O imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza – considerações gerais

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Imposto de renda – progressividade – generalidade

O artigo dispõe sobre o imposto de renda e proventos de qualquer natureza. Trata da sua previsão constitucional discorrendo de maneira geral sobre os termos ‘renda’ e ‘proventos’, e ainda esclarece que a instituição e cobrança desse imposto deve observar os critérios da universalidade, generalidade e progressividade.

 

O Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza – considerações gerais

A estrutura fundamental do sistema jurídico encontra-se no Texto Supremo, pois é a partir da Constituição que há legitimação de toda a ordem jurídica.

O sistema constitucional pode ser compreendido como aquele que fundamenta todo o ordenamento, tendo em vista a superioridade hierárquica dos dispositivos previstos explícita ou implicitamente no Texto Constitucional.

A Constituição da República Federativa do Brasil é norma fundante que organiza internamente os seres e entidades dentro de uma sociedade, observados os valores axiológicos a serem preservados dentro de determinado contexto social.

Nesta linha de entendimento, cabe registrar aqui as lições de Hans Kelsen4:

a ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da relação de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até chegar finalmente na norma fundamental – pressuposta. A norma fundamental – hipotética, nesses termos – é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta inter-relação. Se começarmos levando em conta apenas a ordem jurídica do Estado, a Constituição representa o escalão de Direito positivo mais elevado.

Com base no dispoto acima, a Carta Magna ao dispor sobre as limitações constitucionais ao poder de tributar introduziu no sistema jurídico preceitos imperativos que têm por fim determinar o modo de ser de um Estado, gizando seus aspectos fundamentais.

Essas previsões inseridas no Texto Constitucional não precisam de regulação infraconstitucional para que restem respeitadas em nosso ordenamento jurídico, como o caso das previsões expostas no artigo 5º da Constituição Federal, bem como os princípios e regras inseridos no capítulo que trata da limitação constitucional ao poder de tributar.

Discorrendo sobre o tema, importante destacar, por outro lado, que o Estado através do exercício da tributação arrecada fundos para a manutenção de suas funções.

Acontece que o poder de tributar do Estado encontra-se totalmente limitado ao previsto no Texto Fundamental, ou seja, ao instituir um tributo o Poder Público deve respeitar largo catálogo de direitos fundamentais tais como legalidade, igualdade, razoabilidade, proporcionalidade, etc., bem como deve observar as regras e os princípios constitucionais tributários da estrita legalidade, capacidade contributiva, isonomia, dentre outros.

Dentro do capítulo que trata das limitações, a Constituição Federal dispôs sobre a competência tributária para a instituição de tributos.

Entende-se por competência jurídica tributária a aptidão que só as pessoas políticas possuem para criar em abstracto tributos, descrevendo legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos e passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas.

A Constituição Federal ao descrever sobre as limitações constitucionais ao poder de tributar, traçou a regra-matriz de incidência tributária de cada tributo. Assim, o legislador ao exercitar sua competência tributária deverá respeitar a regra-matriz de incidência tributária pré-traçada na Lei Fundamental.

Essa regra-matriz de incidência pré-traçada pelo Texto Supremo, forma o que pode ser chamado de ‘domínio mínimo necessário à tributação’.

No que concerne aos impostos, a Constituição traçou a regra daqueles que podem ser criados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Cabe lembrar que um dos traços típicos da competência tributária é a sua privatividade, ou como dizia o mestre Geraldo Ataliba sua exclusividade.

A outorga de competência tributária ao mesmo tempo em que afirma aptidão de uma dada pessoa política nega as demais de fazerem o mesmo. A criação de tributo por pessoa politicamente incompetente, faz nascer a nulidade da lei em questão, não podendo tal irregularidade ser sanada.

No dizer de Rubens Gomes de Sousa5 “quando se alega incompetência, automaticamente se está alegando que alguém extravasou de limites. Portanto, talvez melhor do que referência direta à competência, a referência indireta, pois a argüição de incompetência torna mais patente ainda que se trata de um ato exercido fora dos limites pré-fixados”.

