é, a responsabilidade do principal pelos atos do subordinado. Preferimos, como temos tantas vezes manifestado, assentar desde logo na concepção objetiva essa espécie de responsabilidade, e o legislador também fez essa opção, que expressou no art.933 do Código Civil de 2002. Com precisão, já o havia previsto Pontes de Miranda, ensinando que esse fundamento “está em que o comitente ou patrão deve responder pelo que se passa no funcionamento da organização que dirige, ou durante ele”. O critério é puramente objetivo, e a jurisprudência à época do Código Civil de 1916,quando conseguia libertar-se dos preconceitos que a sujeitavam a critérios anacrônicos, dizia sem rodeios: ”A responsabilidade do principal pelos atos de seus dependentes é de natureza objetiva; é pura obrigação legal, que se não funda em culpa in eligendo ou in vigilando, e sim no fato (culposo ou doloso) do empregado que, na órbita do seu encargo e no exercício das respectivas funções, é considerado fato da função, atividade delegada, cuja plena garantia a lei impõe ao principal, por motivo de segurança pública e de proteção eficaz da vítima”.

Para STOCCO[3], “por força do contrato de trabalho, o empregador obriga-se a dar ao empregado condições plenas de trabalho, no que pertine à segurança, salubridade e condições mínimas de higiene e conforto”. Como solidariedade não se presume, podendo defluir da lei ou do contrato — e há contrato de trabalho em que, por adjudicação constitucional, o empregado é credor do patrão de um meio ambiente de trabalho hígido e socialmente saudável —, a responsabilidade pela indenização do empregado, ou do espólio, por acidente do trabalho, pode ser exigida tanto do empregador direto quanto do tomador dos serviços do prestador, como de ambos, simultaneamente. Trata-se de dívida comum que pode ser cobrada de um ou de outro[4]. A vítima, credora da indenização, pode demandar o causador direto do dano, ou aquele que, tendo se beneficiado dos serviços do agressor, dele se locupleta, ainda que indiretamente[5].

O fundamento da ação indenizatória repousa no dano causado a outrem, por dolo ou culpa, independentemente de qualquer vínculo contratual entre o causador do prejuízo e o sujeito passivo da lesão. Trata-se de indenização que deriva da responsabilidade extracontratual, ou aquiliana, e que se funda no art.186 do Código Civil de 2002[6]. Pouco faz se o dano foi causado pelo real empregador, prestador do serviço, ou pelo tomador, dentro da cadeia produtiva em que a atividade do prestador se insere em maior ou menor grau na atividade do tomador. A responsabilidade é sempre solidária e objetiva entre o prestador e o tomador pelo fato do risco, isto é, um e outro criam em conjunto o risco do acidente, e se responsabilizam por ele, pelo só-fato de que o risco à incolumidade física do trabalhador decorre da existência da atividade empresarial. O que releva saber é que o acidente fatal não teria ocorrido se prestador e tomador não tivessem criado o risco pela simples evidência de terem estabelecido a atividade nociva, causa primal do evento lesivo. A culpa in eligendo ou in vigilando do empregador é presumível quando o acidente é previsível ou pode ser previsto pela experiência comum dos homens[7]. Dito doutro modo, a culpa do empregador se presume da negligência em tolerar que em atividade hostil a integridade física do empregado seja permanentemente exposta[8]. Já que se trata de responsabilidade objetiva e solidária, pode a vítima eleger uma ou outra sociedade empresária — tomadora ou prestadora dos serviços — como ré da pretensão reparatória, evitando, assim, a via-crúcis de perseguir, primeiro, o patrimônio do causador direto do dano — prestador —, em regra hipossuficiente, para, depois, investir contra o patrimônio do tomador. Ao tomador e ao prestador do serviço cabe o ônus de provar que não houve o fato, não foi o seu autor, não há nexo causal entre o fato e o dano ou houve culpa exclusiva da vítima.


[1] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Ed. Renovar, 2006, 11ª edição,p.742.

[2] DIAS, José de Aguiar, op.cit.,p.763.

[3] STOCCO,Rui. Responsabilidade Civil, Ed.RT., 3ª ed., p.283.

[4] SILVA PEREIRA, Caio Mário. Instituições de Direito Civil, Ed. Forense, vol. I, p.88.

[5] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil, Ed. Forense, 5ª ed.,vol.II, p.454 e 456.

[6] LUIZ AMORIM, Sebastião e OLIVEIRA, José de. Responsabilidade Civil-Acidente do Trabalho,Ed. Saraiva,RJ, 2003, 2ª edição,p.3.

[7] LUIZ AMORIM, Sebastião e OLIVEIRA, José de.,op.cit.p.14.

[8] Ver. 489.138, 3ª Câmara Cível,Rel. Juiz Aclibes Burgarelli, DJ de 27/5/97, verbis: “A negligência pode decorrer da tolerância de situações que,conforme o lugar, ensejam ocorrência de acidentes, os quais, depois de examinados, geram observações e recomendações para que não voltem a acontecer”.

[9] Desembargador Federal do Trabalho  — Membro efetivo da 7ª Turma do TRT/RJ.

Jose Geraldo da Fonseca

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