O reconhecimento pelo supremo tribunal federal da admissibilidade de recurso interposto antes da publicação do julgado recorrido e a compatibilidade com a área trabalhista

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RESUMO

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal em decisão recente conheceu de um Embargos Declaratórios oposto antes da publicação do julgado embargado, privilegiando, com esse julgamento, alguns princípios como o da Celeridade em detrimento do formalismo excessivo processual.

A decisão exarada pelo P. Excelso, apesar de abranger um caso concreto criminal, apresenta plena consonância com o arcabouço jurídico trabalhista que privilegia a celeridade dos atos processuais sem um rigor excessivo, apesar da existência de entendimento sumular contrário no C. Tribunal Superior do Trabalho.

E este trabalho traz uma nova visão sobre a compatibilidade do conhecimento de recurso trabalhista interposto antes da publicação do julgado recorrido, tudo em harmonia com o entendimento do Supremo Tribunal Federal.

 

PALAVRAS-CHAVE

Interposição de recurso – Momento anterior ao julgado – Tempestividade – STF – TST

 

INTRODUÇÃO

Em decisão recente o P. Supremo Tribunal Federal julgou um Embargos de Declaração em Habeas Corpus e reconheceu a sua tempestividade não obstante a oposição do instrumento processual em data anterior à publicação do julgado.

E o presente trabalho tem por escopo demonstrar a compatibilidade dessa decisão do Supremo Tribunal Federal com o arcabouço jurídico trabalhista malgrado a existência de entendimento sedimentado em sentido contrário no âmbito do C. Tribunal Superior do Trabalho.

 

ADMISSIBILIDADE DE RECURSO INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO JULGADO RECORRIDO: A DECISÃO DO STF E A COMPATIBILIDADE COM A ÁREA TRABALHISTA

O informativo número 655 do Supremo Tribunal Federal veiculou uma decisão prolatada pela 1ª Turma que, malgrado abranja matéria penal, encontra plena consonância com os princípios trabalhistas, não obstante a existência de posicionamento sedimentado em contrário pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho.

Quando da análise do Embargos de Declaração oposto no Habeas Corpus 101132 ED/MA a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal entendeu que recurso interposto antes da publicação não pode prejudicar a parte recorrente ante a contribuição desta com a celeridade do processo, bem como por não poder o rigor do formalismo jurídico ignorar a boa-fé processual.

Com muita precisão manifestou a 1ª Turma do P. STF, verbis:

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO. CONHECIMENTO. INSTRUMENTALISMO PROCESSUAL. PRECLUSÃO QUE NÃO PODE PREJUDICAR A PARTE QUE CONTRIBUI PARA A CELERIDADE DO PROCESSO. BOA-FÉ EXIGIDA DO ESTADO-JUIZ. DOUTRINA. RECENTE JURISPRUDÊNCIA DO PLENÁRIO. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E REJEITADO.

1. A doutrina moderna ressalta o advento da fase instrumentalista do Direito Processual, ante a necessidade de interpretar os seus institutos sempre do modo mais favorável ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CRFB) e à efetividade dos direitos materiais (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. In: Revista de Processo, São Paulo: RT, n.º 137, p. 7-31, 2006; DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010).

2. A forma, se imposta rigidamente, sem dúvidas conduz ao perigo do arbítrio das leis, nos moldes do velho brocardo dura lex, sed lex (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Simplificação e adaptabilidade no anteprojeto do novo CPC brasileiro. In : O Novo Processo Civil Brasileiro Direito em Expectativa. Org. Luiz Fux. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 76).

3. As preclusões se destinam a permitir o regular e célere desenvolvimento do feito, por isso que não é possível penalizar a parte que age de boa-fé e contribui para o progresso da marcha processual com o não conhecimento do recurso, arriscando conferir o direito à parte que não faz jus em razão de um purismo formal injustificado.

4. O formalismo desmesurado ignora a boa-fé processual que se exige de todos os sujeitos do processo, inclusive, e com maior razão, do Estado-Juiz, bem como se afasta da visão neoconstitucionalista do direito, cuja teoria proscreve o legicentrismo e o formalismo interpretativo na análise do sistema jurídico, desenvolvendo mecanismos para a efetividade dos princípios constitucionais que abarcam os valores mais caros à nossa sociedade (COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: un análisis metateórico. Trad. Miguel Carbonell. In: Isonomía. Revista de Teoría y Filosofía del Derecho, nº 16, 2002).

5. O Supremo Tribunal Federal, recentemente, sob o influxo do instrumentalismo, modificou a sua jurisprudência para permitir a comprovação posterior de tempestividade do Recurso Extraordinário, quando reconhecida a sua extemporaneidade em virtude de feriados locais ou de suspensão de expediente forense no Tribunal a quo (RE nº 626.358-AgR/MG, rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julg. 22/03/2012).