Desta forma, a competência tributária, dada pela Constituição Federal às pessoas políticas está longe de ser ilimitada. Consequentemente os contribuintes só poderão ser tributados por pessoas politicamente competente.

Após essas observações, a Carta Magna em seu artigo 153, III estabeleceu que a União tem competência para tributar por meio de imposto a renda e os proventos de qualquer natureza das pessoas físicas e jurídicas.

Ressalte-se mais uma vez que a instituição do imposto de renda e proventos de qualquer natureza depende de observância da regra-matriz traçada pela nossa Constituição Federal.

No âmbito tributário, conforme exposto acima a Carta Fundamental traz os conteúdos semânticos mínimos, ou seja, as noções genéricas, quer de renda, quer de proventos de qualquer natureza que devem ser respeitados quando da instituição desse imposto.

Sobre renda, cabe as considerações de Hugo de Brito Machado6:

…o âmbito material de incidência do imposto sobre a renda é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; e de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda.

Ainda sobre o tema, acrescenta que:

A formulação do conceito de renda tem sido feita pelos economistas e financistas. Não há, entretanto, uniformidade de entendimento. Assim, para fugir as questões relacionadas com o conceito de renda, referiu-se a Constituição também a proventos de qualquer natureza.

Assim podemos entender por renda tributável aquela renda líquida ou lucro, isto é, o resultado de uma série de deduções e abatimentos feitos sobre os rendimentos brutos. Importante acrescentar, que para a configuração de renda não importa a procedência dessa renda tributável, ou seja, não importa se restou de atividade lícita ou ilícita, moral ou imoral.

Pontue-se ainda que o imposto sobre a renda deverá incidir apenas sobre rendas disponíveis.

As rendas passíveis de tributação resultam de acréscimo patrimonial que pode-se entender quando confrontados os dois momentos temporais, os elementos ativos que sobrepõem-se aos elementos passivos da totalidade do patrimônio do contribuinte.

Assim, por rendas e proventos podemos entender a diferença positiva entre as receitas e despesas do contribuinte desse imposto.

O tributo não pode recair sobre ingressos obtidos num único momento, assim, os rendimentos não podem ser considerados isoladamente, mas dentro de um período de tempo que contenha um termo inicial e um final.

Como é fácil perceber, o valor da compra e venda em que não há excedente ou lucro, mas mera reposição do capital aplicado, não pode ser tributado.

Outro traço característico desse imposto, é que ele não pode incidir quando ausente o ganho real do contribuinte ou diante de meras recomposições patrimoniais, como as indenizações.

Acerca do assunto, importante ressaltar que a Constituição Federal ao dispor em linhas gerais sobre o imposto de renda, previu que este deve respeitar a regra da generalidade, progressividade e uniformidade sobre a renda conforme artigo 153, § 2º:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: §2º.O imposto previsto no inciso III: I – será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade.

Em observância a essa determinação, o imposto sobre a renda caracteriza-se pela observância dos critérios da progressividade, da universalidade e da generalidade, que, conjugados, imprimem-lhe caráter pessoal, graduando-o de acordo com a capacidade econômica de cada contribuinte, tornando-o justo.

O imposto será universal, isto é, de acordo com o princípio da universalidade, a lei que instituir impostos deverá abranger todo o território nacional.

Pelo critério da universalidade busca-se, ademais, alcançar todos os lucros ou ganhos, de quaisquer espécies ou gênero obtidos pelo contribuinte de imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. Nada deve escapar à sua incidência. Tal avaliação conecta o tributo aos princípios da capacidade contributiva e da igualdade.

Já no tocante ao princípio da generalidade, deve ser tributada todas as pessoas que auferirem renda, excetuando-se, logicamente, as imunidades e as isenções legalmente concedidas.

A partir desse critério buscou-se alcançar com o imposto sobre a renda todas as pessoas que realizam seu fato imponível, vedando discriminações e privilégios entre os contribuintes.

Ainda quanto a generalidade também poderá haver incentivos e benefícios fiscais, desde que destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do país.

Quanto a progressividade das alíquotas tributárias, nota-se que é um dos meios mais adequados dentro do ordenamento jurídico no combate as injustiças tributárias, uma vez que, a aplicação de alíquotas fixas para cobrança de impostos agravaria as desigualdades tributárias sendo expressamente vedado pelo Texto Supremo.

