Apropriação indébita previdenciária

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Ao contrário dos crimes de furto, roubo ou estelionato, na apropriação indébita não há fraude ou subtração da coisa. Estelionato e apropriação indébita são coisas distintas porque no estelionato a coisa está em poder de seu dono, mas o agente a retira do seu alcance por meio de fraude ou ardil. Na apropriação indébita, o agente se apropria de algo que já está na sua posse, e que lhe foi confiado pelo verdadeiro dono, por contrato ou lei, mas o toma para si como se fosse originariamente seu. O objeto jurídico do crime de apropriação é o patrimônio da vítima. “Apropriar-se” é tomar como seu, não o sendo. É uma detenção injusta, desautorizada, sem fraude ou violência. O objeto material do crime de apropriação indébita é a coisa alheia móvel. Simples mora ou retardamento ocasional na devolução da coisa não tipifica apropriação. O crime exige dolo, isto é, vontade livre e consciente de apropriar-se. O momento da apropriação é um problema para a doutrina. Em regra, configura-se o crime de apropriação quando o agente toma para si a posse com intenção de usar, fruir ou dispor da coisa como se fosse sua. Em tese, o crime de apropriação admite tentativa, mas a ocorrência prática de crime tentado é de quase impossível aferição porque a tentativa de apropriar-se é conceito que reside num estado anímico do agente. Para que o crime se consume é necessária a inversão arbitrária da posse da coisa. A ausência de intenção de se apropriar esvazia o crime. Apropriação indébita é crime comum, doloso, material e instantâneo.

A L. nº 9.983, de 17/7/2000, alterou o Código Penal e inseriu no rol dos delitos instantâneos o crime de apropriação indébita previdenciária(Código Penal, art.168-A). O art.95 da L.nº 8.212/91 já enunciava o crime, mas não previa nenhuma sanção. Limitou-se a prever sanção apenas nas letras d, e e f  do §1º, fazendo remissão ao art. 5º da L. nº 7.492/86, que trata dos crimes contra o sistema financeiro nacional e prevê penas de 2 a 6 anos.

A letra d do art.95 da L.nº 8.212/91 diz o seguinte:

“Art. 95 – constitui crime:

omissis

d) deixar de recolher, na época própria, contribuição ou outra importância devida à Seguridade Social e arrecadada dos segurados ou do público”.

Inicialmente, os tribunais entenderam que o crime definido na letra d do art.95 da L.nº 8.212/91 era espécie do tipo “apropriação indébita”, e passaram a exigir do agente intenção de se apropriar da coisa pertencente ao outro. Não estando provado esse elemento anímico, não haveria crime. A jurisprudência evoluiu para aceitar que se tratava de crime autônomo, pouco importando a intenção de reter para si a coisa alheia. Admite-se, modernamente, que o crime de apropriação indébita previdenciária é omissivo próprio, isto é, o delito se materializa com a simples retenção dolosa do crédito previdenciário, pouco importando a sua destinação ou a intenção do agente. A L.nº9.983, de 17/7/2000, trata o crime de apropriação indébita previdenciária como delito autônomo. Com a nova lei, constitui crime de apropriação indébita previdenciária “deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional”. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. O núcleo do novo tipo penal vem definido na expressão “deixar de repassar”, em que fica manifesta a intenção do agente de ocultar ao verdadeiro dono a receita que em seu nome foi recolhida. É crime doloso, material, omissivo e instantâneo. Não se admite culpa nesse delito apropriatório. É preciso que o agente, intencionalmente, deixe de repassar o crédito previdenciário aos cofres públicos, mas o destino que o agente pretendeu dar a esses dinheiros em nada altera a configuração do delito.

As contribuições previdenciárias incidem sobre o faturamento e o lucro das sociedades empresárias, sobre os rendimentos do trabalho assalariado, sobre os frutos do trabalho do empresário individual, dos autônomos e, bem assim, sobre a receita proveniente de loterias e jogos (L. nº 8.212/91, art. 11, parágrafo único, d e e). Todo o produto arrecadado deve ser repassado mensalmente ao Tesouro Nacional (L. nº 8.212/91, art. 19). A obrigação de recolher e repassar o crédito previdenciário à receita pública é da fonte pagadora. Há crime de evasão fiscal previdenciária quando a fonte pagadora deixa de recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social, que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiro ou arrecadada do público, quando deixa de recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou a prestação de serviços ou deixa de pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.

Extingue-se a punibilidade se o agente, antes de iniciada a fiscalização ou o procedimento punitivo, confessa o débito e efetua o pagamento integral. Pela nova lei, o juiz pode perdoar o devedor se o agente for primário, de bons antecedentes, e se tiver pago o débito antes do oferecimento da denúncia, ou se o valor do débito, acrescido de juros e correção, for inferior ao mínimo que a Previdência Social tem de executar obrigatoriamente.

A partir da nova lei, o juiz do trabalho deve oficiar ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Trabalho para que tomem as providências cabíveis, sempre que apurar evasão de receita fiscal previdenciária. Não se trata de uma faculdade do juízo, mas obrigação legal(CPP, art.40).

 

 

José Geraldo da Fonseca

Jose Geraldo da Fonseca

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