6. In casu : (i) os embargos de declaração foram opostos, mediante fac-símile, em 13/06/2011, sendo que o acórdão recorrido somente veio a ser publicado em 01/07/2011; (ii) o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime do art. 12 da Lei nº 6.368/79, em razão do alegado comércio de 2.110 g (dois mil cento e dez gramas) de cocaína; (iii) no acórdão embargado, a Turma reconheceu a legalidade do decreto prisional expedido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão em face do paciente, para assegurar a aplicação da lei penal, em razão de se tratar de réu evadido do distrito da culpa, e para garantia da ordem pública; (iv) alega o embargante que houve omissão, porquanto não teria sido analisado o excesso de prazo para a instrução processual, assim como contradição, por não ter sido considerado que à época dos fatos não estavam em vigor a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07.

7. O recurso merece conhecimento, na medida em que a parte, diligente, opôs os embargos de declaração mesmo antes da publicação do acórdão, contribuindo para a celeridade processual.

8. No mérito, os embargos devem ser rejeitados, pois o excesso de prazo não foi alegado na exordial nem apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, além do que a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07 em nada interferem no julgamento, visto que a prisão foi decretada com base nos requisitos do art. 312 do CPP identificados concretamente, e não com base na vedação abstrata à liberdade provisória, prevista no art. 44 da Lei de Drogas de 2006.

9. Embargos de declaração conhecidos e rejeitados.(1)

Observa-se que a manifestação da 1ª Turma do P. Excelso foi ao encontro do artigo 5º, inciso LXXVIII da CR/88, merecendo ser ressaltada ante a lógica jurídica externada.

E a relevância desse julgado se amplia quando trazida para a análise em outros ramos do direito, em especial o trabalhista, face a consonância desse posicionamento com o arcabouço jurídico trabalhista que privilegia a celeridade processual e a informalidade em seus atos, veja:

O artigo 765 da CLT reza que:

Art. 765 – Os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas.(2) Destaque nosso

Por sua vez, o artigo 841, também da CLT, dispõe:

Art. 841 – Recebida e protocolada a reclamação, o escrivão ou secretário, dentro de 48 (quarenta e oito) horas, remeterá a segunda via da petição, ou do termo, ao reclamado, notificando-o ao mesmo tempo, para comparecer à audiência do julgamento, que será a primeira desimpedida, depois de 5 (cinco) dias.(3)

Logo, o Princípio da Celeridade Processual ressaltado na v. decisão do P. Supremo Tribunal Federal é marcante na área trabalhista.

Nesse sentido cita-se a manifestação do i. doutrinador processualista Bolivar Viégas Peixoto que, em sua obra Iniciação ao Processo Individual do Trabalho, assevera:

O princípio da celeridade também é marcante no processo do trabalhista. Inclusive, é um objetivo do princípio da oralidade, ou seja, o procedimento oral possibilita, de forma direta, a celeridade processual.

Celeridade é sinônimo de rapidez, o que impõe ao Juiz tomar todas as providências necessárias ao rápido andamento do feito, com a pronta prestação jurisdicional, pelo caráter alimentar dos créditos trabalhistas, não sujeitando o trabalhador a uma longa espera pelas soluções dos seus anseios.

Esta regra insere precipuamente no art. 765 da CLT, no sentido de que “ os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”. Isto significa que se trata de um princípio que traduz uma exigência indiscutível.

O artigo 841 consolidado também é um espelho do princípio da celeridade, ao dispor que a audiência será realizada na primeira folga da pauta, não admitindo postergação.(4)

No mesmo ensejo, no âmbito trabalhista tem destaque o Princípio da Informalidade que pode ser encontrado nos artigos 840 e 899 da CLT e que somando-se ao Princípio da Celeridade reforça a compatibilidade do recente julgado do Supremo Tribunal Federal com o arcabouço jurídico trabalhista.

Art. 840 – A reclamação poderá ser escrita ou verbal.

§ 1º – Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do Presidente da Junta, ou do juiz de direito a quem for dirigida, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.

§ 2º – Se verbal, a reclamação será reduzida a termo, em 2 (duas) vias datadas e assinadas pelo escrivão ou secretário, observado, no que couber, o disposto no parágrafo anterior.(5)

Art. 899 – Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora.(6)

Sobre o alcance deste Princípio discorre Bolívar Viégas Peixoto:

Tem o princípio da informalidade o mesmo alcance do princípio da instrumentalidade, no sentido de que o processo não é um fim em si mesmo, mas um instrumento de jurisdição. O objetivo do processo não é a sua forma, mas a distribuição de jurisdição. Por esta razão, fala-se em instrumentalidade das formas, ou seja, antes de se indeferir qualquer postulação deve-se observar o seu objetivo instrumental, que é o da busca de jurisdição.(7)

Logo, observa-se a compatibilidade desses princípios com a justiça do Trabalho robustecendo o entendimento favorável ao conhecimento do recurso interposto em momento anterior à decisão do julgado recorrido.

