Como redigir ementas

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Sumário: 1) — Introdução; 2) —O que é uma ementa?;3) — Partes da ementa; 4) —Verbetação; 5) — Dispositivo; 6) — Função didática da ementa; 7) —Conclusão.
                                                          José Geraldo da Fonseca[1]
 
 
Introdução
 
 
De acordo com a lei[2], todo acórdão tem de ter ementa. Arestos que se limitam a dizer, no lugar da ementa, “sentença que se mantém pelos próprios fundamentos”, ou expressões equivalentes, ferem a lei porque tais registros econômicos não são ementas, na acepção do termo. Compreende-se que a escassez de tempo, contraposta à enxurrada de processos, leve o redator a optar por esse modo espartano de escrever, mas isso não apaga evidência de que a formalidade da lei ficou em segundo plano.
A ementa não pode estar em rota de colisão com a fundamentação do acórdão ou com seu dispositivo. Desencontros desse tipo são comuns e ensejam embargos de declaração. Se houver evidente contradição entre o corpo do julgado e a ementa, prevalece o teor do julgado, e não a ementa, mas é essencial que haja sintonia entre o que a ementa diz e o que se julgou efetivamente.
 
 
 
O que é uma ementa?
 
 
Ementa deriva do plural neutro latino ementum, do verbo eminiscor, que significa anotação, apontamento, coisa que precisa ser lembrada. No sentido jurídico, a ementa é, pois, não um resumo do que se decidiu no acórdão, mas uma discussão em tese, um juízo de valor do órgão julgador sobre um instituto que se discutiu na decisão ou que lhe serviu de base para o julgamento.
A ementa não tem de explicar o porquê do julgamento, mas, partindo dele, discutir, de modo abstrato, o tema que serve de miolo da lide.
 
 
Partes da ementa
 
 
Toda ementa tem duas partes: verbete (ou verbetação) e dispositivo (ou discussão). Verbetação é um conjunto de palavras ou expressões, em seqüência, que indica o assunto de que se trata. Dispositivo é a discussão do instituto e traduz o pensamento do tribunal sobre o ponto de direito.
 
 
Verbetação
 
 
A verbetação tem de ser escrita em caracteres verticais, em caixa-baixa, sempre em minúsculas, com exceção da primeira letra de cada termo. Os termos devem ser separados por pontos. Não pode conter orações inteiras, mas termos isolados, de sentido completo. Usualmente não se escreveem negrito. Se a hipótese em discussão for um contrato de leasing, não se diz na verbetação, por exemplo, “O pagamento do valor residual antecipado descaracteriza o contrato de leasing”, mas “Leasing. Valor residual. Pagamento antecipado. Descaracterização“.
 
 
Dispositivo
 
 
Escreve-se o dispositivo sempre em itálico. Essa parte da ementa não deve conter citação de lei ou de doutrina, pois isso lhe retira a originalidade e a particularidade[3]. É, sempre, dissertação sobre um ponto abstrato. Embora abstrato, o dispositivo tem de ser objetivo, conciso, seguro, isento de ânimo e claro. Tem de trazer uma proposição afirmativa, ainda que seja para negar esta ou aquela conclusão tirada na sentença que se reexamina.
Não se admite a inclusão de termos vagos (“ao que tudo indica “, “segundo a melhor doutrina”, “até onde se sabe dos autos”etc ) . Se a ementa tratar de mais de um assunto, haja ou não correlação direta entre eles, deverá conter, em separado, uma verbetação e um dispositivo para cada assunto. É tão errado redigir uma só verbetação para mais de um dispositivo como redigir um único dispositivo para mais de uma verbetação. Suponha, por exemplo, que o acórdão tenha decidido dois assuntos: dissolução irregular de sociedadee falência de sociedade simples, segundo o novo Código Civil .Como são dois verbetes (dissolução irregular de sociedade e falência de sociedade simples), serão necessários dois dispositivos distintos.
Vejamos exemplos de uma ementa errada e de outra certa.
 
1º exemplo ¾ ementa errada
 
Dissolução irregular de sociedade. Desconsideração da personalidade jurídica da sociedade. Fraude. Bens particulares de sócio. Penhora. Admissibilidade. Falência. Sociedade simples. Inocorrência.
A dissolução irregular da sociedade empresária autoriza a desconsideração de sua personalidade jurídica de modo que a alteração da imputação do centro de sua responsabilidade permite a penhora de bens particulares dos sócios. Sociedade simples não incide em falência exceto se presente o elemento de empresa.
 
2º exemplo     ¾        ementa certa
 
1ª verbetação®Dissolução irregular de sociedade. Desconsideração da personalidade jurídica da sociedade. Fraude. Bens particulares de sócio. Penhora. Admissibilidade.
1º dispositivo®A dissolução irregular da sociedade empresária autoriza a desconsideração de sua personalidade jurídica de modo que a alteração da imputação do centro de sua responsabilidade permite a penhora de bens particulares dos sócios.
 
2ª verbetação®Falência. Sociedade simples. Inocorrência.
2º dispositivo®Sociedade simples não incide em falência exceto se presente o elemento de empresa .
 
Função didática da ementa
 
Já se disse, com muita propriedade, que o direito vive nos tribunais. O aforismo significa que os tribunais, interpretando o direito, lhe servem de seiva, porque o vivificam. De fato, a jurisprudência repensa o direito em cada caso concreto e atualiza a sua semente essencial. A jurisprudência não é senão o direito posto, interpretado segundo o enredo mais atual dos fatos. As ementas têm, nesse contexto, importância fundamental, pois afora o seu valor intrínseco (porque a ementa é parte integrante e necessária do acórdão), toda ementa tem uma função didática: sinaliza o entendimento do tribunal sobre determinado ponto, contribui para a formação teórica do advogado e serve de paradigma para o juizado inferior.
 
 
Conclusão
 
·      A ementa não pode conter uma explicação do porquê de se ter decidido tal e qual coisa desta ou daquela forma nem antecipar o resultado do julgamento. Não se põem, portanto, ao final das ementas (como é corriqueiro ver-se nos repertórios)locuções como “apelo improvido”, “recurso não conhecido” etc.
 
·      Ementa não é lugar de paixão nem de correção da forma de julgar. Assim, não pode conter afirmações do tipo “o juiz de primeiro grau está errado quando diz que…”, ou “…traduz rematado absurdo admitir defesa como a que se viu nos autos...”, ou coisas do gênero. Essas ilações traduzem uma forma sutil de censura ao trabalho do juízo inferior (quando diz que o juízo está errado em pensar como pensa) e estão contaminadas por subjetivismo que não cabe na ementa (quando diz,por exemplo, “traduz rematado absurdo…”).
 
·      Quem redige uma ementa tem de ter consciência de que o que escreve poderá servir de referência para o trabalho de advogados e juízes, contribuindo para a evolução(ou involução)da ciência jurídica pelo estudo do caso concreto que serve de subsídio à sua redação final. Uma ementa mal-escrita, desarrazoada, contrária à essência das leis ou do direito pode deformar toda uma linha de raciocínio jurisprudencial que está em via de se firmar e servir de mau paradigma para o trabalho advocatício, com graves repercussões na firmeza de entendimento de um tribunal.


[1] Juiz — TRT/RJ — 7ª Turma.
[2] CPC,art. 563: “Todo acórdão terá ementa”.
[3] CAMPESTRINI,Hildebrando. Como Redigir Ementas.Ed.Saraiva,,1994, p.8 .

Jose Geraldo da Fonseca

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