A aplicação de alíquotas progressivas quando da instituição dos tributos, pode ser visto como meio fundamental para a distribuição das cargas tributárias, auferindo a potencialidade econômica real dos contribuintes.

Finalmente, pelo critério da progressividade quanto maior a base de cálculo do imposto de renda, tanto maior terá que ser a alíquota aplicável na determinação do quantum debeatur.

Com efeito, quem tem rendimentos mais expressivos deve ser proporcionalmente mais tributado por via de imposto de renda do que quem tem menores. É por essa razão que o ordenamento jurídico entende que a pessoa que ganha um salário mínimo, ganha o mínimo indispensável para manter-se e a seus familiares, não cabendo neste caso a tributação.

O Texto Fundamental em seu artigo 3º, III, garante a todos os indivíduos condições mínimas de existência digna, assim, tudo o que está previsto na Lei Maior, expressa ou implicitamente como integrante do chamado mínimo vital não constitui nem renda nem proventos passíveis de incidência de imposto de renda.

Esclareça-se que o mínimo vital gravita em torno da vida, saúde, cultura, quer própria, quer dos familiares quer dos dependentes do contribuinte desse imposto.

Ademais, esses valores ainda não são passíveis de tributação porque dizem respeito aos inafastáveis deveres do Estado para com a sociedade.

Com base na observância desses critérios, elucida-se ainda que, o imposto sobre a renda pressupõe uma universalidade de receitas, entendidos como um conjunto de entradas e saídas de valores do patrimônio do contribuinte.

O imposto não pode incidir exclusivamente na fonte, porque esse mecanismo segrega uma parcela dos rendimentos obtidos, sem levar em conta a real existência no ano base de acréscimo patrimonial.

Apenas as alterações patrimoniais positivas são passíveis de incidência de imposto de renda. Reforça tal entendimento, o princípio da capacidade contributiva e da vedação do confisco. Assim eventual incremento patrimonial, só poderá ser considerado, para fins do artigo 153, III, da Carta Magna, se for cotejado com a riqueza preexistente do contribuinte.

Posto isto, uma pessoa só poderá sofrer a incidência do imposto de renda se obtiver lucro durante um certo lapso temporal previsto em lei.

Resta afastado da incidência desse tributo tudo que não seja renda, nem proventos, como por exemplo, o custo da empresa, do valor das depreciações, da quantia paga pela energia elétrica consumida, do capital empregado, das indenizações recebidas, dos numerários havidos a título de financiamento, etc.

No que toca a tributação de proventos, entende-se como passíveis de tributação aqueles que aumentam a riqueza econômica do contribuinte, têm em conta a mesma acepção de renda já que ambos levam em conta acréscimos patrimoniais, são riquezas que agregam o patrimônio do contribuinte.

Cabe registrar que a pontencialização arrecadatória do imposto sobre a renda não tem força jurídica para criar o uso de ficções, presunções ou equiparações.

Por outro lado, eventuais isenções podem existir quando buscam preservar os objetivos consagrados constitucionalmente, tais como, proteção à idosos, família, à cultura, os deficientes mentais, etc, contudo, desde que reste observado o princípio da igualdade.

A renda tributável deve ser obtida subtraindo-se da renda global os gastos necessários do contribuinte.

Em resumo, pode-se entender por renda o acréscimo patrimonial decorrente diretamente do capital e do trabalho, e por proventos, os acréscimos advindos de outras fontes, exemplo, pensões de aposentadoria.

 

BIBLIOGRAFIA

CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda – perfil constitucional e temas específicos. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução José Baptista Machado. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de dieito tributário. 23ª edição, rev. atual. E amp.São Paulo: Malheiros Editores, 2003.

SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Coordenação IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários: obra póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1975.

 

4 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução José Baptista Machado. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 1987. p. 240.

5 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Coordenação IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários: obra póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1975.

6 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de dieito tributário. 23ª edição, rev. atual. E amp.São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 289.

Gustavo Kenner Alcantara

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