Contudo, a despeito de todo esse arcabouço jurídico favorável à informalidade e à celeridade na Justiça do Trabalho, o entendimento sedimentado pelo C. Tribunal Superior do Trabalho foi em sentido contrário, sendo editada em 2008 a Orientação Jurisprudencial 357 pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, sendo posteriormente convertida na súmula 434.

Com efeito, posicionou-se o C. Tribunal Superior do Trabalho, verbis:

SUM-434 RECURSO. INTERPOSIÇÃO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO IMPUGNADO. EXTEMPORANEIDADE (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 357 da SBDI-1 e inserção do item II à redação) – Res. 177/2012, DEJT divulgado em 13, 14 e 15.02.2012

I) É extemporâneo recurso interposto antes de publicado o acórdão impugnado. (ex-OJ nº 357 da SBDI-1 – inserida em 14.03.2008)

(…)(8)

Diante desse posicionamento, verifica-se a existência de um choque entre o recente posicionamento adotado pelo P. Supremo Tribunal Federal e o entendimento sedimentado pelo C. Tribunal Superior do Trabalho na súmula 434, que merece ser discutido e até revisto por esta última Corte ante a lógica jurídica externada pelo Tribunal guardião da Constituição, afinal, como muito bem afirma a doutora Alice Monteiro de Barros

O jurista, ao interpretar a lei, deverá utilizar-se da teoria geral do direito e dela extrair, no processo de integração, os princípios gerais de direito, os princípios constitucionais e os princípios peculiares ao Direito do Trabalho.(9)

Assim, pelo exposto alhures, procurou-se demonstrar que, não obstante o entendimento sumular contrário no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, a recente decisão prolatada pelo Supremo Tribunal Federal no Embargos de Declaração do Habeas Corpus 101132 sobre a tempestividade de recurso interposto em momento anterior a publicação do julgado apresenta compatibilidade com a Justiça do Trabalho e quiçá, face o dinamismo que vem demonstrando a Instância Extraordinária Trabalhista, não seja este o momento adequado para se propor uma revisão do entendimento sumular para privilegiar a parte recorrente que utilizando o processo com boa-fé e celeridade não seja prejudicada com rigorismo processual, pois, conforme assevera a ministra do Tribunal Superior do Trabalho Kátia Magalhães Arruda

A jurisprudência de um tribunal é como um edíficio em construção permanente, e não como uma obra acabada. Mesmo para a boa conservação de um edíficio, faz-se necessária sua revisão e observação constante e continuada, de modo que qualquer modificação seja sempre para a melhora e o aperfeiçoamento.(10)

 

CONCLUSÃO

Assim, com essas singelas anotações, finaliza-se o presente trabalho cujo escopo foi trazer para o âmbito trabalhista uma nova visão sobre a compatibilidade do conhecimento de recursos interpostos antes da publicação do julgado recorrido, tudo em consonância com o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal em um julgado criminal.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

(1) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF nº 655 – Brasília 07 a 11 de maio de 2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/

documento/informativo665.htm. Acesso em: 22 de maio de 2012.

(2) Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decre to-lei/del5452.htm. Acesso em: 22 de maio de 2012

(3) Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decre to-lei/del5452.htm. Acesso em: 22 de maio de 2012

(4) PEIXOTO, Bolívar Viégas. Iniciação ao Processo Individual do Trabalho. 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 70

(5) Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decre to-lei/del5452.htm. Acesso em: 22 de maio de 2012

(6) Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decre to-lei/del5452.htm. Acesso em: 22 de maio de 2012

(7) PEIXOTO, Bolívar Viégas. Iniciação ao Processo Individual do Trabalho. 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 80/81

(8)Tribunal Superior do Trabalho. Súmulas da Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: http://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/Llivro+de+Jurisprud%C3%AAncia. Acesso em: 23 de maio de 2012

(9) BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6ª ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2010, p. 173

(10) ARRUDA, Kátia Magalhães. As mudanças no Tribunal Superior do Trabalho e sua jurisprudência em construção. In: VIANA, Márcio Túlio; RENAULT, Luiz Otávio Linhares; FATTINI, Fernanda Carolina; FABIANO, Isabela Márcia de Alcântara; BENEVIDES, Sara Costa (Coords). O que há de novo em Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2012, p.151

 

(*) Texto elaborado em maio de 2012.

Rosendo de Fatima Vieira Junior

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